Cezar Peluso, o juiz

Foi meu pai quem me ensinou, e ensina, a ser juiz

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19 de abril de 2012, 13h46

Spacca
“Que incalculável riqueza é, mesmo entre os pobres, ser filho de um bom pai!” (Aleman)

Difícil se me mostra dar depoimento sobre meu pai, pois, de certa maneira, é também dar depoimento de minha própria vida e, como quem sai aos seus não degenera, também sou avesso à exposição pública da vida privada; entretanto, a especial ocasião merece exceção.

Falar do homem, pai, professor e magistrado Antonio Cezar Peluso é, paradoxalmente, tarefa fácil, pois estamos a falar de pessoa única, que incorpora e vive, como ninguém, todas estas dimensões, da maneira o mais exemplar e completa possível.

Ao remexer a gaveta de minhas lembranças, dentre tantas passagens, lembro-me de duas que especialmente me marcaram e que traduzem a pessoa de meu pai.

Lembro-me de que todas as vezes em que o procurava para esclarecer dúvidas universitárias ou profissionais, a resposta era sempre a mesma: “O que você estudou sobre o assunto ? O que você entendeu dele ? Qual a resposta que você acha mais correta?”. Diante da resposta – geralmente errada –, indicava-me livros e dizia: “Leia e estude. Depois, me diga o você acha e, se a dúvida continuar, voltamos a conversar…”. E o processo assim continuava até a certeza do bom e correto entendimento. Aliás, ainda continua.

Também me lembro, no início do 4o ano da faculdade de direito, quando de minha decisão em iniciar seriamente os estudos para prestar concurso de ingresso na carreira da magistratura, de invadir furtivamente seu sagrado espaço – o escritório em nossa casa – e lhe confidenciar minha decisão, pedindo sua ajuda e orientação. De maneira calma – digna de alguém que não se surpreendeu minimamente com a notícia –, olhou-me e placidamente sugeriu: “Pra começar, pegue o primeiro volume daquela obra – apontando-a na estante e, antes de dormir, vá lendo como se fosse livro de literatura, sem compromissos e preocupações…”. Todo empolgado, fui até a estante e apanhei o volume. Era o 1o volume do Tratado de Direito Privado, de Pontes de Miranda. O primeiro de série de 60 (sessenta) portentosos volumes! Sem comentários.

Tais passagens traduzem ínfima parte dos ensinamentos e do legado a serem deixados por meu pai; o homem, o pai, o professor e o magistrado Antonio Cezar Peluso.

Ensinou-me, com seu vivificador exemplo prático, que, em qualquer situação – pessoal ou profissional –, jamais se deve analisar os fatos e as questões da vida apenas pela superfície; tudo deve ser meticulosamente esquadrinhado; deve ser buscada apaixonadamente a raiz, as causas e as razões mais profundas e nunca aceitar passivamente a solução mais fácil, menos trabalhosa ou mais popular; não abandonar o correto trajeto por se mostrar o mais acidentado e difícil; ouvir e aprender com os mais sábios; ser intelectualmente independente e responsável pelas decisões a serem tomadas, após cuidadoso estudo e análise; não se deixar influenciar por fáceis – e geralmente falsos – elogios, por soberba ou falsa modéstia, nem por críticas irresponsáveis; amar profundamente o que faz e sempre reta e seriamente fazer o melhor possível; não se tornar intransigente ou cego e surdo ao novo, mas sem ignorar seus valores e sua consciência; respeitar o próximo e tentar entendê-lo; estar sempre aprendendo e evoluindo como homem e ser humano.

Hoje, como homem, pai, professor e magistrado, espero que minhas filhas também olhem para trás e, da mesma forma, cheguem à mesma conclusão a que cheguei: pai, você é meu heroi!

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