AP 470

"Nervos à flor da pele marcaram início do julgamento"

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6 de agosto de 2012, 9h15

Para o advogado Marcelo Leonardo, que defende o publicitário Marcos Valério na Ação Penal 470, o clima de exaltação e beligerância que marcou os dois primeiros dias do chamado processo do mensalão no Supremo Tribunal Federal não são condizentes com o atmosfera de tranquilidade que se espera da mais alta instância de Justiça do país. Para o criminalista, o voto do ministro Ricardo Lewandowski relativo à Questão de Ordem pelo desmembramento da ação foi “primorosamente elaborado e fundamentado”. Segundo ele, não cabe a uma corte constitucional julgar uma ação penal comum onde 35 réus não dispõem de prerrogativa de foro de função. Para Marcelo Leonardo, foram feridas as garantias constitucionais do juiz natural e do direito a recorrer de uma sentença.

“Muito provavelmente, nunca mais na história deste país, o Supremo julgará ação penal com a participação de réus sem aquela prerrogativa pelo cargo que ocupam. A experiência da AP 470 vem se revelando totalmente inadequada”, afirma Marcelo Leonardo ao avaliar os dois primeiros dias de julgamento. O advogado argumenta, ainda, que o procurador-geral da República, durante a sustentação oral de sexta-feira (3/8), apenas se limitou às provas colhidas durante a fase de inquérito policial e da Comissão Parlamentar de Inquérito, o que viola norma do artigo 155 do Código do Processo Penal, “que vincula o juiz à prova colhida em contraditório judicial”.

Confira a avaliação do advogado sobre os primeiros dias de julgamento:

"Os dois primeiros dias de julgamento da Ação Penal 470 revelaram que o clima interno no Supremo Tribunal não anda bom. A discussão acirrada entre os ministros mostrou exaltação e nervos à flor da pele, o que não é compatível com o ambiente de serenidade que se espera da mais Alta Corte de Justiça do país, mormente quando tem diante de si um julgamento de natureza penal, que trata da liberdade da pessoa humana.

O voto do ministro Ricardo Lewandowski, primorosamente elaborado e fundamentado, favorável ao reconhecimento da incompetência do STF para julgar cidadãos comuns, que não têm foro por prerrogativa de função, embora não acompanhado pela maioria, com certeza, sinaliza a orientação futura do tribunal. Muito provavelmente, nunca mais na história deste país, o Supremo julgará ação penal com a participação de réus sem aquela prerrogativa pelo cargo que ocupam. A experiência da AP 470 vem se revelando totalmente inadequada. A meu ver, a decisão da maioria, importou sim em violação às garantias constitucionais do juiz natural e do direito de recorrer da sentença (duplo grau de jurisdição). Aliás, como defensor no feito, vinha pleiteando o seu desmembramento desde a fase do inquérito em 2006.

O procurador-geral da República fez uma sustentação oral bem estruturada, porque lhe foi assegurado tempo de sobra. Entretanto, basicamente, invocou as provas colhidas na fase do inquérito policial e da Comissão Parlamentar de Inquérito, o que viola a regra do artigo 155 do CPP, a qual vincula o juiz a prova colhida em contraditório judicial. Embora a lei estabeleça prazo igual de uma hora para da acusação e da defesa, o Supremo Tribunal lhe concedeu, em sessão administrativa prévia, prazo de cinco horas. A decisão foi correta, em homenagem aos princípios constitucionais da igualdade das partes, da paridade de armas e do devido processo legal, uma vez que a acusação oral seria dirigida contra trinta e seis acusados por múltiplos fatos imputados.

Entendi, no entanto, que exercitada a faculdade do prazo ampliado pela acusação, considerando as peculiaridades da magnitude da acusação sustentada contra o empresário Marcos Valério, aliada à circunstância do procurador-geral da República ter mencionado seu nome na sustentação oral por 197, que deveria ser assegurado ao referido acusado, em homenagem aos mesmos princípios constitucionais e mais o da ampla defesa,  prazo duplicado para a respectiva sustentação oral. O mais importante não é cumprir um cronograma administrativo de julgamento, mas respeitar as garantias constitucionais do acusado.

É lamentável que no tribunal, guardião da Constituição, as garantias fundamentais do direito de defesa não sejam preservadas. Registrei o fato para a História." Marcelo Leonardo

Clique aqui para assistir os vídeos do julgamento do mensalão.

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