Desconhecimento dos fatos

OAB rebate declarações de procurador à ConJur

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25 de abril de 2012, 6h46

Em nota divulgada nesta terça-feira (24/4), o presidente da Comissão da Dívida Pública da seccional paulista da OAB, Flávio José de Souza Brando, lamentou a entrevista concedida pelo procurador-geral do estado, Elival da Silva Ramos, à Consultor Juridico, no dia 22 de abril.

Na entrevista, o procurador reclama do fato de o Tribunal de Justiça refazer os cálculos da Procuradoria-Geral do Estado para pagamento de juros de precatórios e diz que o Judiciário superprotege os credores. “O TJ precisa parar de tutelar o interesse do credor. A PGE sempre sustentou que no período de um ano e meio em que o precatório pode ser pago, que é o prazo constitucional, não correm juros moratórios”, disse.

Flávio Brando declarou que os argumentos usados pelo chefe da advocacia pública paulista “se baseiam no desconhecimento dos fatos e também de direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição Federal”. Segundo ele, “ao jogar a culpa no TJ-SP pelos atrasos no pagamento de precatórios, o procurador do estado esquece que a PGE impugna a totalidade dos levantamentos e não concorda sequer com a liberação de quantias incontroversas”.

Leia a nota:

Nota Pública

O ilustre procurador geral de São Paulo ataca a OAB num momento político notório em que é minoritário e está desautorizado por sua própria categoria, em seu Conselho. Os fatos objetivos demonstram a fragilidade dos argumentos expostos.

O Estado de São Paulo é o maior devedor de precatórios do Brasil, inadimplente em mais de R$ 2920 bilhões a centenas de milhares de credores, especialmente alimentares, dos quais além de 80 mil já morreram sem receber seus créditos. São Paulo liderou três calotes aos credores públicos no Brasil, em 1988- 8 anos, 2000 – 10 anos e 2009 – 15 anos. Total: 33 anos de inadimplência.

São Paulo tem violado, assim, historicamente, direitos e garantias fundamentais como a dignidade da pessoa humana, a justiça célere, direito a propriedade, isonomia (juros e correção idênticos para créditos e débitos recíprocos), harmonia entre os Poderes. Calote e confisco nunca foram autorizados pela Constituição.

O procurador geral do Estado falta com a verdade quando diz que a OAB não lutou no Congresso Nacional para que alíquotas mais altas sobre as receitas líquidas fossem estabelecidas para pagamentos sob a mais recente moratória. O que aconteceu foi exatamente o contrário, a OAB continua lutando no TJ-SP e CNJ para que tais alíquotas sejam monitoradas e aumentadas permanentemente.

Falta, igualmente com a verdade dos fatos ao declarar que a OAB perdeu a aposta da inconstitucionalidade da EC/62 no STJ. A ADI proposta pela OAB tem relatório e voto históricos do relator, ministro Aires Britto, pela inconstitucionalidade. E consenso majoritário na comunidade jurídica que teremos em breve o definitivo julgamento nesta direção pelo plenário do STF.

Reclama o procurador geral do TJ-SP quanto a cálculos, sempre que desfavoráveis a PGE, pois deseja retroagir e recalcular critérios de sentenças transitadas em julgado. Ao jogar a culpa no TJ-SP pelos atrasos no pagamento de precatórios, o procurador do Estado esquece que a PGE impugna a totalidade dos levantamentos e não concorda sequer com a liberação de quantias incontroversas.

Os credores do Estado de São Paulo não têm responsabilidade e sofrem pela falta de cooperação e questiúnculas entre os Poderes do Executivo e do Judiciário. Danos morais deverão onerar ainda mais o erário público no futuro.

Na realidade Elival Ramos tem saudades e quer restabelecer um período de ditadura estatal, onde os cidadãos pessoas físicas e jurídicas devem pagar impostos elevados (sem atraso de um dia, sob pena de penhora on-line, protesto, juros e multas extorsivos, impossibilidade de emissão de notas fiscais para empresas, etc.), sem serviços públicos a altura, com um Poder Judiciário carente de orçamento digno (por obra do Poder Executivo), atulhado de processos de dívida ativa e agindo como departamento de cobrança do governo. Juros e correção altíssimos para impostos e os menores possíveis para o credor.

O procurador geral afirma não pode aceitar a compensação de dívida ativa com precatórios, mais uma vez olvidando que tais dívidas judiciais foram reconhecidas há décadas, enquanto os créditos seriam “correntes" ou de exercícios recentes.

O TJ-SP não tem orçamento, pessoal e meios materiais para cumprir suas obrigações ditadas pela última moratória. Chega a enfatizar que isto não e problema dele.

Quanto às dívidas estatais, sempre que estiverem incomodando os tecnocratas, o procurador geral do Estado defende que haja um limite permanente percentual sobre o orçamento para cumprimento de leis e contratos, ou seja, o Estado de São Paulo somente oferecera segurança jurídica e honestidade de propósitos até certo ponto! A partir daí, mais moratória!

O contribuinte comum certamente não tem e nunca terá a faculdade de atrasar permanentemente seus impostos, contas de energia, comunicação, educação, saúde, transporte, segurança, Justiça, cobrados compulsoriamente e não entregues pelo Estado. Para o procurador, este desequilíbrio entre Estado e cidadão parece ser normal e desejável.

O Brasil vive um momento extravagante de declarações inadequadas e distantes dos fatos por operadores relevantes do Direito. Elival Ramos se incorpora a este movimento menor, quando existem soluções praticas legais e razoáveis para o problema dos precatórios (nunca os 33 anos de moratória defendidos pelo procurador geral), direitos humanos correlatos e outros tantos.

As comunidades nacional e internacional estão atentas e sensíveis aos direitos humanos (vide Líbia, Síria, Iran) e segurança jurídica ( Venezuela, Argentina, Bolívia, Equador) , modelos patológicos que o Governador Alckmin repudia, apesar dos esforços em contrario de alguns núcleos pontuais de resistência autoritária.

A Comissão de Direitos Humanos da OEA acolheu denúncia contra o Brasil, pela inexistência de prestação de Justiça em caso emblemático de precatórios (Santo André). Isto terá reflexos no comercio internacional, aumento de juros e outras sanções ao Brasil e ao Estado de São Paulo.

A OAB luta pelo respeito à Constituição Federal e aos direitos e garantias fundamentais ali previstos para nossos cidadãos, em caráter estável e permanente. Chega de calote, violação de direitos humanos e autoritarismo (campo fértil para a corrupção e sonegação de impostos).

São Paulo 23 de abril de 2012.

Flávio Jose de Souza Brando
Presidente da Comissão de Defesa dos Credores Públicos do Conselho Federal da OAB e Presidente da Comissão de Divida Pública da OAB-SP

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