Universalização dos serviços

Terceirização no setor bancário é prática antiga

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18 de julho de 2012, 9h00

Muito embora as discussões sobre a terceirização tenham se intensificado nesses últimos anos, já que utilizada em todos os ramos de negócio, justamente por mostrar-se útil, tanto para o empresário como para o mercado de trabalho, no setor financeiro ela já existe desde 1966.

Com o incremento da micro finança no mercado financeiro nacional, e a intensificação do crédito consignado, o assunto foi “ressuscitado” pelo Conselho Monetário Nacional, na edição, pelo Banco Central do Brasil, da Resolução 2.707/03, justamente quando da edição da Lei 10.820/03, conversão em lei da Medida Provisória 130/03.

Essa lei veio autorizar o desconto em folha de pagamento de empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho, das prestações de empréstimos, financiamentos e operações de arrendamento mercantil por eles tomados em instituições financeiras e sociedade de arrendamento mercantil, buscando dar segurança a esses descontos, em face da limitação contida no artigo 462 da CLT.

Digo “ressuscitado” tendo em vista que a Resolução 2.640/99, revogada pela Resolução 2.707/03, limitava a atuação dos correspondentes a municípios desassistidos por agência, posto de atendimento ou posto avançado da rede bancária (parágrafo 3º do artigo 1º), o que desestimulava as empresas interessadas nesses serviços, já que tinham que abandonar à prestação dos serviços, assim que as instituições financeiras abrissem agência no local.

Pois bem. No ano de 1966, o Banco Central do Brasil editou a Resolução 29, onde o papel dos bancos era o inverso de hoje. Lá eles eram os prestadores de serviços, já que a resolução facultou as sociedades de crédito imobiliário a celebrarem convênios com estabelecimentos bancários, para estes fazerem a captação de depósito a prazo para aplicação nas atividades daquelas. Até agosto de 1979, a terceirização só podia ocorrer entre sociedades sujeitas à fiscalização pelo Banco Central, ou seja, instituições do ramo financeiro.

No dia 30 de agosto de 1979, a Resolução 562 veio permitir as sociedades de crédito, financiamento e investimentos, a contratarem “sociedades prestadoras de serviços” para o encaminhamento de propostas de financiamento, análise de crédito e cadastro, serviços de cobrança e outros serviços de controle, inclusive de processamento de dados (inciso IV). Iniciou aí o relacionamento trilateral, entre instituição financeira, sociedade prestadora de serviços e seus respectivos empregados, relação esta ainda vigente.

É interessante observar que, mesmo no ano de 1979, quando o Judiciário trabalhista, operadores do direito e a doutrina ainda não estavam contaminados com a utilização do critério da atividade empresarial como norte para a licitude ou não da terceirização, fato este consolidado em 1993 com a edição da Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, o Banco Central já preocupava com esta questão, enquanto órgão regulamentador do setor. No inciso I da Resolução 562/79, já era determinado quais eram as atividades privativas das instituições financeiras, portanto atividade-fim, não passíveis de serem terceirizadas às “sociedades prestadoras de serviços”.

Até então essas sociedades não tinham uma denominação. Somente em 1973, através da Circular 220, veio a ser utilizado, pela primeira vez, o termo “correspondente”. Nessa circular manteve-se a faculdade de contratação de correspondentes, e os serviços a serem prestados se resumiram na cobrança de títulos e execução, ativa ou passiva, de ordens de pagamento em nome do contratante, vedadas outras operações, inclusive a concessão de empréstimos e a captação de depósitos.

Em 1995 a Resolução 2.166 estendeu aos bancos múltiplos e as sociedades com carteira de crédito, financiamento de investimentos, a possibilidade de contratarem Correspondentes para a execução dos serviços elencados na Resolução 562, do dia 30 agosto 1979.

Iniciando a segunda etapa da regulação do mercado financeiro, foi editada, em 1999, a Resolução 2.640, que estendeu essa faculdade também aos bancos comerciais e à Caixa Econômica Federal, acrescendo ao rol de serviços a recepção e encaminhamento de proposta de abertura de contas de depósito à vista, a prazo e de poupança; de recebimentos e pagamentos relativos a essas contas, bem como aplicação em fundos de investimentos.

Essa resolução, como dito antes, limitava a atuação dos correspondentes onde as instituições não possuíssem agência, posto de atendimento bancário ou posto avançando de atendimento, o que era contrário ao objetivo do Governo Federal, que era justamente a capilarização da rede bancária, com objetivo alcançar toda a população.

Como o objetivo do Correspondente é justamente a capilarização da rede bancária e a expansão do microcrédito, a proibição contida na Resolução 2.640 mostrou-se contrária a esse objetivo, quando, em março de 2000, foi editada a Resolução 2.707, revogando essas disposições limitativas.

É de ressaltar que a Resolução 2.953, de 25 de abril de 2002, estendeu aos cartórios notarias e de registro, a possibilidade de atuarem como Correspondente, tudo com o objetivo da capilarização da rede bancária.

Até 30 de julho de 2003, era proibido o substabelecimento dos serviços pelos correspondentes (quarteirização como quer o judiciário trabalhista e a doutrina), permissão esta que veio através da Resolução 3.110, de 31 de julho de 2003.

O rol das atividades passíveis de serem prestadas pelos Correspondentes oscilou muito nas edições dessas Resoluções, consolidando, na época, na Resolução 3.156, de 17 de dezembro de 2003.

Em 24 de fevereiro de 2011, foi editada a Resolução 3.954 consolidando as normas que versavam sobre o correspondente, acrescendo ao rol de serviços as operações de arrendamento mercantil, recebimento e pagamentos relacionados a letras de câmbio, serviços esses vedados à entidade cuja atividade principal seja a prestação de serviços de correspondente.

Em 31 de março de 2011, veio a Resolução 3.959, retirando a cobrança judicial dos serviços passíveis de serem prestados pelos Correspondentes, abrindo uma brecha no parágrafo 4º do artigo 3º da Resolução 3.954/11, para que o administrador de instituição financeira, que também seja controlador desta, possa desempenhar a atividade de correspondente.

A terceirização estava tomando proporções indesejáveis para o Sindicato dos Bancários, a ponto de existir correspondente dentro das agências bancárias tomadoras dos serviços (os chamados transacionais), sendo que a Resolução 4.035, de 30 de novembro de 2011, atendendo ao reclame do Sindicato e parlamentares ligados a esses movimentos, veio proibir a prática a partir de 2 de abril de 2012.

Atendendo pedidos das instituições e dos próprios correspondentes, a Resolução 4.042, de dia 15 de dezembro de 2011, estendeu o prazo para o dia 2 de abril de 2012, que por sua vez foi prorrogado para o dia 1º de novembro de 2012, através da Resolução 4.058/12.

Estas são as normas, em linhas gerais, que descrevem o histórico da terceirização na área bancária, e todas tiveram e têm a finalidade da universalização dos serviços financeiros, sendo que a massificação desses serviços contribuiu e vem contribuindo para a inclusão, no mercado de consumo, de parcela significativa da população que estava alijada desses serviços, exatamente pela falta de capilarização da rede bancária. Igual aos demais setores da economia, busca-se, aqui, a especialização de serviços.

Segundo últimos dados do Banco Central do Brasil (junho de 2010), existem cerca de 150.000 correspondentes contra aproximadamente 20.000 agências bancárias; estão presentes em todos os estados da Federação; alcançam 5.564 municípios brasileiros contra 3.478 municípios atendidos por agências bancárias; são responsáveis pelo pagamento de 68,5% do bolsa família; e 9,3% dos pagamentos e transferências de valores.

Ainda com dados do Banco Central do Brasil, os correspondentes tornaram-se o principal canal de pagamentos de contas, de tributos e de transferência de recursos, sendo responsáveis por 2 bilhões de transações desse gênero em 2010.

Inegável também afirmar, sem medo de errar, que a adoção dessa forma de administração de negócios contribuiu, e muito, para a abertura de centenas de postos de trabalho, principalmente para a grande massa da mão de obra economicamente ativa desqualificada ou desprezada pelo mercado de trabalho competitivo. Inegável também dizer que mazelas foram criadas, pois em todo negócio os dois lados da moeda estão presentes.

A sociedade com um todo, deve ter sabedoria para separar o joio do trigo nessa relação que se mostra conturbada, com conflitos de interesses um tanto escusos capazes de prejudicar um bem maior, buscando uma segurança jurídica para todas as partes envolvidas nesse processo de terceirização.

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