Direito & Literatura

O livro O Mercador de Veneza, de William Shakespeare

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20 de janeiro de 2012, 18h15

Direito e Literatura: do Fato à Ficção é um programa de televisão apresentado pelo procurador de Justiça do Rio Grande do Sul e professor da Unisinos Lênio Streck, onde é discutido, com convidados, uma obra literária e seu diálogo com o Direito. A obra desta edição, que a ConJur reproduz a seguir, é O Mercador de Veneza, do mundialmente conhecido William Shakespeare. Participam do debate o professor e o doutor em Direito Alfredo Culleton e o professor doutor em Letras Antonio Sanseverino. Assista ao vídeo e leia a resenha do programa feita pela jornalista Camila Mendonça.

Direito e Literatura – O mercador de Veneza from Unisinos on Vimeo.

Bassânio, um nobre veneziano que perdeu toda sua herança, planeja casar-se com Pórcia, uma bela e rica herdeira. Seu amigo Antonio concorda em lhe emprestar o capital necessário para que ele viaje até Belmonte, onde vive Pórcia. Como Antonio é um mercador, toda a sua fortuna está investida numa frota de navios mercantes que navegam em águas estrangeiras. Ele faz um empréstimo com Shylock, um mercenário judeu que concorda em emprestar o dinheiro desde que Antonio empenhe uma libra de sua própria carne como garantia. Bassânio chega a Belmonte e descobre que para ganhar a mão de Pórcia terá que se submeter a um teste envolvendo três arcas deixadas pelo pai da moça antes de morrer. Graças a um truque de Pórcia, ele se dá bem, mas logo após o casamento chega a notícia de que os barcos de Antonio naufragaram e ele perdeu toda sua fortuna, estando sua vida, agora, nas mãos de Shylock. Bassânio volta para Veneza enquanto Pórcia arquiteta um plano para ajudar Antonio: se traveste de juiz para tentar salvá-lo durante o julgamento e ao mesmo tempo testar o amor de Bassânio por ela.

O professor Sanseverino explica que a figura do judeu geralmente está associada ao dinheiro, a usura. É impossível falar dessa obra sem discutir se Shakespeare foi ou não antissemita ao criar o personagem de Shylock. “Essas personagens burguesas têm perfil limitado, e Shylock é uma exceção, pela sua complexidade”. Na visão do professor, o judeu de O Mercador de Veneza exibe uma complexidade que ultrapassa qualquer estereótipo.

Sanseverino explica que na cena do julgamento Shylock fala: "Se vocês têm direito de ter escravos, porque eu não posso querer uma libra de carne?". Na visão do especialista, demonstra a complexidade do personagem. Shakespeare vai além do antissemitismo.

Culleton esclarece que, em se tratando de antissemitismos, nada pode ser comparado ao que ocorreu na 2ª Guerra Mundial, ainda que ele sempre tenha existido na Europa. Na visão do professor de Direito, o antissemitismo shakespereano é diferente do contemporâneo, pois traz de novo uma compreensão de homem complexa — ele já não é bom ou mal e sim cheio de dobras. “Vamos encontrando um Shylock vítima e vitimado, há vingança, ódio e amor na mesma pessoa”.

Esse conceito também pode ser aplicado ao Direito, pois não basta chegar a um julgamento e declarar culpado ou inocente, é preciso mostrar toda a complexidade do ser humano. “Antonio também é um personagem complexo, ele chutava e cuspia nos judeus”, relata Culleton.

Outra questão interessante da obra diz respeito à questão contratual. Por que não estar na cláusula penal uma libra de carne? Como fica essa questão do julgamento no Direito? São as indagações do apresentador do programa.

Culleton lembra, ainda, que a narrativa do livro é constituída por três contratos: o mais conhecido, da libra de carne; o do casamento de Pórcia com Antonio.; e o fato de Pórsia ter sido jurada a outro marido pelo pai em seu leito de morte.

A preocupação do autor é mostrar a complexidade da alma humana, num paradigma de uma vontade que dever ser respeitada, a de quem assinou um contrato.

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