Contratos de Aluguéis

Cláusulas de conteúdo econômico podem ser modificadas

Autor

  • Daniel de Alcântara Nastri Cerveira

    é advogado sócio do escritório Cerveira Bloch Goettems Hansen & Longo Associados Advogados Associados consultor jurídico do Sindilojas-SP autor do livro "Shopping Centers - Limites na liberdade de contratar" Editora Saraiva e professor dos cursos MBA em Varejo e Gestão de Franquias da FIA (Fundação de Instituto de Administração) e da pós-graduação em Direito Imobiliário do Instituto de Direito da PUC-RJ.

22 de junho de 2012, 7h00

O contrato de locação em shopping center é abordado em inúmeros trabalhos doutrinários e apresenta certa complexidade.

Os seguintes documentos costumam integrar os contratos de locação em shopping centers: (i) o contrato propriamente dito, com as estipulações individuais de cada lojista/locatário; (ii) as "normas gerais" ou "cláusulas comuns", que são um conjunto de regras para todos; (iii) o regimento interno, que estipula sobre o funcionamento do empreendimento; e (iv) o estatuto da associação dos lojistas (é condição para firmar a locação, que o lojista se afilie a associação dos lojistas do shopping —sendo comum o empreendedor/locador ter maior poder de voto), que dentre outras funções, trata da arrecadação e gerência do fundo de promoção e publicidade.

Vale esclarecer, ainda, que os locatários/lojistas, além do aluguel (mínimo e percentual), arcam com as verbas condominiais/encargos comuns, fundo de promoção, encargos específicos (água, luz, etc.), taxa de administração entre outros.

Com efeito, considerando que os pactos em pauta são de longa duração e que, durante o seu transcorrer, podem ocorrer alterações nas suas bases objetivas e subjetivas, tem-se que, em sede de ação renovatória de contrato de locação, é possível a modificação de cláusulas de conteúdo econômico, como, por exemplo, a taxa/coeficiente de rateio dos encargos comuns/condomínio e a contribuição ao fundo de promoção.

Obviamente, que será necessário demonstrar ao juiz que a alteração se faz necessária, com o fito de evitar enriquecimento ilícito, desequilíbrio contratual, afronta ao princípio da isonomia entre outros motivos.

Importante destacar que tanto o locatário como o locador poderão pleitear tais ajustes, uma vez que o primeiro deve apresentar uma proposta concreta para a renovação na petição inicial e o segundo uma contraproposta na contestação. 

O ex-presidente do extinto Segundo Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, in "Locação & Ações Locativas", Editora Saraiva, corrobora a tese in verbis: "Há quem, em descomedida veneração às formas, à letra da lei e à vontade das partes tal qual emitida, aplaude o princípio de inalterabilidade das cláusulas contratuais que se não avizinhem da periodicidade e índice de reajuste".

Sylvio Capanema de Souza, in "Da Locação do Imóvel Urbano — Direito e Processo", Editora Forense, 2001, p. 628, outro ilustre especialista no assunto, também, endossa o entendimento: "O que se pretendeu, coma atual lei, foi transformar a ação renovatória no grande foro de debates, de onde sairá um contrato novo, oxigenando em todas as suas condições, e adaptado não só à realidade, então vigente, de economia e do mercado, como às necessidades das partes. E isso é extremamente útil, para manter o equilíbrio do contrato, ainda mais levando em conta sua longa duração, em meio a mudanças políticas e sociais constantes e inesperadas, como temos experimentado".

José Carlos de Moraes Salles, in "Ação Renovatória de Locação Empresarial — Locações comerciais, industriais e para sociedade civis com fins lucrativos", 2ª Edição, Editora Revista dos Tribunais, p. 104, igualmente coaduna do exposto: "Ora, se assim é, parece-nos inteiramente lícito possa o locatário, na inicial da ação renovatória (ou em instrumento á parte, que instrua a inicial) e ao indicar as condições oferecidas para a renovação, propor alteração, revisão ou refazimento de outras cláusulas constantes do contrato renovando, além daquelas relacionadas com o novo locativo e o prazo da renovação”.

Outrossim, a jurisprudência pátria admite a discussão de cláusulas contratuais em ação renovatória de contrato de locação comercial, in verbis:

"LOCAÇÃO COMERCIAL – SHOPPING CENTER – RENOVATÓRIA – CLÁUSULA CONTRATUAL – NAS RELAÇÕES ENTRE LOJISTAS E EMPREENDEDORES DE SHOPPING CENTER, A princípio, prevalecerão as condições livremente pactuadas nos contratos de locação respectivos e as disposições procedimentais previstas nesta lei, nos termos do artigo 54 da Lei do Inquilinato, que consagra o princípio pacta sunt servanda nesse tipo de locação. Permite-se, porém, a modificação ou desconsideração das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas, pois o direito não da guarida a situações abusivas, injustas ou que firam a isonomia, causando enriquecimento indevido de uma parte em detrimento de outra …" (Apelação nº 0259657-4, Tribunal de Alçada de Minas Gerais, Primeira Câmara Cível, Relatora Juíza Vanessa Verdolim Andrade, v.u.)

"…A Lei 8245/91 estabeleceu que a ação renovatória não se limita à discussão quanto ao valor do aluguel, admitindo-se rever todas as demais cláusulas de conteúdo econômico, como, por exemplo, o índice de correção do aluguel…".(TJ/RJ, Agravo de Instrumento nº 23842-04 – 10ª Câmara Cível – v.u.).

Se já não bastasse, não há dúvidas que as referidas modificações são possíveis em sede de ação renovatória, considerando que o locador tem a opção de aceitar a proposta do locatário constante da exordial e este a contraproposta ofertada na contestação. Assim, uma vez que as partes possuem tais faculdades, não há razão para o Poder Judiciário sequer apreciar os pedidos respectivos no sentido de não analisarem o mérito dos pleitos.

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