Opinião de julgadores

União pode ser multada por litigância de má-fé

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7 de março de 2012, 22h53

Por defenderem o interesse e o patrimônio públicos, os procuradores devem, por obrigação da função, recorrer de decisões do Judiciário. O uso da regra sem parcimônia, no entanto, torna infindáveis os processos envolvendo o Estado. Na Justiça Federal, a punição da União por litigância de má-fé começa a se tornar frequente. Mas como é o erário quem responde pelo abuso, a medida é polêmica.

A possibilidade divide a opinião de juízes e desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Para esclarecer as posições, a ConJur ouviu os julgadores presentes ao lançamento do Anuário da Justiça Federal 2012 no auditório do TRF, nesta quarta-feira (7/3), em Porto Alegre.

Para a presidente do tribunal, a desembargadora Marga Inge Barth Tessler, é possível a aplicação de multa à União, mas somente se ela "infringir a lei de forma bastante contundente". Ela diz lembrar de apenas um caso que julgou, mas envolvendo descumprimento de ordem judicial. Na ocasião, o advogado que defendia os interesses do Estado chegou a ser preso. O processo
dizia respeito ao fornecimento de medicamentos.

De outro lado, a desembargadora pondera que a Advocacia-Geral da União, que defende as causas da União, tem o dever de recorrer e que, caso não o faça, pode ser acusada de negligência. "Por isso, a ofensa precisa ser muito grave."

Já o desembargador Fernando Quadros da Silva, presidente da 3ª Turma do tribunal, acredita que não é possível condenar a União como litigante de má-fé pois os membros da AGU têm a missão de levar o processo até o final.
"É melhor um recurso a mais do que uma decisão mal feita", diz. "Temos a antecipação de tutela para preservar direitos."

"A análise de cada caso se faz necessária para emitir opiniões a respeito da questão", alerta o desembargador Otávio Roberto Pamplona, que preside a 2ª Turma do TRF-4. Para ele, a lei que caracteriza a litigância de má-fé é genérica, de forma que a possibilidade de caracterizar a União vai depender de análise minuciosa dos recursos usados, principalmente dos embargos de declaração. Embora reconheça que a medida é incomum, afirma que também não é impossível e "independe da parte". "O tamanho da multa depende da gravidade da procrastinação." No entanto, ele não admite estender a multa ao procurador pelo recurso abusivo.

Já para o diretor da Seção Judiciária do Rio Grande do Sul, juiz Eduardo Toledo Picarelli, existe a possibilidade de se punir também o procurador, dependendo do caso. "Mas, a princípio, a punição é ao Estado", diz. Ele só admite a multa se for caracterizado o dolo do Estado em protelar.

O desembargador Carlos Eduardo Thomson Flores Lenz não aplica multa aos advogados públicos, mas sim à União, dependendo do caso e em caso de abuso.
"Procuradores cumprem sua obrigação", afirma. Segundo ele, é preciso levar em conta que o Superior Tribunal de Justiça não admite recursos mencionando temas sem pré-questionamento, o que exige que a União recorra.

Para Rogério Favretto, desembargador da 5ª Turma e ex-advogado público, a relação com o poder estatal merece ponderação diferenciada, já que o Estado representa a sociedade. "A não ser que o procurador tenha atuação diferente da busca do interesse público, quando merece a sanção", afirma. Segundo ele,
não se aplica multa por litigância de má-fé pelo efeito financeiro da
medida, mas pelo pedagógico, "para que o Estado corrija o comportamento inadequado". E possíveis sanções aos procuradores só caberiam na esfera administrativa, "como na OAB, por exemplo".

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