Orçamento público

Evolução de gastos com direitos é objeto de análise

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5 de julho de 2012, 15h12

O presente artigo tem por objetivo, mesmo que superficialmente, analisar os custos dos direitos. Ganha importância o tema cada vez mais pelo seu aspecto multidiscilplinar

O marco teórico desse estudo se centrará em dois livros em especial: Stephen Holmes e Cassa Sunstein. The cost os rigths – why liberty depends on Taxes. New York: Norton, 1999 e Fábio Giambiagi e Ana Cláudia Além. Finanças públicas – Teoria e prática no Brasil. Rio de Janeiro: Campus Elsevier, 2008.

Tendo isso em conta, a presente reflexão busca orientar aqueles que se interessam pelo tema, bem como tecer algumas considerações a respeito da sistemática da lei orçamentária anual, para que, posteriormente, tais dados sejam analisados com base nos marcos teóricos eleitos.

Conceitos prévios
O orçamento, como não poderia deixar de ser, tem seus contornos iniciais delineados na Constituição Federal, cabendo exclusivamente ao Congresso Nacional legislar a respeito dessa questão[1]. O Presidente, todavia, tem a iniciativa exclusiva de enviar tais propostas nos termos do artigo 84 da Constituição[2][3].

Para entender o orçamento, inicialmente deve ser em conta alguns conceitos que são prévios. Entre eles tem-se o plano plurianual que, segundo a Constituição, “estabelecerá, de forma regionalizada, as diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal para as despesas de capital e outras delas decorrentes e para as relativas aos programas de duração continuada.”

Um passo seguinte é a elaboração da lei de diretrizes orçamentárias. Referida lei, segundo o artigo 165, parágrafo 4º: “compreenderá as metas e prioridades da administração pública federal, incluindo as despesas de capital para o exercício financeiro subseqüente, orientará a elaboração da lei orçamentária anual, disporá sobre as alterações na legislação tributária e estabelecerá a política de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento.”

Em seguida, chega-se, propriamente, ao conceito de orçamento. Os contornos do orçamento estão estabelecidos no artigo 165, parágrafo 5º, verbis:

parágrafo 5º – A lei orçamentária anual compreenderá: I – o orçamento fiscal referente aos Poderes da União, seus fundos, órgãos e entidades da administração direta e indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público; II – o orçamento de investimento das empresas em que a União, direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a voto;III – o orçamento da seguridade social, abrangendo todas as entidades e órgãos a ela vinculados, da administração direta ou indireta, bem como os fundos e fundações instituídos e mantidos pelo Poder Público.

parágrafo 6º – O projeto de lei orçamentária será acompanhado de demonstrativo regionalizado do efeito, sobre as receitas e despesas, decorrente de isenções, anistias, remissões, subsídios e benefícios de natureza financeira, tributária e creditícia.

E, para análise do orçamento, especialmente, a classificação orçamentária, deve-se recorrer ao disposto na Portaria 42, de 14.04.1999, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão[4], que assim dispõe:

Art. 1° As funções a que se refere o art. 2º, inciso I, da Lei nº 4.320, de 17de março de 1964, discriminadas no Anexo 5 da mesma Lei, e alterações posteriores, passam a ser as constantes do Anexo que acompanha esta Portaria.

parágrafo 1º Como função, deve entender-se o maior nível de agregação das diversas áreas que competem ao setor público.

parágrafo 2º A função "Encargos Especiais" engloba as ações em relação às quais não se possa associar um bem ou serviço a ser gerado no processo produtivo corrente, tais como: dívidas, transferências, ressarcimentos, indenizações e outras afins, representando, portanto, uma agregação neutra.

parágrafo 3º A subfunção representa uma partição da função, visando a agregar determinado subconjunto do setor público.

Art. 2º Para os efeitos da presente Portaria, entendem-se por:

a) Programa, o instrumento de organização da ação governamental visando à concretização dos objetivos pretendidos, sendo mensurado por metas estabelecidas no plano plurianual;

b) Projeto, um instrumento de programação para alcançar o objetivo de um programa, envolvendo um conjunto de operações, limitadas no tempo, das quais resulta um produto que concorre para a expansão ou o aperfeiçoamento da ação do Governo;

c) Atividade, um instrumento de programação para alcançar o objetivo de um programa, envolvendo um conjunto de operações que se realizam de modo contínuo e permanente, das quais resulta um produto necessário à manutenção da ação do Governo;

d) Operações Especiais, as despesas que não contribuem para a manutenção das ações de governo, das quais não resulta um produto, e não geram contraprestação sob a forma de bem ou serviço, representando, basicamente, o detalhamento da função "Encargos Especiais" a que serefere o parágrafo 2º do art. 1º.

Art. 5º A dotação global denominada "Reserva de Contingência", permitida para a União no art. 91 do Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967, ou em atos das demais esferas de Governo, a ser utilizada como fonte de recursos para abertura de créditos adicionais e sob coordenação do órgão responsável pela sua destinação, será identificada por código definido pelos diversos níveis de governo.

Feito esse pequeno registro dos contornos constitucionais do gasto público, cabe agora avaliar alguns detalhes do orçamento deste ano.

Análise do orçamento

No Anexo II da Lei orçamentária, tem-se a previsão de despesas dos orçamentos fiscal e da seguridade social, por órgão orçamentário.

Uma primeira análise do referido anexo já viabiliza uma riqueza de detalhes que possibilita uma série de análises a e comparações que são pouco comuns no âmbito do direito aplicado nos tribunais.

Algumas observações interessantes podem ser indicadas:

1) Há duas colunas que estabelecem tanto o valor disponibilizado pelo tesouro, quanto o destinado ao órgão por outras fontes. No valor destinado a cada órgão também estão concentrados os valores destinados as entidades vinculadas.

2) Em relação ao valor disponibilizado pelo Tesouro, os cinco primeiros colocados são:

a. Refinanciamento da dívida pública mobiliária da União, com R$ 652.238.053.224,00;

b. Encargos financeiros da União, com R$ 372.882.893361,00;

c. Ministério da Previdência Social, com R$ 329.761.473.753,00;

d. Ministério da Saúde, com R$ 91.562.479.543;

e. Ministério da Educação, com R$ 72.488.643.043;

3) Já os cinco últimos colocados são:

a. Conselho Nacional do Ministério Público, com R$ 71.869.217,00;

b. Conselho Nacional de Justiça, com R$ 235.842.984,00;

c. Ministério da Pesca e Aquicultura, com R$ 324.534.113,00;

d. Justiça Militar da União, com R$ 388.205.646,00;

e. Supremo Tribunal Federal, com R$ 525.207.236;

Por essa breve análise, já se pode inferir que a prioridade de gastos do governo federal está na rolagem da dívida pública, assumida em outros momentos.

Por outro lado, nota-se que os gastos em Previdência, Educação e Saúde revelam, como segunda prioridade, o gasto com típicos direitos fundamentais de segunda geração. Mas, mesmo tendo a Previdência, Saúde e Educação entre os cinco primeiros colocados, ainda é importante verificar quanto desse orçamento é gasto com atividades eminentemente finalística.

Outras comparações interessantes que decorreram dessa análise superficial:

Avaliando os dados entre os Tribunais, pode-se efetuar comparações interessantes. O orçamento do STF para o ano de 2012 é de R$ 525.207.236,00, sendo que no ano de 2011, aquele Tribunal recebeu por volta de 60 mil processos[5]. Por outro lado, no caso do STJ, o orçamento é de R$ 964.712.754 para o ano de 2012, sendo que o número de processo novos em 2011 tenha sido superior a 300 mil novos processos[6][7].

Outra observação interessante: O gasto proporcional por membro da casa no Senado é bem superior ao gasto por membro da Câmara de Deputados.

Dentre as Justiças, aquela que mais tem recursos destinados é a Justiça do trabalho.

Quanto às verbas destinadas aos Ministérios, os “campeões” são Previdência, Saúde, Educação, Trabalho, Cidades e Fazenda.

Os Ministérios da Cultura, Turismo, Esporte, Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e Relações Exteriores tem orçamentos semelhantes, por volta de R$ 2.000.000.000,00 e, digamos assim, são os Ministérios que tem menos recursos destinados. Apenas o orçamento do Ministério da Fazenda, sozinho, R$ 20.955.742.127,00 supera o orçamento de todos aqueles Ministérios somados.

Tendo em vista esse pequeno passeio pelos valores previstos, chama a atenção também os valores destinados a transferências a Estado, Distrito Federal e Municípios, com R$ 202.049.249.429,00. Do valor total do orçamento previsto para o ano de 2012 – R$ 2.140.486.686.044,00, concluiu-se que o valor destinado a transferência aos demais entes da federação equivale a pouco mais de 10% do valor total.

Voltando os olhos para o orçamento específico de cada órgão, este se inicia por um quadro síntese em que se reúnem os dados do Ministério e também das entidades vinculadas.

Nesse quadro, pode-se constatar: 1) O valor total executado em 2010; 2) O valor previsto na Lei orçamentária de 2011; 3) O valor previsto no Projeto de Lei orçamentária do ano 2012; 4) o valor efetivamente previsto no orçamento em 2012, após a análise do Congresso Nacional.

Essa evolução, sem dúvida alguma, confere um belo instrumento de análise, especialmente, de planejamento do estado em relação à função finalística daquela entidade, bem como se o Estado está envidando esforços na implementação de determinada política pública.

Além disso, esse quadro resumo ainda informa algumas subdivisões, quais sejam: Programa, Função, subfunção, unidades, grupos de despesas e a fonte de recursos, nos termos da classificação orçamentária estabelecida pela Portaria acima mencionada.

Nesse quadro síntese está exposta toda a estrutura de gasto do órgão ou entidade. Com a análise de cada uma dessas classificações será possível analisar a qualidade do gasto público, com base no marco teórico eleito pelo Grupo de pesquisa.

Essa análise, sem dúvida alguma, poderá viabilizar a resposta as seguintes questões, exemplificadamente: 1) Quanto do valor orçamentário é destinado à atividade finalística do Governo? 2) Viabilizar comparações entre estruturas e missões conferidas constitucionalmente ministério e se elas guardam compatibilidade financeira com a importância da missão a ser cumprida. 3) Se haveria algum espaço para questionar a viabilidade exclusivamente financeira de determinados órgãos ou entidade? 4) A Análise do orçamento pode orientar o juiz a decidir pela intervenção ou não de determinada política pública?

Enfim, pela breve análise agora exposta, pode-se notar que há um campo novo para exploração do jurista. Essa nova abordagem, que será objeto de aprofundamento pelo grupo de pesquisa de que mencionado no início do texto, poderá orientar melhor a participação do Direito na implementação de determinada política pública. Também poderá fornecer bons subsídios para discussão a respeito da possibilidade e dos critérios que devem ser objetos de reflexão pelo Poder Judiciário quando se está em jogo a intervenção em determinada política pública, com vistas a concretização de determinado direito fundamental.


[1] Art. 48. Cabe ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, não exigida esta para o especificado nos arts. 49, 51 e 52, dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente sobre:II – plano plurianual, diretrizes orçamentárias, orçamento anual, operações de crédito, dívida pública e emissões de curso forçado;

[2]Art. 84(…) XXIII – enviar ao Congresso Nacional o plano plurianual, o projeto de lei de diretrizes orçamentárias e as propostas de orçamento previstos nesta Constituição;

[3] Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão:I – o plano plurianual;II – as diretrizes orçamentárias;III – os orçamentos anuais.

[4] Disponível em http://www.planejamento.gov.br/secretaria.asp?cat=248&sub=267&sec=8

[5] Segundo os dados, em 2011 chegaram à Corte 63.328 processos, tendo sido distribuídos 37.519 aos ministros-relatores. A média de distribuição foi de 3.752 processos por ministro, que receberam 312,65 novos processos por mês. Disponível em http://m.stf.jus.br/portal/noticia/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=196796 Vale informar também que entre os processos julgados, neste ano foram proferidas 100.294 decisões pelo STF, excluindo-se apenas as decisões interlocutórias

[6] Todos os dias chegam à Corte, em média, de 1.200 processos. No ano, são mais de 300 mil, distribuídos entre 33 ministros. Disponível em http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=105006 Vale informar que O Superior Tribunal de Justiça decidiu, ao longo deste ano, exatos trezentos e nove mil, quatrocentos e setenta e cinco processos, sob responsabilidade de Turmas, Seções, Corte Especial e ministros relatores

[7] Outros dados especialmente interessantes podem ser encontrados no trabalho denominado Justiça em Números disponibilizado pelo Conselho Nacional de Justiça.

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