Crime falso-positivo

Entidades enviam ao TPI relatório sobre execuções

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5 de junho de 2012, 15h57

Divulgação TPI
O relatório "Colômbia: a guerra medida em litros de sangue. ‘Falsos-positivos’, crimes contra a humanidade e a impunidade dos maiores responsáveis" foi encaminhado, nesta semana, ao Tribunal Penal Internacional (TPI) pela Federação Internacional de Direitos Humanos (FIDH – International Federation for Human Rights), pela "Coordinación Colombia Europa Estados Unidos (CCEEU)" e pela organização "Advogados sem Fronteiras". As entidades querem que o TPI processe e julgue autoridades e militares colombianos responsáveis pelas execuções de 3.345 civis, no período de 2002 a 2008, que nunca foram investigados e julgados pelo Judiciário do país. E ainda: evidencie o envolvimento dos Estados Unidos no escândalo apelidado de "falso-positivo", segundo o Huffington Post e o site da FIDH. 

O apelido "falso-positivo" decorreu da prática dos militares colombianos de optarem por matar civis inocentes e indefesos, falsamente identificados como guerrilheiros ou traficantes de drogas — porque os verdadeiros alvos eram muito mais difíceis de enfrentar — para cumprir cotas de assassinatos estabelecidos pelas autoridades americanas, como condição para continuar fluindo a ajuda militar dos EUA, no valor de US$ 8 bilhões por ano. As entidades obtiveram testemunhos de militares implicados, como este: "O coronel Ramirez nos disse que cada comandante, de cada batalhão, tinha de relatar pelo menos uma morte por mês e que a Segunda Seção tinha de relatar no mínimo três mortes por mês". 

Segundo o relatório, o comandante também disse que "a guerra está sendo medida por litros de sangue, e que qualquer comandante que deixasse de relatar a contagem de corpos em qualquer mês seria apropriadamente punido". O relatório conta que no início de 2008, quando o coronel Juan Carlos Barrera Jurado assumiu o comando da brigada, disse que os oficiais comandantes do "batalhão que deixar de fornecer corpos ou de se engajar em combates por 90 dias serão dispensados por negligência e incapacidade operacional". Por causa desses tipos de ordens, os comandados optaram por buscar corpos em áreas de menor resistência, em vez de se engajar em lutas perigosas contra guerrilheiros e traficantes. 

Um dos casos expostos no relatório ocorreu no município de Soacha, entre dezembro de 2007 e agosto de 2008, em que 16 jovens desapareceram, em circunstâncias estranhas. Alguns deles, antes desaparecer, disseram as suas famílias que receberam uma oferta de emprego em Santander. Todos foram mortos, alegadamente em combate. Os corpos foram posteriormente encontrados a 700 quilômetros de Soacha, enterrados sem nomes em uma vala comum. Mas foram incluídos nos relatórios dos militares, para americano ver, como delinquentes, paramilitares ou guerrilheiros eram mortos em combate, afirma o relatório. Uma vez que a história se espalhou, famílias de todos os cantos do país começaram a contar casos semelhantes de desaparecimento e de morte de seus filhos. 

Embora o relato dos fatos englobe apenas o período 2002-2008, o relatório deixa claro que esse fenômeno não é, ainda, uma coisa do passado. As entidades afirmam que os militares colombianos continuam praticando a política de contagem de corpos, para que seus parceiros americanos possam justificar a continuação da ajuda militar à Colômbia. A Comissão de Direitos Humanos na Colômbia afirmou, em um estudo feito em 2011, que "a prática de execuções extrajudiciais não foram totalmente erradicadas na Colômbia; isto é, essas violações continuam a ocorrer em Arauca, Bogotá, Cauca e Cesar". 

Segundo o Huffington Post, o aspecto mais saliente do escândalo "falso-positivo" para os americanos é o de que os EUA estão realmente por trás da "síndrome da contagem de corpos". E que não só tem conhecimento de que os militares colombianos estão envolvidos com "táticas de esquadrão da morte", como cooperou e encorajou essa prática na Colômbia. "Informações esclarecedoras, prestadas por Michael Evans, do Arquivo Nacional de Segurança, dão conta de que a CIA e diplomatas americanos sabiam, desde 1994, que as forças colombianas, apoiadas pelos EUA, estavam engajadas nessas "táticas de esquadrão da morte" e cooperavam com grupos paramilitares formados por traficantes". Apesar disso, os EUA ampliaram a ajuda militar à Colômbia, a partir de 2000, através do "Plano Colômbia" – um programa militar que continua ativo até hoje e que continua a incentivar o assassinato de civis. 

O Huffington Post lembra que, nesta semana, exatamente essa mesma lógica levou à condenação pelo TPI do ex-presidente liberiano Charles Taylor, acusado de "ajudar e estimular" rebeldes que cometeram atrocidades em Serra Leoa. Assim, diz o jornal, as autoridades americanas que arquitetaram o Plano Colômbia também deveriam ser responsabilizadas. "Mas, elas nunca vão ser processadas, porque os EUA nunca assinaram os documentos de adesão ao TPI, exatamente por receito de virem a ser responsabilizados", afirma o jornal.

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