Problema emergencial

Leia voto do ministro Gilmar Mendes sobre o ProUni

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5 de maio de 2012, 9h04

O Programa Universidade para Todos, ou ProUni, do governo federal, é essencial para a diversificação e facilitação do acesso a jovens no ensino superior no país. Esse foi o entendimento do ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes ao votar pela constitucionalidade da medida provisória — e, consequentemente, da lei — que criou o ProUni.

O programa governamental era questionado em Ação Direta de Inconstitucionalidade pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (Confenem) e pelo partido Democratas. A ação data de 2004, e já contava com um voto contra — a favor do ProUni, portanto —, do relator, ministro Ayres Britto. Estava travada desde então por um pedido de vista do ministro Joaquim Barbosa. O caso foi julgado na última quinta-feira (3/5) pelo STF, que considerou, por 7 votos a 1, o programa constitucional.

A ação afirmava que o ProUni foi instituído por uma Medida Provisória, mas não atendia aos critérios de urgência descritos na Constituição como condições para a edição de uma MP. Posteriormente, a MP foi convertida em lei pelo Congresso. Os ministros votaram pela improcedência da ADI e pela constitucionalidade do ProUni quase à unamidade. Apenas o ministro Marco Aurélio votou contra.

Gilmar Mendes foi o último a votar, mas nem por isso deixou de discorrer sobre o que pensa das ações afirmativas no ensino superior. Ele afirmou que, não fosse por ações como o ProUni, o ensino universitário brasileiro continuaria estagnado, direcionado apenas a alunos do mesmo estrato social. “Programas como este têm importância fundamental para a manutenção de níveis mínimos de qualidade do Ensino Superior”, votou.

O ministro trouxe números do Censo do Ensino Superior, do Ministério da Educação. Em 2010, segundo o levantamento, o Brasil tinha 2.377 instituições de ensino superior, das quais 278 eram públicas: 99 federais, 108 estaduais e 71, municipais, que abarcava 1,6 milhão de matrículas na graduação. O sistema privado, continuou o ministro, citando o relatório, contava com 2.099 instituições e abrigava 4,7 milhões de matrículas na graduação.

Sendo assim, nas palavras do ministro, “o programa ProUni tem exercido um papel fundamental nesse crescimento do número de matrículas no Ensino Superior. Dos estudantes em instituições particulares, hoje, pouco mais de 1 milhão (de um total de 4.736.001 alunos) têm o apoio do ProUni. Portanto, o número de ingressantes no Ensino Superior por meio do PROUNI chega a ser próximo do total de estudantes atualmente matriculados em instituições públicas”.

Gilmar também remonta sua experiência como professor universitário, escolas públicas e particulares, para afirmar que o ensino superior no Brasil é “excludente em razão do modelo restrito de vagas ofertadas por quase todos os cursos”. “Nós que militamos na universidade pública podemos verificar a presença de pouquíssimos alunos nas salas de aula, existindo um gasto excessivo com professores em relação ao número de alunos.”

Raça ou condição social
Parte da ação alegava que o artigo 7º da MP que criou o ProUni viola o princípio constitucional da isonomia, pois usa o critério racial para o preenchimento de vagas no ensino superior. Afirmam os autores da ADI que o único critério que o Estado deve seguir, quanto a vagas em universidades, é o da meritocracia, nunca o racial. Também defendem que uma ação afirmativa deveria dar oportunidade a todos os menos privilegiados, “e não pretender que, no ensino universitário, se outorguem privilégios a quem não esteja capacitado a acompanhá-lo, ainda que isso tenha derivado do fato de o Estado ter falhado em dar, no ensino básico e médio, a qualificação necessária”.

Mas, segundo Gilmar Mendes, “o argumento da requerente é falacioso”. Isso porque, de acordo com o entendimento do ministro, “na medida em que contesta um critério de diferenciação (o critério da raça) supostamente inidôneo para o estabelecimento de política pública de ação afirmativa com descriminação positiva ou inversa, na verdade procede a uma leitura parcial (e, portanto, uma interpretação equivocada) da lei”.

Segundo levantado no próprio voto do ministro, o ProUni exige que os participantes, em contrapartida, tenham bom desempenho no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Essa, para Gilmar, seria a parte da meritocracia. Outro quesito é que os alunos negros ou indígenas, para ganhar bolsa de 100% no ensino superior, devem vir de família com renda máxima de um salário mínimo e sejam oriundos da escola pública, ou de escola particular na condição de bolsista.

Mesmo fim
Por mais que tenha votado no mesmo sentido do relator, o ministro Gilmar Mendes não concordou inteiramente com os argumentos do colega Ayres Britto. Primeiro porque o hoje presidente do Supremo afirma que o ataque à MP não fazia mais sentido, porque a medida já havia sido transformada em lei pelo Congresso. O ProUni, portanto, para Ayres Britto, já estava validado. “A conversão da medida provisória em lei prejudica o debate jurisdicional sobre o atendimento dos pressupostos de admissibilidade desse espécime de ato da ordem legislativa”.

Gilmar rejeita os argumentos de Britto. Diz que não se pode convalidar um possível vício inicial da Medida Provisória só porque ela foi transformada em lei. Concorda, no entanto, com a constitucionalidade do ProUni.

Lembra que o governo encaminhou ao Congresso um anteprojeto de lei para criar um programa de acesso de jovens de baixa renda ao ensino superior, que nunca foi votado pelos parlamentares. Isso mesmo com os pedidos de urgência feitos pela Presidência aos congressistas.

Estaria aí, para Gilmar, o critério da urgência para a edição de uma medida provisória. Também seria emergencial, no entendimento do ministro, a falta de vagas no ensino público superior para atenuar o baixo índice de acesso à universidade no Brasil. “Tendo em vista a prioridade da questão tratada por meio da MP impugnada e o caráter especial e de exceção que assume a análise do atendimento dos pressupostos de relevância e urgência por esta Corte (ADI-MC 4.048, de minha relatoria, DJe 22.8.2008), tenho por configurados os referidos pressupostos e, portanto, supero a preliminar arguida relativa ao não conhecimento da ação, divergindo, porém, do relator quanto à fundamentação.”

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ADI 3.330

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