ConJur, ano XV

Para que serve um veículo de informação sobre Justiça

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30 de julho de 2012, 8h08

Selo 15 anos ConJurOs primeiros 15 anos de existência desta revista eletrônica, completados este mês, convidam a equipe que a produz à reflexão. A principal delas, talvez, seja sobre o papel que deve ter este veículo de informação na comunidade. 

Editorialmente, o site se propõe a oferecer informações úteis e confiáveis de forma clara e sintética. Do ângulo operacional, a meta é prestar um serviço. O objetivo da notícia não é encantar ou entreter, mas ser utilitária. Para o advogado, para o juiz, para o cidadão, o fundamental é apoiar o trabalho do operador do Direito ou o interesse da parte com informações úteis para a petição e para a sentença. Apresentar o que é importante de maneira interessante. 

Do ponto de vista filosófico, em contraposição aos veículos não especializados, que elegem a acusação como sua razão de existir, a Consultor Jurídico é um espaço para o direito de defesa. Dito assim, parece algo retórico. Mas imagine se vivêssemos em um país onde a maior parte da população fosse parecida com a torcida que comparece aos estádios do Irã para vibrar com o apedrejamento de supostos pecadores e pecadoras. Aqui, em vez de atirar pedras, atiram-se notícias devastadoras. A execração pública enfraquece de tal forma o acusado que suas chances na Justiça tornam-se praticamente nulas. Não faltam exemplos.

Nesses 5.475 dias publicamos quase 111 mil textos. Uns mais curtos, outros com as dimensões da bíblia. Dá uma média de 20 textos por dia, entre reportagens, notícias, entrevistas e artigos. O site não faz questão de ser imparcial. Mas dá direito aos dois lados. Acreditamos na máxima de Rui Barbosa que definiu o conceito de justo como o ato de tratar desigualmente os desiguais. Cultiva-se, sim, o distanciamento necessário para não se deixar confundir pela emoção, mas luta-se para evitar a comodidade de calar quando se vê uma acusação injusta.

Rede de colaboradores
O filósofo Millôr Fernandes cunhou uma descrição peculiar para o que vem a ser humor. É a situação, dizia ele, em que todo mundo diz uma coisa e você diz outra, diametralmente oposta. E você, descobre-se, é quem está certo. Trocando a palavra “humor” por “jornalismo”, pode-se dizer que este site praticou muito esse esporte nos últimos anos. Essa fratura ficou mais exposta nas célebres “operações da PF”. A fuzilaria contra os acusados era tão estrondosa e contagiosa que todos os alvos já eram considerados, antecipadamente, condenados. Ao depois, via-se, como de fato se viu, que as suposições apresentadas como verdades absolutas não passavam de ficção. Nem todas, evidentemente. 

Ao longo desses 15 anos, o noticiário da Consultor Jurídico foi impulsionado por cerca de cem repórteres que passaram pela sua redação. A equipe atual é composta por 22 jornalistas, com correspondentes nos Estados Unidos, Inglaterra e em mais três capitais brasileiras. 

Mais difícil é mensurar a participação de centenas ou milhares de advogados, representantes do Ministério Público, da magistratura, jornalistas de outras publicações, acadêmicos e assessores de imprensa que enviam suas informações, pautas ou simplesmente nos avisam de erros cometidos — e que são prontamente corrigidos. 

Modelo exemplar
Este veículo se orgulha de ter entre suas fontes alguns dos mais brilhantes cientistas do Direito do país. A equipe é muito grata a todos os que nos ajudaram a ajudar outras pessoas com notícias, informações e análise. Mas um nome em especial deve ser destacado, por ter sido a fonte mais inspiradora na forma deste site enxergar o Direito. Trata-se do ministro do Supremo Tribunal Federal José Celso de Mello Filho, o juiz que mais contribui, na doutrina e na jurisprudência, no sentido de consolidar os direitos fundamentais e as garantias individuais dos brasileiros contra qualquer forma de abuso estatal e de opressão do poder. A opção de retratar melhor a tese jurídica, em desfavor da descrição dos casos concretos, foi uma das muitas lições apreendidas com o notável humanista. 

Não é sem tristeza que acompanhamos os últimos passos do ministro no STF, uma vez que ele, depois de quase 45 anos ininterruptos de serviço público — primeiro, como membro do Ministério Público de São Paulo e, há 22 anos, como ministro — deve se aposentar, voluntariamente, em período muito breve. Não antes, porém, do julgamento do mensalão. Entre suas boas características, tem sido destacada, em livros e estudos acadêmicos sobre a nossa Suprema Corte e a Constituição Federal e, também, por operadores do Direito, um traço especial que distingue a atuação do ministro Celso de Mello no STF: a sua opção de retratar, em votos solidamente fundamentados, a tese jurídica subjacente ao julgamento da causa,  examinando-a, em profundidade, em todos os seus aspectos teóricos para, desse modo, construir a base doutrinária que tem dado suporte às suas decisões e à própria formação da jurisprudência constitucional do STF, notadamente no campo que ele mesmo denomina "jurisprudência das liberdades". 

Linha de conduta
Os jovens repórteres que se incorporam à construção do dia a dia demoram a acostumar com algumas diretrizes que parecem estranhas quando comparadas à prática comum da grande imprensa. Uma delas é a que dá pouca ou nenhuma importância ao nome da parte ou ao valor da causa. Ou seja: o site é principiológico e não casuístico. É preciso repetir incessantemente que o importante neste veículo são os paradigmas, as construções jurídicas, as teses. Quem é do ramo entende a importância disso. 

Outra explicação difícil de passar é que o site não se furta a expor mazelas ou os chamados “escândalos”, mas não é essa sua prioridade. O veículo justifica-se melhor como contraponto ao clima de mata-e-esfola que vigora no país. Até porque tentar competir com os gigantes da imprensa com suas armas e no seu campo seria, no mínimo, redundante. 

Não é por acaso que tão logo informados de problemas com textos, os reparos e esclarecimentos são imediatamente incorporados às notícias. O site se orgulha também de jamais ter-se negado a direito de resposta instantaneamente, sem necessidade de notificação oficial. Tem-se consciência de que em tempos de internet, quando as notícias são eternas, no caso de uma acusação que posteriormente se revela equivocada, a atualização do cenário é fundamental. Acusações indevidas, ainda que respaldadas por investigação policial ou ação do Ministério Público, são reparadas sem necessidade de ação judicial ou sumariamente retiradas do ar, a critério do prejudicado. O site não tem compromisso com seus erros, o que dirá com erros alheios.

Não se pode esquecer da importância dos anunciantes e clientes da Livraria ConJur. São eles que garantem a existência e o funcionamento do site. Nesse aspecto, cabe registro a respeito da série Anuário da Justiça, projeto destinado a radiografar tribunais e mapear a evolução da jurisprudência. Eles são todos editados pelo diretor do site, Maurício Cardoso, jornalista que agregou valor e qualidade ao projeto desde sua chegada, em 2004. 

Esta semana começa o julgamento-espetáculo da Ação Penal 470. O Supremo Tribunal Federal viverá um momento de glória mundana. Todos os holofotes se voltam para os ministros à frente de duas torcidas uniformizadas onde não há muito espaço para a razão. Juridicamente, o caso é pobre. Politicamente, uma festa. Há, porém, ao menos dois fatores a serem destacados no campo da sociologia judiciária. O primeiro é que é esta a primeira vez que um procurador-geral da República, nomeado por um presidente, deixa de arquivar denúncia que atinge o padrinho na testa. A segunda, no que pese a juridicidade da peça, é o fato de um relator, com o mesmo padrinho, aceitar a denúncia. Este site, uma vez mais, cumprirá o seu papel de ouvir os dois lados, como manda o leitor.

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