Tribunal do Júri

Perguntas que induzem a respostas são eficazes

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25 de agosto de 2012, 7h47

Advogados são líderes naturais. Promotores, idem. Se deixar, eles tentam controlar o réu, as testemunhas, os jurados, os funcionários do tribunal e até o juiz, se ele se descuidar. Não acontece porque o juiz não deixa. Mas há situações em que o advogado e o promotor devem manter as testemunhas sob rédeas curtas. Isto é, devem fazer "perguntas indutoras" de respostas (leading questions), dizem os advogados e professores de Direito, Elliott Wilcox (Trial Theater) e Paul Sandler (The Art of Advocacy), em artigos separados. 

Há duas justificativas para isso, dizem. A primeira é economizar tempo de julgamento. Nisso, advogados e promotores devem trabalhar em conjunto. Todas as perguntas a testemunhas, cujas respostas não têm peso na produção de provas, devem ser formuladas para tentar induzi-las a responder "sim" ou "não". São perguntas, por exemplo, que visam a identificação da testemunha para os jurados ou que se referem a fatos que estão devidamente descritos nos autos, às vezes até repetidamente. Fatos que nenhuma das partes contesta. 

A função da pergunta indutora, no caso, é fazer com que a testemunha se limite ao que interessa no processo, apenas. Por exemplo: "O senhor estava do lado de fora do posto de gasolina tal, na esquina da rua tal com a rua tal, quando ocorreu o acidente, às 20h do dia 24 de agosto. Correto? Resposta: "Sim". Esse tipo de pergunta evita que a testemunha conte uma longa história. Se a pergunta for aberta, como: "O senhor presenciou o acidente, às 20h do dia 24 de agosto?", a resposta pode ser: "Olha, eu saí do trabalho um pouco mais tarde aquele dia… aconteceram uns probleminhas lá na firma…o que não é normal". O exemplo é simples, mas retrata uma situação corriqueira nos tribunais, dizem os professores. 

No caso em que as perguntas indutoras são usadas como técnica de inquirição de testemunhas, é preciso distinguir entre inquirição cruzada (cross-examination) e inquirição direta (direct examination). No Direito anglo-americano, a separação desses sistemas faz parte do cotidiano dos tribunais. A inquirição cruzada é a que um advogado (ou promotor) interroga a testemunha da outra parte. Nesse caso, as perguntas indutoras devem ser sistematicamente usadas, recomendam os professores. A inquirição direta, por sua vez, é aquela em que um advogado (ou promotor) interroga a testemunha que ele mesmo arrolou. Nesse caso, as perguntas indutoras não devem ser usadas. 

Na verdade, elas são proibidas no sistema americano. A outra parte pode protestar e terá a concordância do juiz. A não ser no caso das perguntas preliminares ou que tratem de fatos que não estão em disputa. De outra forma, o julgamento "pode durar uma eternidade", dizem. E a não ser, também, em casos de inquirição de crianças, de idosos e de testemunhas hostis. Elas também são aceitáveis, muitas vezes, quando o advogado quer introduzir um tópico novo na inquirição, que pode ficar mais claro — e mais específico — com uma sentença afirmativa que antecede a pergunta. 

A principal razão para coibir perguntas indutoras em inquirição direta é simples: a testemunha é aquela que está sentada no banco das testemunhas — não o advogado ou o promotor. É ela que está sob juramento — o advogado e o promotor não estão. A prova testemunhal deve vir dela e não do interrogador. É ela que os jurados querem ouvir e observar. O comportamento, a atitude, a forma de se expressar, a linguagem corporal e o caráter da testemunha podem conter informações preciosas para os jurados. "Se tudo que eles ouvirem for "sim" ou "não", como podem avaliar o testemunho?", pergunta Elliott Wilcox. 

Muitas vezes, o advogado (ou o promotor) arrisca uma ou duas perguntas indutoras, depois de resolvidas as questões preliminares, sem ouvir qualquer protesto da outra parte. Mas esse é um tiro que pode sair pela culatra, adverte Paul Sandler, que conta a história de uma "parte" que decidiu tirar vantagem da bondade alheia. Veja como foi: 

Pergunta: Então, Sr. Hill, quando o senhor se aproximou da interseção, estava olhando para o sinal luminoso, correto?"

Resposta: Sim 

Pergunta: Assim, o senhor observou que o sinal estava verde para quem trafegava na mesma rua que o senhor estava, certo?"

Resposta: Sim 

Pergunta: Obviamente, o sinal da rua que cruza estava vermelho. E o senhor viu quando o veículo Humvee, de cor amarela, avançou o sinal vermelho, correto?" 

Assim continuou o interrogatório, até que toda a história foi contada, sem que a outra parte protestasse uma única vez. O caso parecia ganho. Tudo indicava que a deliberação do júri sairia em menos de cinco minutos. Mas, a outra "parte" reverteu a situação, durante as alegações finais. 

"Senhores jurados, não sei se os senhores concordam, mas para mim ficou claro que a ‘outra parte’ não confia em sua testemunha. Notaram que ele não deixou sua testemunha nos contar o que aconteceu? Provavelmente, ele sabia que sua testemunha não sabe realmente o que aconteceu ou não tem certeza de nada, de forma que ele contou toda a história, como lhe convinha, e só atribuiu a sua testemunha a tarefa de dizer "sim". Aliás, se ele tivesse colocado um boneco no banco dos réus, com a capacidade de balançar a cabeça para baixo e para cima, afirmativamente, teríamos obtido exatamente o mesmo testemunho. Concordam?", perguntou com um sorriso. 

Arriscar perguntas indutoras fora de hora também pode ser desconcertante, se a outra parte protesta. Se isso acontecer, há conserto, diz Sandler. Uma forma é, depois de pedir desculpas, concordar prontamente em reformular a pergunta e, desta vez, usar o "se", de forma a guiar a testemunha para a resposta esperada, da mesma forma. Por exemplo, a pergunta direta seria: "Na noite do acidente estava chovendo e a pista estava escorregadia, correto?". A alternativa: "O senhor se recorda se na noite do acidente estava chovendo e a pista estava escorregadia?" pode levar à mesma resposta. A pergunta "O senhor foi a um bar depois da recepção, correto?" pode ser reformulada para: "O senhor pode nos dizer se foi a um bar depois da recepção?" — a resposta mais provável também será "sim" ou "não", conforme esperado.

Ambos concordam, no entanto, que perguntas indutoras podem ser muito eficazes. E não é de se admirar que advogados e promotores fiquem tentados a utilizá-las na inquirição direta de suas próprias testemunhas. É frustrante quando a testemunha troca alhos por bugalhos — algumas vezes porque o advogado (ou promotor) faz uma pergunta vaga. Perguntas vagas podem levar a respostas desastrosas

Wilcox recomenda aos alunos de Direito que pratiquem a elaboração de inquirição direta, repetindo uma história bem conhecida. A um aluno com dificuldades para elaborar perguntas indutoras, ele pediu para representar o advogado do Sr. Coiote, em um processo contra uma distribuidora de equipamentos, por danos. E a inquirição saiu assim (todas com respostas afirmativas): 

— O senhor é conhecido como "Coiote", correto?

— Seu trabalho é tentar capturar o Papa-Léguas, certo?

— Em 23 de março do ano passado, o senhor fez um pedido de um propulsor a jato, que pode ser atado em suas costas, à Empresa Ltda. Sim ou não?

— O senhor também encomendou patins de rodas. Sim ou não?

— A empresa entregou suas encomendas no dia 11 de maio do mesmo ano, correto?

— No dia seguinte, o senhor atou o propulsor a jato em suas costas, seguindo o manual de instruções da empresa, certo?

— O senhor também atou seus pés aos patins conforme orientado pelo manual da empresa, certo?

— Já equipado o senhor escutou o "bip-bip" do papa-léguas e acendeu o disparador do propulsor a jato. Sim ou não?

— Ao alcançar o papa-léguas o senhor acionou o sistema de frenagem, que falhou, e o senhor só parou quando bateu em uma pedra a várias milhas de distância, correto? (…)

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