AP 470

Leia o voto de Marco Aurélio para desmembrar a AP 470

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6 de agosto de 2012, 11h19

“O Supremo, hoje, encontra-se inviabilizado ante sobrecarga invencível de processos. Então, os plúrimos, a revelarem ações penais ajuizadas contra diversos cidadãos, acabam por emperrar, ainda mais, a máquina existente, projetando no tempo o desfecho almejado. A problemática do tratamento igualitário — e cada processo possui peculiaridades próprias, elementos probatórios individualizados — não é definitiva, ante a recorribilidade prevista pela ordem jurídica e, até mesmo, a existência da ação constitucional do habeas corpus. Em síntese, somente devem tramitar sob a direção do Supremo os inquéritos que envolvam detentores de prerrogativa de foro, detentores do direito de, ajuizada ação penal, virem a ser julgados por ele, procedendo-se ao desdobramento. Não é, contudo, o que se tem no caso.” A afirmação foi feita pelo ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio, durante o primeiro dia de julgamento da Ação Penal 470, o chamado processo do mensalão.  

Por nove votos a dois, os ministros do STF decidiram rejeitar a preliminar levantada pelo advogado Márcio Thomaz Bastos e manter no tribunal o julgamento integral da Ação Penal 470, o chamado processo do mensalão. Os ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski, que votaram pelo desmembramento, ficaram vencidos na sessão.

Márcio Thomaz Bastos, que representa o ex-executivo do Banco Rural José Roberto Salgado, defendeu o processo deveria ser desmembrado em relação aos 35 réus que não têm foro por prerrogativa de função. Ou seja, não têm a prerrogativa de ser julgados pelo Supremo. Hoje, apenas os deputados federais João Paulo Cunha (PT-SP), Pedro Henry (PP-MT) e Valdemar Costa Neto (PR-SP) têm prerrogativa de foro. O advogado sustentou que o fato de réus sem prerrogativa serem julgados pelo Supremo fere ao menos dois princípios fundamentais: o do juiz natural e o direito ao duplo grau de jurisdição — ou seja, de recorrer de uma possível decisão condenatória. Contra as decisões do STF, como se sabe, não há recurso senão ao próprio tribunal.

Ele encontrou ressonância para o seu pleito apenas nos votos dos ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio. Lewandowski citou decisão do dia anterior em que determinou a remessa do inquérito contra o ex-senador Demóstenes Torres ao Tribunal da 1ª Região, em razão justamente da cassação do mandato do político goiano. Citando juristas como Carlos Maximiliano e Eugênio Pacelli, Lewandowski começou se referindo à jurisprudência que assentaria a incompetência da corte para julgar réus sem prerrogativa de foro. Foi acompanhado pelo ministro Marco Aurélio, para quem a incompetência do Supremo para julgar os demais réus é absoluta. 

Marco Aurélio, assim como Ricardo Lewandowski, fez referências ao chamado mensalão mineiro, que se originou das mesmas investigações, mas foi desmembrado. “Não cabe variar adotando o dito popular de dar uma no cravo e outra na ferradura”, afirmou Marco. O ministro lembrou, ainda, a insegurança jurídica com decisões diferentes da corte sobre o tema. “As decisões do Colegiado vêm variando e isso tem provocado insegurança jurídica. Em alguns casos, implementa o desmembramento e, em outros, procede de forma diametralmente oposta. Sendo a matéria processual-constitucional, tudo recomenda a estabilidade dos pronunciamentos. Sobrepõe-se não só a definição da competência do Supremo, em face da prerrogativa de foro, como também o que articulado quanto ao princípio do juiz natural. O cidadão comum não pode ter alcançado, automaticamente, o direito de ver-se julgado pelo órgão competente – mais uma garantia constitucional, direito fundamental por excelência — ante o simples fato de ser coautor de certo crime, considerado aquele que detém a prerrogativa de foro. Ultimamente, o Colegiado tem-se inclinado mais a reconhecer o direito ao desmembramento.”

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