Carência de fundamentação

TJ gaúcho nega pedido para paralisar obras da Copa

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11 de junho de 2012, 15h55

Copa2014
A 22ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul negou pedido de um grupo de artistas e intelectuais de Porto Alegre para paralisar as obras que estão sendo feitas pelo Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense e Sport Club Internacional, como parte da infraestrutura para a Copa do Mundo de 2014. O  relator do colegiado entendeu que o perigo de dano irreparável, que justificaria a antecipação de tutela, não ficou demonstrado por carência de fundamentação técnica — o mesmo entendimento da primeira instância, onde o processo tramita há três anos.

O desembargador Carlos Eduardo Zietlow Duro disse que não pode, simplesmente, suspender os efeitos das Leis Complementares Municipais nºs 608/09 e 610/09 em sede de ‘‘cognição sumária’’ — ou seja, de forma precária. É que ‘‘não parece haver irregularidade ou ilegalidade nos procedimentos de expedição de licenças para as obras’’. Além disso, deve-se presumir a constitucionalidade das leis e a legitimidade dos atos administrativos e legislativos que disciplinam os procedimentos para licenças ambientais.

Ele também afirmou que o Agravo interposto ‘‘beira à inépcia’’, dada à quase ilegibilidade das cópias da petição inicial, o que dificultou o exame da controvérsia. Apesar de não primar pela boa técnica, o desembargador acabou aceitando o recurso, pois preencheu ‘‘razoavelmente’’ os requisitos do artigo 524 do Código de Processo Civil (CPC). A decisão foi proferida no dia 9 de maio.

O caso
Segundo informações do acórdão, os autores ingressaram com uma Ação Cível Pública na Justiça Federal contra o Município de Porto Alegre e os dois clubes de futebol da Capital gaúcha para tentar obter a declaração de nulidade das Leis Complementares Municipais (LCMs) 608/09, 609/09 e 610/09. O argumento central é o de que as obras estão causando danos ao interesse e patrimônio público, ao meio ambiente e aos valores históricos e culturais da cidade. Pediram, em sede de liminar, a suspensão destas leis e a consequente paralisação das obras nos estádios, com previsão de multa diária em caso de desobediência.

Em suas justificativas, os autores alegam que a legislação contestada apresenta diversos vícios e irregularidades. Citaram: textos legais não muito claros; alterações irregulares nos índices construtivos estabelecidos pelo Plano Diretor; inexistência de estudo prévio de impacto da densidade de veículos e de vizinhança; inexistência de audiência pública; falta de projeto para a adequação da rede de esgoto; não observância dos critérios de segurança; ausência de licença ambiental; violação aos princípios da isonomia, igualdade e razoabilidade e ofensa ao meio ambiente; e quebra do sistema urbano e paisagístico do Município, pelas obras previstas.

O juízo federal de primeiro grau determinou a cisão do processo, permitindo seu prosseguimento apenas com relação à contestação da LCM 609/09, que define regras para o licenciamento urbanístico do estádio Beira-Rio, do Internacional, na orla do rio Guaíba — área de competência federal.

Parte do feito, em consequência, foi redistribuída à 10ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre (Foro Regional da Tristeza), para análise das LCMs 608/09 e 610/09. Estas regulam as obras do antigo estádio dos Eucaliptos, do Inter, localizado no bairro Menino Deus; e as do estádio Olímpico, localizado no bairro Azenha, e da Arena, no bairro Humaitá – ambos do Grêmio. Neste redirecionamento, o Legislativo Municipal foi incluído no pólo passivo da demanda.

Primeira tentativa
A 10ª Vara não considerou viável o exame pretendido pelos autores, pois a inicial não apresentou a devida fundamentação técnica. De acordo com o juiz Eugênio Couto Terra, a inicial ‘‘baseia-se em reportagens de jornal, ilações bem-construídas, mas não amparadas por nenhum estudo técnico ou demonstração minimamente segura, mesmo que se tenha por norte os princípios da precaução e da prevenção, essenciais quando se trata de meio ambiente’’.

Diante deste quadro, o juízo estadual determinou: a exclusão da Câmara de Vereadores do pólo passivo da ação; a intimação da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), para se manifestar se o projeto da Arena do Grêmio afeta ou não o Parque Estadual do Delta do Jacuí ou outro; e o encaminhamento de ofício ao juízo federal, solicitando a remessa da contestação apresentada pelo Inter e os documentos que a instruíram.

Segunda tentativa
Mais tarde, melhor instruído, o julgador voltou a analisar o pedido de liminar interposto pelos autores — objeto do Agravo indeferido no dia 9 de maio pelo TJ-RS.

No entanto, pela segunda vez, a percepção do juiz permaneceu a mesma: ‘‘não há, no processo, prova concreta ou estudo técnico que demonstre qual a lesão, efetiva ou potencial, ao patrimônio público — bens e direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico, turístico ou ao meio ambiente’’. Para Terra, as alegações da parte autora foram apresentadas de maneira genérica, abstrata e em forma de conjecturas.

Ele considerou satisfatórias as explicações da municipalidade e dos dois clubes, pelo menos nesta fase de ‘‘cognição sumária’’, inclusive sobre a realização de audiência pública – ocorrida em abril de 2010. Considerou, em princípio, não haver irregularidades ou ilegalidades nos procedimentos de expedição de licenças paras as obras.

‘‘Não bastasse isso, notório que não cabe a este juízo substituir o administrador público e examinar a concessão de licenciamento ambiental de forma genérica e abstrata, pois, assim agindo, estaria adentrando em seara que não Ihe pertence.
O possível seria apreciar eventual irregularidade, ilegalidade, que tivesse clara e precisamente sido apontada pela parte autora, bem como que tivesse sido suficientemente comprovada nos autos, o que, até o momento, não logrou êxito em ocorrer’’, concluiu o juiz Eugênio Couto Terra, indeferindo, mais uma, vez a antecipação de tutela.

Segunda instância
‘‘Efetivamente, não há perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, circunstância que decorre do próprio decurso de tempo desde a propositura da ação, em 2009’’, afirmou o desembargador Carlos Eduardo Zietlow Duro, que indeferiu o Agravo de Instrumento no âmbito do Tribunal de Justiça.

Ele disse que também indeferia o efeito suspensivo das duas Leis Complementares Municipais em razão da aparente inadequação da via processual adotada pelos autores. Isso porque a Ação Popular Cível não é sucedâneo da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI). Em síntese: não cabe usar a Ação Popular contra leis municipais com efeitos concretos.

Para o desembargador da 22ª Câmara Cível, as questões trazidas aos autos, tanto no primeiro como no segundo grau de jurisdição, carecem de fundamentação técnica, impedindo um amplo exame da matéria na fase de ‘‘cognição sumária’’.

Clique aqui para ler a íntegra do acórdão.
 

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