Sinal dos tempos

Justiça determina arrolamento de bens de casal gay

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1 de julho de 2012, 5h05

Dez anos de convivência e um patrimônio em comum. Com a separação dos cônjuges, a divisão dos bens correria na maior tranquilidade, se não fosse por um detalhe: o casal era formado por pessoas do mesmo sexo e tudo que adquiriram ao longo da união estava registrado no nome de apenas um deles. No último dia 31 de maio, a 3ª Vara de Família de Goiás deu a primeira palavra sobre o assunto. O juiz Sival Guerra Pires concedeu a liminar de arrolamento de bens e deixou para apreciar os alimentos após a citação.

A advogada Chyntia Barcellos, especialista em Direito Homoafetivo, Famílias e Sucessões, acredita que a decisão é inédita no Brasil. Ela explica que a Ação de Reconhecimento de União Estável entre parceiros do mesmo sexo é cumulada com dissolução, partilha, arrolamento de bens e pensão alimentícia. A advogada pede, na Justiça, a divisão dos bens de forma equitativa.

No final de 2011, o casal se separou. Segundo a advogada, como a união não foi formalizada por meio de escritura pública, o vínculo, além de dissolvido, tem que ser reconhecido pela Justiça. “Nesse caso particular, o juiz antes de resolver a ação acolheu parcialmente o pedido liminar de arrolamento de bens, pois diante da separação, como os bens estão em nome do outro companheiro, é temerária a dilapidação do patrimônio, o que prejudicaria por demais meu cliente”, conta Chyntia.

Na inicial, a advogada alega que está “configurada a união homoafetiva entre os autores, como uma convivência pública, contínua, duradoura e com o objetivo de constituição de família”. Ela toma como base dois dispositivos do Código Civil, os artigos 1.658 e 1.725, segundo os quais, respectivamente, “no regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções dos artigos seguintes” e “na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber o regime da comunhão parcial de bens”.

O pedido cita, ainda, doutrina da civilista Maria Helena Diniz. De acordo com ela, “no regime da comunhão parcial, todos os bens amealhados durante o relacionamento são considerados fruto do trabalho comum. Presume-se que foram adquiridos por colaboração mútua, passando a pertencer a ambos em parte iguais. Instala-se um estado de condomínio entre o par, que é chamado de mancomunhão. A presunção de propriedade do titular aparente no registro não é mais absoluta, e o companheiro é patrimonialmente equiparado ao cônjuge”.

Segundo a doutrinadora, “adquirido o bem por um, transforma-se em propriedade comum, devendo ser partilhado por metade na hipótese de dissolução do vínculo. Portanto, quem vive em união estável e adquire algum bem, ainda que em nome próprio não é o seu titular exclusivo. O fato de o patrimônio figurar como de propriedade de um não afasta a cotitularidade do outro”.

Já o pedido de alimentos, ainda não apreciado na liminar, tem como fundamento o artigo 7º da Lei 9.278, de 1996, segundo o qual “dissolvida a união estável, a assistência material prevista nesta Lei será prestada por um dos conviventes ao que dela necessitar, a título de alimentos”. A advogada pediu seis salários mínimos mensais como alimentos para o ex-companheiro.

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