Em São Paulo, uma instrução normativa da Secretaria de Finanças da Prefeitura, tida por muitos tributaristas como inconstitucional, virou decreto. Publicada na sexta-feira (18/5), a regra consolida a proibição de emissão de nota fiscal eletrônica por contribuintes que estejam em situação de inadimplência perante o Fisco Municipal.
Como já noticiou a revista Consultor Jurídico, a Instrução Normativa 19, editada no começo deste ano, viola três súmulas do Supremo Tribunal Federal. Agora, o Decreto Municipal 53.151, de 2012, valida de vez a prática e regulamenta outros aspectos do Imposto Sobre Serviços (ISS). Especialistas sobre o assunto são unânimes: a norma é flagrantemente contrária às Súmulas 70, 323 e 547.
Elas determinam, respectivamente, que “é inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo”, que “a inscrição do nome do devedor pode ser mantida nos serviços de proteção ao crédito até o prazo máximo de cinco anos, independentemente da prescrição da execução” e que “não é lícito a autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais
Guilherme Barranco, do escritório Leite, Tosto e Barros Advogados, por exemplo, lembra que a norma pode ser questionada por meio de Mandado de Segurança. “Não há lei que autorize uma medida dessa natureza. Além disso, está sendo desrespeitado o princípio da livre atividade econômica e o município está adotando medida coercitiva abusiva, incompatível com a atividade de cobrança do crédito tributário. Dessa forma, acredito haver sólidos argumentos que justifiquem a propositura de medidas judiciais questionando a mudança”, diz.
Como explica o tributarista Igor Mauler Santiago, do Sacha Calmon Misabel Derzi Consultores e Advogados, a emissão de nota fiscal acontece por meio de lotes e mediante a autorização do fisco. Assim, o órgão terá o controle sobre o imposto que será pago e o que é devido. “Essa é uma forma de constrição oblíqua, uma forma indireta de obrigar o contribuinte a pagar o ISS”, conta.
“O fisco pode fazer algumas coisas, como se negar a emissão negativa de débitos, por exemplo. Mas não pode impedir o contribuinte de trabalhar”, diz Mauler. Para ele, a medida faz parte de uma política de arrecadação que inclui, por exemplo, juros de mora tributários de 40% no estado de São Paulo, agora transportada para a Prefeitura paulista.
Além da proibição de emissão de nota fiscal para os devedores, Raul Haidar comentou outro ponto do decreto. De acordo com o artigo 70, “a Secretaria Municipal de Finanças poderá firmar convênio com as Delegacias de Polícia da Divisão de Investigações Sobre Crimes Contra a Fazenda do Departamento de Polícia Judiciária da Capital (Decap), a fim de comprovar a veracidade das informações prestadas”. De acordo com o tributarista, a regra é “uma besteira”. “Eles querem dar a impressão de que vão botar a polícia em cima de quem deve”, conta, ironizando.
Já Barranco explica que o novo decreto transfere a responsabilidade da emissão de nota fiscal para o tomador de serviço. “A intenção é aumentar a arrecadação. O tomador se sente na obrigação de fornecer, senão o município vai atrás”, diz.