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As origens, o auge e o esvaziamento do Direito Comercial

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4 de junho de 2012, 9h30

Direito Comercial — Passado, Presente e Futuro, de Cássio Machado Cavalli, professor da Fundação Getúlio Vargas no Rio de Janeiro, é um livro de Direito, como expresso no título. Mas é, também, um passeio na história das transformações socioeconômicas ocorridas no mundo, desde a Idade Media até os dias atuais, passando pela formação das grandes monarquias europeias, berço da Revolução Francesa e da criação do Estado Moderno. Ao analisar a evolução do Direito Comercial, o autor reconstitui uma trajetória que vai do feudalismo ao capitalismo atual, dos costumes como fonte principal das normas legislativas à supremacia dos princípios constitucionais.

Mestre em Direito pela PUC do Rio Grande do Sul e doutorando em Direito Comercial pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Cássio Cavalli resume o livro como "um trabalho de investigação científica",  realizado com o objetivo de contribuir com os debates sobre os limites aplicativos do Direito Comercial e a conveniência ou não de um novo Código Comercial.  

Como trabalho científico, ele não toma partido. Pelo menos não de forma direta. Na sua trajetória histórica, situa e contextualiza argumentos favoráveis e contrários à autonomia do direito comercial. Fica longe de ser imparcial, mas oferece os elementos para que o leitor forme sua própria convicção.

Como método, ele agrupou vários temas e capítulos, que precisam ser acompanhados um a um. Primeiro, ele situa as diferentes fases e significados historicamente atribuídos ao Direito Comercial. Depois, concentra-se na análise da dicotomia Direito Civil — Cireito Comercial, enfatizando o desenvolvimento da teoria dos atos de comércio, o movimento de unificação do direito privado e o que define como a comercialização do direito civil.

Superada essa fase, a abordagem recai sobre a empresa e o empresário, com destaque para teorias e conceitos e a constitucionalização do direito privado, um tema que ele considera "muito bem explorado pela doutrina civilística, mas ainda a merecer maior atenção em relação ao direito comercial".

Ele chama a atenção para a "peculiaridade histórica" de o Código Comercial ter antecedido em mais de 60 anos o Código Civil no Direito brasileiro, sendo ele, o Código Comercial de 1850, a regular os diversos tipos de contratos — compra e venda, títulos de crédito e seguro marítimo, entre outros — depois regulados, também, no Código Civil de 1916.

Foi esta a principal razão, segundo Cavalli, de o direito comercial no Brasil, ao contrário do que ocorreu em diversos ordenamentos europeus, jamais ter sido uma disciplina absolutamente distinta e autônoma. Pelo simples fato de os princípios que marcavam tal autonomia terem ingressados no ordenamento jurídico brasileiro por meio do Direito Civil.

Ele considera, no entanto, que o mais importante nessa trajetória não é o tratamento legislativo, se o Código Comercial ou o Código Civil, mas o fato de que, com a promulgação do Código Civil, as normas passaram a ser aplicadas independentemente da qualidade do sujeito. "Os institutos de Direito Comercial deixaram de ser aplicados apenas aos comerciantes e aos atos praticados em razão do comércio", ressalta.

Até a Revolução Industrial, explica o autor, o Direito Comercial foi o direito dos comerciantes, assim entendidos aqueles que praticavam atos de comércio. Com as transformações decorrentes, começou a se afastar do conceito de comércio de mercadorias para adotar outro, bem mais amplo, em razão da própria extensão do mercado e das atividades econômicas. Ocorreu o mesmo com a empresa, cujos conceitos foram ampliados de forma suficiente para absorver as sucessivas transformações sofridas pela teoria dos atos de comércio.  

O ápice da extensão do Direito Comercial, de acordo com o passeio histórico de Cavalli, foi alcançado após a Revolução Francesa. A fase seguinte analisada por ele mostra uma perda gradativa de espaço, que passou a  ser ocupado por novos ramos do direito, "surgidos para tutelar sujeitos vulneráveis", como o direito do trabalho e o direito do consumidor. "À medida que o direito comercial ampliou o seu campo de aplicação, acompanhando o processo de mercantilização dos bens da vida, estes mesmos bens da vida foram assumindo uma nova significação socioeconômica, de modo que passaram a reclamar uma tutela jurídica específica", analisa o autor.

Outro ponto que ele considera importante para explicar o encolhimento do direito comercial está na mudança do papel do Estado, que deixa de ser um mero garantidor do cumprimento de pactos particulares e passa a fazer uso do direito para interferir na economia e tutelar interesses setoriais ou promover interesses coletivos. "Nesse processo de fragmentação das normas jurídicas, o direito privado descodifica-se e a coesão do universo jurídico passa a ser obtida pela supremacia da Constituição".

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Título: Direito Comercial — Passado, Presente e Futuro
Autor: Cássio Cavalli
Editora: Elsevier
Edição: 2011 — 1ª Edição
Páginas: 273
Preço: R$ 79,00

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