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Cadeia de ações que levaram a crime tem limite

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20 de abril de 2012, 22h03

A Justiça de Bertioga rejeitou denúncia contra Erivaldo Francisco de Moura, um dos acusados pela morte de uma menina, atropelada por um jet ski, na praia de Guaratuba. Moura era o caseiro de outro dos denunciados e foi arrolado entre os acusados pela morte de Grazielly, de 3 anos, em fevereiro. O juiz Rodrigo de Moura Jacob, da 1ª Vara do Fórum de Bertioga, levou em conta a relação hierárquica entre patrão e empregado e a falta de previsibilidade do caseiro quanto às consequências do cumprimento de ordem do dono da casa.

De acordo com o Ministério Público, além de Moura, o empresário José Augusto Cardoso Filho, Thiago Veloso Lins e Aílton Bispo de Oliveira são culpados pela morte da menina. Os demais acusados tiveram a denúncia aceita, e terão dez dias para apresentar suas petições de defesa.

O caseiro havia sido arrolado como responsável pelo acidente por ter cumprido a ordem de levar o jet ski ao mar. Para a promotoria, o caseiro foi “imprudente”. Mas o juiz negou a denúncia, e questionou a atitude do MP: “É razoável pensar que um simples caseiro, sem a mesma instrução de seu patrão e das demais pessoas presentes na casa, deixasse de cumprir a ordem de seu patrão, negando-se levar o jet ski até a praia?”

Segundo Jacob, em casos penais, a cadeia de ações que relacionam causa e efeito de um crime de homicídio deve ser interrompida eventulamente. Citou que, em um homicídio cometido com arma de fogo, por exemplo, essa cadeia de eventos pode remontada até criminalizar o vendedor, e até o fabricante, da arma.

“Inviável responsabilizar a conduta do caseiro que simplesmente cumpriu uma ordem de levar o veículo até a praia”, disse Jacob. Continuou: “Foge do razoável imaginar que um simples caseiro pode ser responsabilizado criminalmente pelo fato de levar o aparelho até o mar, não havendo qualquer indício de que Erivaldo tinha conhecimento ou até mesmo poderia prever que o menor fosse dirigir o veículo”.

O MP denunciou os acusados por homicídio culposo e lesão corporal culposa, cujas penas são, respectivamente, de 1 a 3 anos e de 3 meses a 1 ano de detenção. Além de Grazielly, uma banhista adulta também foi atingida pelo jet ski, sofrendo ferimentos leves. A moto aquática partiu desgovernada pelo mar depois de ter a ignição acionada por um adolescente de 13 anos. A Vara da Infância e da Juventude apura o ato do garoto.

Condutas individualizadas
Padrinho do menor, o empresário José Augusto Cardoso Filho é o dono do jet ski e da mansão na Praia de Guaratuba onde estava o aparelho. Com base no inquérito policial, o MP denunciou esse homem acusando-o de ter agido com imprudência ao autorizar o afilhado a pilotar a moto aquática.

Thiago Veloso Lins e Aílton Bispo de Oliveira foram denunciados porque teriam agido com imperícia. Eles são, respectivamente, dono e mecânico de uma marina na qual o jet ski passou por revisão três dias antes do acidente. Segundo laudo do Núcleo de Perícias Criminalísticas de Santos, problemas técnicos no jet ski que contribuíram para o fatídico episódio não foram detectados durante a inspeção.

Ao analisar as condutas de cada acusado descritas na denúncia, o juiz considerou as questões referentes às relações de causa e efeito – ou nexo causa, principalmente nos crimes culposos, como “das mais intrigantes do Direito Penal”. Referindo-se ao caseiro, ele observou que há situações em que o ato anterior tem relação direta com o crime, mas, mesmo assim, quem o pratica não pode ser responsabilizado.

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