Produção de provas

Chefes do MP e da OAB-SP discutem poder de investigar

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27 de junho de 2012, 20h48

Enquanto se espera a definição do Supremo Tribunal Federal sobre a possibilidade de investigação pelo Ministério Público, a temperatura do debate sobe entre advogados e promotores, catalisada pela Proposta de Emenda Constitucional 37/2001, de autoria do deputado federal Lourival Mendes (PTdoB/MA), que tramita na Câmara dos Deputados. A PEC torna o poder de investigação criminal privativo das polícias federal e civil. Frente a frente nesta terça-feira (26/6), os chefes do MP e da OAB paulistas discutiram o tema no programa Entre Aspas, comandado pela jornalista Mônica Waldvogel e exibido pelo canal Globo News.

MP/SP
Subprocurador-Geral Márcio Fernando Elias Rosa - 27/06/2012 [MP/SP]Sobre o principal ponto da celeuma sobre o qual o Supremo se debruça, o procurador-geral da Justiça de São Paulo, Márcio Elias Rosa (foto), concordou com o lado contrário que a Constituição Federal não diz, expressamente, que o MP pode investigar criminalmente, mas ressalvou que ela também não proíbe a prática. “Não está na Constituição a exclusividade de qualquer órgão para investigar. E ela atribui ao promotor a titularidade da ação penal, para levar o processo a juízo e exercer o controle externo da polícia. Para fazer isso, o MP precisa investigar”, disse.

Segundo ele, o artigo 129 do texto constitucional dá à instituição atribuições de investigação que podem ser interpretadas também para os processos criminais. “É intuitivo, lógico, e não é preciso ser bacharel ou cientista do Direito para saber que quem pode processar em juízo também pode fazer a tarefa antecedente, que é a produção de provas, para formar sua convicção.” Rosa firmou sua posição no fato de o MP ter papel complementar, correicional e fiscalizatório nas investigações, corrigindo até mesmo a produção de provas feita pela Polícia.

OAB-SP
Marcos da Costa - 27/06/2012 [OAB-SP]Já para o presidente em exercício da OAB-SP, Marcos da Costa (foto), o texto constitucional é taxativo, e não exemplificativo, ao elencar as atribuições do MP, entre as quais não está investigar. “Quando diz respeito ao inquérito civil, a Constituição diz que compete ao MP produzi-lo, bem como a ação civil pública. Mas no caso de inquérito penal, é ao contrario. Ela delega à autoridade policial comandar a investigação”, afirmou.

Costa defendeu que essa ordem foi prevista para manter a separação do Estado em julgador e investigador, que deve ser neutro, do Estado acusador, que é parte na ação penal, papel exercido pelo MP. “O Estado como orgão de acusação não tem neutralidade para a produção de provas.” A preocupação, segundo o advogado, é com a paridade de armas. “O MP tem poderes para requisitar documentos, chamar testemunhas e, como a própria instituição defende, para quebrar sigilos. Mas o advogado de defesa não tem esses poderes”, exemplificou. “Se o MP puder produzir provas na investigação, o que a defesa não tem, haverá dificuldade de competir em igualdade de condições. Não posso, como advogado, exigir, sob pena de desobediência, que alguém me entregue determinadas informações num prazo de tantos dias.”

Rosa discordou. Segundo ele, o MP, na fase de investigação, não é parte. “Tanto é assim que ele pode arquivar o procedimento. Nada impede que o promotor conclua pela inocência e ele próprio requeira a absolvição. Promotor não é de acusação, é de Justiça.” Ele também afirmou que a independência do MP em relação ao Poder Executivo permite à instituição apurar crimes de corrupção cometidos por agentes do Estado. “A Polícia é vinculada”, lembrou. Para ele, a discussão do tema na Justiça e no Congresso é um retrocesso, provocado justamente pela atuação do MP contra criminosos. “Isso aumenta a incredulidade da sociedade.”

Para o procurador-geral, o fato de existir uma PEC restringindo o poder de investigar à polícia denuncia que a Constituição permite essa hipótese. “Há diferença entre a vontade do legislador e a da lei. A interpretação da lei depois de posta pode ser diferente”, contrapôs Marcos da Costa.

O presidente da OAB-SP colocou em dúvida os procedimentos que, se a permissão fosse concedida, o MP seguiria para investigar. “Não há norma em relação ao inquérito penal presidido pelo MP. Mas o da Polícia tem regramento, que define prazo para conclusão”, disse. O argumento foi rebatido: “O CNMP [Conselho Nacional do Ministério Público] tem regulamentação desde 2006. O procedimento não é feito ao arrepio da lei, mas tem o formalismo que inquérito policial tem, até para permitir o direito de defesa. Não se defende invetigação clandestina”, disse Rosa.

“Nosso sistema processual, desde a década de 1940, não vê o inquérito como indispensável. O promotor pode receber documentos e imediatamente oferecer denúncia”, alertou o chefe do MP paulista. “Mas aí, quando autoria do crime e provas estão claras, não se discute investigação nem pelo MP, nem pela Polícia”, interveio Costa.

O advogado mostrou preocupação com o fato de o MP poder escolher o que investigar, o que não ocorre com a Polícia, e lembrou a recente aquisição, pelo MP-SP, do sistema Guardião, usado para coodenar escutas telefônicas. “O sistema grava conversas de três mil pessoas ao mesmo tempo. Quem vai controlar isso?”, questionou. Rosa rebateu: “Há mecanismos de controle interno e externo. Escutas só serão feitas, porque ainda não são, com autorização judicial.”

Rosa afirmou que a intenção não é usurpar o lugar da polícia nas investigações, mas atuar apenas quando necessário. “A história registra situações em que, se não houvesse participação do MP, não teria havido elucidação dos fatos e a defesa de direitos humanos”, disse. “O que aflige o MP é que os promotores, dia a dia, apuram abusos, violação de direitos e injustiças, às vezes, cometidos pela Polícia.”

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