Termos da condicional

Condenado por incitar ao suicídio tem pena parcelada

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18 de julho de 2012, 16h39

O Tribunal de Recursos de Minnesota, estado dos EUA, manteve, nesta terça-feira (17/7), a condenação de um ex-enfermeiro que, em salas de bate-papo na Internet, encorajou duas pessoas a cometerem suicídio. E sentenciou o réu a seis anos de prisão. Mas o "mau conselheiro" não terá de pagar integralmente a pena se seguir os termos do livramento condicional. Entre outras condições estabelecidas, ele terá, obrigatoriamente, de passar 360 dias na cadeia: 320 de entrada e 40 à prestação. Isto é, depois de 320 dias atrás das grades, ele será solto, mas voltará à prisão por dois dias consecutivos, nos aniversários das mortes de cada um dos suicidas — o que dá quatro dias por ano —, por um período de dez anos. As informações são da CBS News e da BusinessWeek, com a agência Associated Press (AP). 

À parte a inusitada sentença do tribunal de recursos, a decisão da Justiça americana, desde a primeira instância, se desenvolveu em torno do debate sobre dois temas: a abrangência do direito à liberdade de expressão e a criminalização do incitamento ao suicídio. 

A liberdade de expressão (freedom of speech and expression) faz parte dos direitos fundamentais do cidadão, previstos na Primeira Emenda da Constituição dos Estados Unidos, que segue o artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos e a legislação internacional de direitos humanos. Os outros direitos, na terminologia americana, são as liberdades de estabelecer e de praticar religião, a liberdade de imprensa, o direito de reunião em assembleia pacífica e o direito de peticionar ao governo, em alguns casos. 

O que se discutiu no processo era se o incitamento ao suicídio é ou não protegido pelo direito à liberdade de expressão. A liberdade de expressão, também chamada de liberdade de fala, inclui qualquer ato de buscar, receber e transmitir informações ou ideias, independentemente do meio usado. Mas, na prática, esse não é um direito absoluto em qualquer país. Esse direito é comumente sujeito a limitações, tais como calúnia e difamação, obscenidade e incitamento ao cometimento de crime. 

A discussão subsequente, portanto, foi se o incitamento ao cometimento de suicídio é crime. Na opinião dos juízes do Tribunal de Recursos de Minnesota, é crime. O caráter criminoso dos atos praticados pelo ex-enfermeiro William Melchert-Dinkel, de 49 anos, é reforçado pela constatação de que, de certa forma, os casos são de suicídio assistido, o que é proibido pela lei de Minnesota. "O tribunal entende que a lei estadual sobre o suicídio assistido não viola a Primeira Emenda, porque ela proíbe qualquer forma de expressão que seja essencial para a prática de uma conduta que o Estado quer evitar", escreveu o juiz Kevin Ross, em nome do tribunal. "Estamos convencidos de que a Constituição não imuniza o comportamento mórbido e predatório de Melchert-Dinkel, simplesmente porque ele se concretiza na forma de palavras escritas. A Primeira Emenda definitivamente não protege todas as formas de expressão", argumentou. 

Não havia muito o que discutir sobre o "comportamento mórbido e predatório" do ex-enfermeiro. Ele mesmo declarou à polícia que buscava pessoas com tendências suicidas em salas de bate-papo e em redes sociais na Internet "pela excitação da caça". Confessou que entrou em um bate-papo online sobre suicídio com 20 pessoas e fez um pacto de suicídio, falso da parte dele, com dez delas. Dessas dez pessoas, cinco efetivamente cometeram suicídio. 

Segundo os autos do processo, Melchert-Dinkel era obcecado pelo tema. Buscava pessoas deprimidas na Internet e, quando as encontrava, se apresentava falsamente como uma enfermeira cheia de compaixão e lhes explicava como podiam cometer suicídio. Tinha uma preferência por enforcamentos. 

A polícia rastreou Melchert-Dinkel na Internet a partir de 2008, depois que um cidadão inglês contatou as autoridades policiais de Saint Paul, Minnesota, para denunciar um "predador online", que estava encorajando pessoas a se enforcar. No ano passado, ele foi condenado pelas mortes do inglês Mark Drybrough, de 32 anos, de Coventry, Inglaterra, que se enforcou, e da canadense Nadia Kajouji, de 18 anos, de Brampton, Ontário, que se jogou nas águas quase congeladas de um rio. 

No julgamento, ele reconheceu que o que fez foi moralmente errado, mas argumentou que "meramente exerceu seu direito à liberdade de expressão". Os tribunais rejeitaram esse argumento em primeira instância e em recurso. Seu advogado, Terry Watkins, sustentou a tese de que seu cliente não levou ninguém a cometer suicídio através de convencimento. Ele só teria oferecido apoio emocional a pessoas que já haviam decidido tirar suas próprias vidas. O advogado reconheceu que a conduta de seu cliente foi repugnante, mas que, apesar disso, estava protegida pela Primeira Emenda. 

As cortes discordaram da defesa. Concordaram com a acusação, que defendeu a tese de que o ex-enfermeiro, virtualmente travestido de enfermeira piedosa, convenceu, sim, as vítimas a cometer suicídio, porque sem essa ajuda, elas não teriam se matado. O tribunal de recursos observou que as duas pessoas que se suicidaram o fizeram um pouco depois de receberem mensagens de Melchert-Dinkel, incitando-as a se matar. No caso de Drybrough, ele teria fornecido instruções sobre como se enforcar. "As vítimas tinham problemas mentais e viviam à beira da morte. Tudo o que elas precisavam era do empurrão de Drybrough", escreveu o juiz. 

Melchert-Dinkel não poderá perder um dia de pagamento de sua pena parcelada de prisão, vencida a cada aniversário da morte de suas vítimas, nem violar qualquer condição das estabelecidas pelo livramento condicional. A "multa" por desobediência é de seis anos de prisão.

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