AP 470

Provas testemunhais são frágeis, dizem criminalistas

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6 de agosto de 2012, 17h41

“O testemunho de quem está envolvido nos fatos não serve de comprovação de prova alguma.” A afirmação é do criminalista Paulo Sérgio Leite Fernandes. Segundo ele, para que uma prova testemunhal seja forte, é necessário que a testemunha seja desinteressada sobre os fatos. O advogado diz que isso não acontece no caso da Ação Penal 470, processo do mensalão.

Paulo Sérgio Fernandes afirma que as provas testemunhais do mensalão são muito frágeis, por virem sempre de pessoas que, minimamente, “fazem parte daquele círculo, tendo interesses diretos ou indiretos na acusação”.

A procuradora da República Janice Ascari disse ao jornal Folha de S.Paulo, que não há hierarquia entre prova testemunhal, pericial e documental. Tal hierarquia não existe no Código de Processo Penal, concorda o criminalista Fábio Tofic. Porém, todas as provas estão sempre sujeitas a contraprovas, diz ele, e testemunhos são mais fáceis de contra-argumentar do que documentos.

O criminalista e colunista da revista Consultor Jurídico, Luiz Flávio Gomes, concorda que a prova testemunhal é a mais frágil das provas. Isso porque ela pode facilmente se mostrar desconexa, não apresentar números ou pontos específicos. É por isso, segundo o professor, que “só com prova testemunhal, dificilmente alguém é condenado por corrupção”.

Provas documentais, como as obtidas pelas quebras de sigilos bancário e telefônico de acusados, seriam mais fortes para este tipo de condenação, explica ele.

Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, o ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio, questionou: "O que vão querer em termos de provas (de corrupção)? Uma carta? Uma confissão espontânea?”

Para o criminalista Andrei Zenkner Schmidt, o que se exige é que haja comprovação da conduta descrita no verbo nuclear do tipo penal e dos demais elementos do tipo. “No caso do artigo 317 (corrupção), exige-se prova da solicitação ou do recebimento do valor de origem ilícita, pelo menos. Em caso de concurso de pessoas, exige-se a prova de cada tarefa desempenhada por cada um dos concorrentes”, explica.

“Em tese, a prova de um crime de corrupção não exige uma carta ou uma confissão, até mesmo porque esses elementos sequer seriam suficientes, por si só, para uma sentença condenatória”, diz ele, em resposta à provocação do ministro Marco Aurélio. O que é necessário, afirma, é que as diversas provas apontem a uma verdade por associação.

Tal convergência, continua Zenkner, não pode ser substituída por uma suposição, uma alegação de que "tudo leva a crer". “Ou existem provas em conjunto (da qual até podem fazer parte os depoimentos), ou teremos uma associação probatória apenas indiciária”.

Domínio do Fato
A existência de provas unicamente testemunhais contra José Dirceu, fez com que o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, desse a entender que usaria a Teoria do Domínio do Fato, contra o réu, na qual se responsabiliza aquele que tem poder sobre os demais autores do crime por comandar a ação de seus subordinados ou saber dos crimes e se omitir.

Para Paulo Sérgio Leite Fernandes, o que o procurador está fazendo “é chamar caxumba de parotidite” , ou seja, usar um nome rebuscado para dizer que José Dirceu estava participando de um esquema criminoso. Isso porque, segundo a teoria da acusação, o político, como autoridade, deveria ter domínio do que acontecia entre seus subordinados. Ainda assim, afirma Fernandes, será necessário provar que ele estaria ciente do problema.

Para Luiz Flávio Gomes, a teoria do Domínio do Fato pode ser usada em qualquer crime onde tenha várias pessoas. Se uma pessoa comanda outras em um esquema criminoso, ela tem domínio do fato. Teoricamente, diz, pode-se usar isso como acusação contra José Dirceu, desde que se prove sua participação.

“O diretor-presidente de uma empresa não responde, tout court, por atos criminosos praticados por um de seus funcionários só porque desempenha hierarquia sobre ele”, exemplifica Andrei Zenkner.

O chefe da quadrilha nunca vai aparecer na execução, explica Fábio Tofic, mas, para imputar omissão, ela tem que ser dolosa. “Não basta dizer que o líder foi descuidado com seus subordinados. Precisa mostrar que ele sabia do ocorrido e mandou seguirem em frente, sem nada fazer”.

Clique aqui para assistir os vídeos do julgamento do mensalão.

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