AP 470

Leia voto de Lewandowski pelo desmembramento

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2 de agosto de 2012, 22h44

Somente os ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio votaram pelo desmembramento, da Ação Penal 470, das acusações contra réus sem mandato. Para ambos, apenas os três réus que têm foro especial — os deputados federais João Paulo Cunha (PT-SP), Pedro Henry (PP-MT) e Valdemar Costa Neto (PR-SP) — deveriam ser julgados pelo Supremo Tribunal Federal, enquanto os outros 35 réus deveriam ser pelas instâncias inferiores, com processos comuns.

No início do julgamento do chamado processo do mensalão, o advogado e ex-ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos pediu o desmembramento, alegando que, ao julgar réus sem prerrogativa, o Supremo fere dois princípios fundamentais: o do juiz natural e o direito ao duplo grau de jurisdição — ou seja, de ser julgado pelo juiz da “sua comarca” e de recorrer de uma possível decisão condenatória. Contra as decisões do STF não há recurso senão ao próprio tribunal. Bastos defende o ex-executivo do Banco Rural José Roberto Salgado, que não tem prerrogativa de foro.

Nove dos 11 ministros votaram contra o desmembramento. Lewandowski abriu a divergência — e foi acompanhado por Marco Aurélio —, afirmando que, à luz da Constituição, o desmembramento deveria ser feito.

Em seu extenso voto — de 53 páginas —, Lewandowski explicita que a competência do STF para processar e julgar originariamente outras pessoas que não aquelas expressamente enumeradas na Constituição precisa ser reavaliada, e afirma que a jurisprudência da corte tem mudado em relação a isso, “por meio de inúmeras decisões monocráticas e colegiadas”.

O ministro cita o artigo 80 do Código de Processo Penal para explicar que o “julgamento conjunto de agentes acusados da prática de ilícitos penais que tenham status processual distinto não é obrigatório, porém facultativo”. Lewandowski diz ainda que a corte tem, “de uns tempos para cá”, sistematicamente determinado o desmembramento em inquéritos e ações penais. Ele cita diversos julgamentos.

Para o ministro, não desmembrar o processo significa ir contra o princípio do juiz natural, na medida em que impede que o magistrado constitucionalmente escolhido aprecie a causa. Segundo seu voto, o juiz de primeira instância não conhece diretamente o acusado, mas vive em sua comunidade, está mais próximo dele e, ao interrogá-lo, olha-o nos olhos e procura extrair dele a verdade. O que não acontece quando o julgamento é feito no STF.

O julgamento de pessoas sem prerrogativa de foro no STF, acrescenta, viola também o princípio do duplo grau de jurisdição. Quando esse princípio é respeitado, um eventual erro de avaliação “poderá ser sempre corrigido por uma segunda instância, que reverá todos os aspectos formais e substantivos do processo”, argumenta.

Lewandowski aproveitou o voto para alfinetar aqueles que não concordassem com o desmembramento, que, segundo ele, é ditado pela Constituição e pelo Código de Processo Penal. “Recordo, a propósito, que é regra comezinha de hermenêutica constitucional que a interpretação das leis deve ser feita em conformidade com a Constituição, e não o contrário”, afirma.

Lewandowski termina seu voto afirmando que, ao não desmembrar o processo, o Supremo viola o Pacto de São José da Costa Rica, que garante, sem qualquer restrição, o direito de recorrer no caso de eventual condenação.

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