Tratamento involuntário

Dois usuários de drogas são internados à força por dia

Autor

22 de janeiro de 2012, 13h55

Enquanto se discute na esfera judicial se a internação compulsória de viciados em crack é válida ou não, pelo menos 5.103 dependentes desta e de outras drogas foram internados de forma involuntária em São Paulo nos últimos oito anos. Na média, são quase dois por dia. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo que ainda revela que, contando com doenças psiquiátricas, esse número pula para 32.719 casos.

A maior parte dos pacientes involuntários apresenta diagnóstico de psicose, esquizofrenia e dependência química provocada por álcool e drogas – doenças diretamente associadas, segundo especialistas, que somam mais de 20 mil casos. Na lista, há relatos de transtornos causados por crack, cocaína, heroína e maconha entre usuários de até 60 anos, incluindo adolescentes.

Os dados são do Ministério Público Estadual, que deve ser notificado quando a internação involuntária ocorre mediante aprovação da família em um prazo máximo de 72 horas. A regra vale para qualquer diagnóstico, relacionado ou não ao uso de álcool e drogas.

Apesar de polêmica, a medida é considerada legal em todo o país desde abril de 2001, a partir da publicação da Lei 10.216, que permite que parentes optem pelo tratamento mesmo sem consentimento do paciente. A legalidade da internação, no entanto, depende da apresentação de um laudo médico, assinado por um psiquiatra.

A exigência médica — aliada à regra que proíbe que o tratamento involuntário seja solicitado por cônjuge — promove, segundo representantes do MP, uma subnotificação, especialmente entre pacientes com alto poder aquisitivo, que podem pagar clínicas particulares.

Responsável pelo controle dos dados, o promotor de Justiça Mário Coimbra afirma que um número muito maior de pessoas passa ou já passou por internações contra vontade na capital e em outras cidades do Estado. "Isso ocorre porque as clínicas clandestinas que afirmam tratar dependentes químicos se proliferam no Estado. Elas não fazem a notificação obrigatória quando recebem um paciente internado de forma involuntária porque são irregulares, não têm estrutura física ou médica e, muitas vezes, nem tratamento oferecem", diz Coimbra, que coordena o Centro de Apoio Operacional (CAO) Cível e de Tutela Coletiva da Saúde Pública.

O promotor defende a criação de uma legislação específica que regule o trabalho dessas instituições, a fim de evitar que familiares se iludam com propagandas enganosas e pacientes sejam maltratados durante a internação. "Temos de promover uma ampla discussão sobre o tema, que determine novas condições de fiscalização. O Ministério Público não tem como atuar sozinho", afirma Coimbra. 

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!