Confilto de leis

STF vai decidir se RPVs podem ser pagas em 180 dias

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18 de fevereiro de 2012, 6h42

Enquanto não for julgada a Ação Direta de Inconstitucionalidade do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil contra a lei gaúcha sobre as requisições de pequeno valor, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul não pode dar sua palavra sobre a constitucionalidade da mesma lei. A consideração foi feita nesta quinta-feira (16/2), durante julgamento de Agravo de Instrumento proposto pelo governo do Rio Grande do Sul.

Na ADI, a OAB impugna a lei gaúcha que regulamenta o pagamento de requisições de pequeno valor. A entidade  alega a "incompatibilidade" da lei com a Constituição Federal e a classifica como "calote oficial", que afetará "créditos de natureza alimentar de milhares de servidores ativos, inativos e de pensionistas no estado do Rio Grande do Sul, muitos já em idade avançada".

A decisão do TJ-RS teve como base a Súmula Vinculante 10 do Supremo, segundo a qual "viola a cláusula de reserva de plenário a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte". Enquanto a ADI apresentada pelo Conselho Federal da OAB não for julgada, o assunto das requisições de pequeno valor no Rio Grande do Sul fica sem resposta.

No estado, as requisições de pequeno valor são reguladas por duas leis, uma estadual — que institui ordem cronológica para o adimplemento — e outra federal, criando uma fila dupla de pagamento, à semelhança do que acontece com os créditos de maior valor. Na quinta-feira, o TJ gaúcho ia decidir qual legislação deveria prevalecer.

RPVs gaúchas
A Constituição Federal delegou aos estados, por meio de leis elaboradas pelas Assembleias Legislativas, a regulamentação do assunto. O artigo 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias estabelece que são considerados de pequeno valor os débitos ou obrigações de até 40 salários mínimos perante a Fazenda dos estados e do Distrito Federal e também os de até 30 salários-mínimos, perante a Fazenda dos municípios. Caso ultrapasse esse valor, o credor será incluído na fila dos precatórios.

Apesar da recomendação do ADCT, a Lei Federal 10.259, de 2001, disciplinou o assunto de vez, definindo o novo limite dos débitos considerados de pequeno valor em 60 salários-mínimos por beneficiário, obedecendo ao mesmo limite para competência do Juizado Federal Cível. E determinou que o pagamento das RPVs deve ser feito em até 60 dias.

Ainda assim, dez anos depois, o governador Tarso Genro aprovou a Lei 13.756, de 2011. Resultado: contrariando a lei federal, no Rio Grande do Sul, as requisições de pequeno valor devem ser pagas dentro de 180 dias, obedecendo a uma espécie de fila cronológica — assim como acontece com os precatórios.

De acordo com o artigo 2º da lei estadual, "o crédito de pequeno valor não estará sujeito ao regime de precatórios e deverá ser pago, mediante depósito judicial, no prazo de até cento e oitenta dias, contados da data em que for protocolada, perante o órgão competente, a requisição expedida pelo juízo da execução, observada a ordem cronológica própria, conforme regulamento".

Por meio das RPVs, o Estado-Administração Direta, as autarquias e as fundações pagam os credores quando são condenados em processo judicial, em ação transitada em julgado, em casos como diferenças de vencimentos ou proventos de servidores públicos, pensões e benefícios previdenciários. É justamente o seu teto que a diferencia dos precatórios.

O tributarista Telmo Schorr explica que "diversamente do que prevê a lei federal e a Constituição Federal, a nova lei resolve estabelecer valores pequenos com um prazo de pagamento e um prazo maior, de 180 dias, para valores que excedam os sete salários mínimos". Como consequência, criou-se uma fila dupla.

De acordo com o advogado, "os credores de pequenos valores, cujo objetivo final da lei é não permitir que vá para a infindável dos precatórios, restaram também prejudicados quanto àqueles que já estão na fila dos precatórios". Ele lembra também "houve uma limitação orçamentária de 1,5% da arrecadação para que se paguem as RPVs".

A novela continua
Schorr acredita que como há mais RPVs para serem pagas do que as previstas no orçamento, vai surgir "um novo calote aos credores da fazenda pública, além do calote perpetrado nos precatórios".

Ao contrário do que acontece com os precatórios, no caso das requisições de pequeno valor, quando há inadimplemento, o juiz está autorizado a sequestrar o valor do órgão público devedor na ação de execução. "Com a nova lei, fixando limite em 1,5%, o estado praticamente foge do bloqueio e do sequestro. Nas RPVs, nem idoso e nem doente se salva do pequeno grande calote."

O caso foi levado ao TJ gaúcho pelo estado do Rio Grande do Sul contra um servidor que pedia o pagamento de seu crédito. Em primeiro grau, ficou determinado o pagamento em cinco dias. O estado argumentou, em Agravo de Instrumento, que a decisão não observou a lei estadual que prevê o prazo de 180 dias. A 3ª Câmara Cível atribuiu efeito suspensivo ao recurso até o julgamento desta quinta.

Segundo o estado, "as RPVs expedidas após a vigência da Lei Estadual 13.756 devem observar o prazo de pagamento de 30 dias para créditos cujo valor principal seja igual ou inferior a sete salários mínimos e 180 dias para os demais créditos, contados da data em que a requisição expedida pelo juízo da execução for protocolada perante o órgão competente".

"Todo juiz pode"
No dia 3 de fevereiro, ao analisar a Reclamação 13.145, o ministro Carlos Ayres Britto, vice-presidente do Supremo Tribunal Federal, entendeu que não só os desembargadores podem exercer o controle de constitucionalidade, mas todo juiz. "Todos os juízes e órgãos especiais ou plenários dos tribunais estão aptos a exercer o controle de constitucionalidade de emenda constitucional em face da Constituição Federal", anotou, em um pedido de reclamação do município de Carapicuíba (SP) contra ato do TJ paulista.

No caso, o Órgão Especial TJ-SP decidiu pela inconstitucionalidade da Emenda Constitucional 62, de 2009, incidentalmente, em pedido de intervenção estadual.

ADI 4.668
RCL 13.145

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