Judiciário de luto

Autoridades homenageiam a memória de Maurício Corrêa

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18 de fevereiro de 2012, 13h37

Ministros do Supremo Tribunal Federal, dos tribunais superiores, políticos, juízes, advogados e membros do Ministério Público estiveram na manhã deste sábado (18/2), no Salão Branco do Supremo Tribunal Federal, para homenagear o ex-presidente do STF, Maurício Corrêa, que morreu nesta sexta, vítima de um ataque cardíaco.

O corpo do ex-ministro é velado no Salão Branco do Supremo e será sepultado às 17h, no cemitério Campo da Esperança, em Brasília. Seu corpo deixará o STF por volta das 16h. Os familiares de Maurício Corrêa, que deixa a mulher, Alda, três filhas e duas netas e cinco netos, receberam os cumprimentos de diversas autoridades que lembraram alguns dos momentos marcantes da República que tiveram a participação do ex-ministro. A presidente Dilma Roussef enviou condolências à família.

Maurício Corrêa presidiu o STF por quase um ano, de junho de 2003 a maio de 2004, quando se aposentou compulsoriamente ao completar 70 anos. Foi nomeado para o Supremo em outubro de 1994, pelo presidente Itamar Franco, depois de servir ao seu governo como ministro da Justiça, na vaga decorrente da aposentadoria de Paulo Brossard. Também foi ministro do Tribunal Superior Eleitoral, órgão que presidiu entre 2001 e 2003.

A história política de Corrêa se confunde com a criação da Lei 8.906/1994, o Estatuto da Advocacia. O texto foi gestado na época em que ele era senador e sancionado em julho de 1994 pelo presidente Itamar Franco, quando Corrêa era ministro da Justiça.

O texto foi aprovado num momento de transição política. Era o fim do mandato de Itamar, que assumira a presidência com o impeachment de Fernando Collor, anos antes. Fernando Henrique Cardoso foi ministro da Fazenda de Itamar até março de 94, quando deixou o cargo para concorrer à presidência. Ele implantara o Plano Real e buscava mais aliados para as eleições. O Estatuto foi sancionado como parte dessa jogada, em busca do apoio dos advogados, que então militavam, inclusive no Congresso, pela aprovação da lei.

Mineiro de São João do Manhuaçu, formou-se em Direito em Minas Gerais em 1960 e passou a advogar em Brasília no ano seguinte. Em 1986, foi eleito senador. Participou ativamente da Assembleia Nacional Constituinte com a apresentação de 459 emendas ao texto do projeto que se transformou na Constituição Federal de 1988. Do total, 144 foram aprovadas.

Estiveram no velório na manhã deste sábado, além do presidente e do vice-presidente do Supremo, ministro Cezar Peluso e Ayres Britto, o ministro Alberto Bresciani (TST), e os ministros aposentados Moreira Alves, Nelson Jobim e Sepúlveda Pertence, que dividiram a bancada do STF com Corrêa. O advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, e o Procurador-geral da República, Roberto Gurgel, também foram prestar homenagens.

Ex-ministros do Tribunal Superior Eleitoral, como Fernando Neves e Gerardo Grossi, e do Superior Tribunal de Justiça, como Pádua Ribeiro, também foram se despedir de Corrêa. Compareceram, ainda, os senadores Valdir Raupp (PMDB-RO) e Rodrigo Rollemberg (PSB-DF). Os advogados Evandro Pertence, Carlos Fernando Mathias, Carlos Mário Velloso Filho e o ex-procurador-geral da República Aristides Junqueira também se despediram do ex-ministro.

O presidente da seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Francisco Caputo, foi cumprimentar a família e anunciou que irá submeter ao conselho da seccional a proposta para que o prédio da sede da entidade seja batizado com o nome de Maurício Corrêa. Caputo lembrou a resistência de Corrêa como presidente da OAB-DF à invasão da sede da entidade por forças do regime militar.

Em 1983, a OAB-DF foi cercada por agentes da polícia por ordem do executor das medidas de emergência decretadas pela ditadura militar, general Newton Cruz. A justificativa apresentada para o cerco foi que a entidade teria desrespeitado portaria do Ministério do Exército que proibia temporariamente reuniões políticas. No caso, o I Encontro dos Advogados de Brasília.

Dirigentes, associados e empregados da OAB-DF ficaram retidos no prédio por quase uma hora, por determinação da Polícia. Maurício Corrêa se recusou a assinar o documento de interdição da sede. Ao lado de Sepúlveda Pertence e Sigmaringa Seixas, entre outros, desceu os quatro andares de escada em direção ao térreo, de onde, diante da bandeira brasileira, cantaram o hino nacional. O general Newton Cruz, depois, chegou a pedir desculpas pelo episódio, afirmando que houve “excesso de zelo” por parte das autoridades.

O que as autoridades disseram sobre o ex-ministro Maurício Corrêa

Cezar Peluso
A morte de qualquer pessoa é uma coisa inevitável e dolorosa. No caso do ministro Maurício Corrêa, é mais doloroso ainda para o Supremo Tribunal Federal. Em particular no meu caso, porque tomei posse quando ele era presidente. Ele me recebeu e mantivemos durante o tempo em que ele permaneceu aqui um relacionamento muito próximo, agradável. Nos tornamos muito amigos. Ele foi um ministro importante, teve uma atuação expressiva no Supremo, e foi um constituinte de atuação marcante. Deixa saudades. Se de alguma forma o Supremo pode homenageá-lo, é permitindo que o velório seja realizado aqui na Casa. Uma última homenagem a um de seus ilustres ministros.

Ayres Britto
O ministro Maurício Corrêa me deu posse e sempre foi solícito, afável, educadíssimo. Era um homem afetivo. Muito carinhoso, mas firme nas posições. Um homem desassombrado no plano das ideias e no plano pessoal. Deixa muitas saudades. Um exemplo de sua gestão é o compartilhamento. Ele dialogava. Não deliberava solitariamente. Ele ouvia os colegas. E eu acho que isso é uma diretriz gerencial de primeira qualidade, indispensável, dirigir com os pares, com os companheiros. Tomar a decisão depois de buscar um consenso. Convencer é vencer com o outro. E ele exercitava bem esse gerenciamento compartilhado.

Luís Inácio Adams
Advogado, jurista e magistrado brilhante, que cumpriu um papel importante no Brasil. Como parlamentar e ministro da Justiça, teve uma trajetória significativa do nosso país. Viveu e participou ativamente da vida política em momentos difíceis do nosso país. E contribuiu para esses momentos. É uma figura que certamente fará falta para o Brasil e que deixou um legado importante para essa democracia que vivemos hoje.

Roberto Gurgel
Nós, que vivemos em Brasília há muito tempo, ficamos com uma lembrança muito forte do ministro Maurício Corrêa, não apenas como ministro e presidente da Suprema Corte, mas como o combativo presidente da OAB nos momentos finais da ditadura, em que ele atuou sempre com muita firmeza. Fica a imagem de um democrata extremamente obstinado e firme nas suas convicções.

Sepúlveda Pertence
Não consigo falar primeiro do homem público. Tenho que começar falando de uma amizade que faz quase 60 anos. Fomos colegas de turma em Belo Horizonte, do final dos anos 1950 até 1960. Desde então, vindo para Brasília, eu primeiro em 1961, ele meses depois, continuamos os nossos contatos. Na política, alguns desencontros. Era um lutador, um homem às vezes rude, mas no fundo um homem bom, amoroso, caridoso. Nos reencontramos no dia a dia no Supremo Tribunal Federal, onde Maurício surpreendeu, sendo dedicado, estudioso. Deixa algumas páginas de importância nos anais da Corte. Tudo isso faz deste momento um momento doloroso. A recordação de quase 60 anos de vida se vai com Maurício.

Aristides Junqueira
Fui procurador-geral da República na época em que Maurício Corrêa foi ministro da Justiça e também, em seguida, ministro do Supremo Tribunal Federal. Convivi com ele bem de perto. Ele ia à PGR e me lembro muito bem uma frase: “Esse pessoal está pensando que eu vou ser um fiasco no Supremo, mas eu vou mostrar pra eles que serei um bom ministro”. Não dizia quem era esse pessoal, mas realmente foi um bom ministro. Tinha uma força de vontade muito grande em tudo que fazia e a lembrança que tenho do Maurício, e que vai ficar, de um homem alegre. Apesar de todos os percalços, era um homem alegre.

Nelson Jobim
Sempre fui um sujeito de muita sorte porque eu sempre estava sempre atrás do Maurício. Na Constituinte, ele era senador, eu era deputado e ajudava o Maurício, como ajudava o Bernardo Cabral na elaboração da Constituição. Depois, eu fui para o Ministério da Justiça. E quem era o ministro antes? Maurício Corrêa, que já tinha inclusive preparado o caminho para a criação da Comissão de Mortos e Desaparecidos. Ele não teve condições políticas de implantá-la, mas quando eu entrei, já no governo Fernando Henrique, o Maurício tinha preparado o caminho. Depois, eu vim para o Supremo Tribunal Federal e fui vice-presidente do Maurício aqui e no TSE. Tenho um débito imenso com ele. Um homem da melhor qualidade. Superava as controvérsias e sempre olhava pra frente. Ou seja, não retaliava com o passado.

Francisco Caputo
Podemos dividir a história da Ordem entre antes e depois do presidente Maurício Corrêa. Foi a maior liderança que tivemos na instituição. Um homem que construiu o que a Ordem é hoje e que defendeu, física e espiritualmente, o que a Ordem se tornou depois que daquele dia emblemático da resistência à invasão que a ditadura pretendia fazer no nosso prédio. Aquele foi o momento mais agudo da nossa história e apenas um homem destemido e independente como ele teria condições de enfrentar a ditadura militar e defender a honorabilidade da nossa instituição e da nossa classe. É uma perda imensa, irreparável.

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