Ócio legislativo

Calendário nacional ganhou 27 datas oficiais em maio

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2 de junho de 2012, 1h26

O aniversário do Buda Shakyamuni, a valorização da família, o reggae e o suinocultor ganharam seus dias no calendário oficial brasileiro. As datas estão entre os 27 dias nacionais criados em leis sancionadas pela presidente Dilma Rousseff em maio deste ano. É um recorde no calendário brasileiro que, em 2011, recebeu oito dias comemorativos e, nos dois primeiros anos do governo Lula, apenas uma.

Além da curiosidade de, neste ano, ser reconhecida a necessidade de o Brasil ter datas específicas para o ouvidor, o artesão, o paisagista, as hemoglobinopatias e o combate e prevenção à trombose, a enxurrada de datas comemorativas pode ser o sintoma da inércia do Poder Legislativo.

O cientista político Frederico Almeida, que coordena o curso de Direito da Fundação Getulio Vargas em São Paulo, afirma que a quantidade de leis “não tão necessárias” aprovadas mostra que as grandes questões do Congresso estão concentradas nas mãos dos líderes de partidos e bancadas. Com isso, “sobra” para o deputado que não é líder a possibilidade de criar este tipo de lei, para dar respostas ao seu eleitorado.

“A satisfação que o deputado que não é líder pode dar ao publico é encaixar emendas no orçamento, o que depende de acordos com lideranças, em um nível mais paroquial, ou dar essas compensações simbólicas, como datas comemorativas”, afirma Almeida.

Entre as “grandes questões” que o professor afirma estarem paradas estão aquelas que levaram ao tão reclamado “ativismo judicial”, ou seja, forçaram o Judiciário a se adiantar, decidindo questões que ainda não estão previstas na lei, como a união civil entre pessoas do mesmo sexo. “Reforma política, tributária processual, são propostas que estão paradas no congresso, esperando as decisões e acordos dos líderes”, reclama.

A aprovação de leis que em pouco interferem no dia a dia da população exemplifica o pior do Congresso, na opinião de Leonardo Palhares, sócio do escritório Almeida Advogados e vice-presidente da Câmara E-net, a Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico. Segundo ele, a preocupação com a aprovação de tais leis tira o foco do que existe no Congresso como exemplo de melhores iniciativas, como audiências públicas.

Palhares tem interesse direto, pela Câmara E-net, na aprovação de leis como a tipificação dos crimes virtuais. “Não é só de interesse do empresariado, mas também da sociedade como um todo, que haja a aprovação de projetos substanciosos, mas que se arrastam há muitos anos sem grandes evoluções por necessitarem de discussão”, afirma o advogado.

Para ele, o melhor que o Legislativo pode fazer é submeter os projetos a consultas públicas online, audiências públicas para que os interessados possam opinar, como tem sido feito com o marco civil da internet. De cujas audiências ele tem participado e espera que, ao fim das consultas, o projeto seja realmente encaminhado para votação. “Ao contrário do que foi feito com a tipificação de crimes na internet, que já contava com um bom projeto engavetado há anos na Câmara mas, por pressões sociais — criadas com o escândalo do vazamento de fotos da atriz Carolina Dieckman —, aprovou-se, às pressas, um outro projeto.”

Contraponto
O diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antônio Augusto de Queiroz, discorda de que o Congresso esteja inerte nas questões importantes. Ele diz que é inquestionável o aumento na quantidade de efemérides sancionadas este ano, mas que isso não tira a atenção das grandes causas, nem é reflexo de que estejam paradas.

“Muitas matérias são de competência exclusiva do Executivo, como orçamentos, que significam 25% das leis, mas os parlamentares se mantêm ativos, apresentando emendas orçamentárias, por exemplo”, afirma Queiroz.

O diretor do Diap explica que a presidente Dilma teve foco em matérias e leis que considerou fundamentais, como valorização do salário mínimo, a correção do imposto de renda, o aviso prévio proporcional, o programa Brasil Maior, Cadastro Positivo, Lei Geral da Copa, Lei de Acesso à Informação, Código Florestal. Muitas dessas leis, diz Queiroz, tiveram origem no Congresso.

A assessoria da Presidência da República diz que coube à presidente apenas sancionar as leis com propostas de dias comemorativos que chegaram à ela pelo Congresso. Nenhuma opinião a respeito do aumento foi emitida.

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