Indústria das indenizações

Inglaterra ataca marketing para combater litigância

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18 de setembro de 2011, 8h32

Na Inglaterra, os escritórios de advocacia até podem fazer publicidade, mas não precisam. Eles compram os clientes de empresas especializadas em recrutamento de consumidores. Escrever dessa forma pode soar forte demais, até mesmo para os defensores ingleses que tentam dar um nome mais pomposo à prática, mas a forma de recrutar novos clientes é reconhecida por lei desde 2004. Nesta semana, no entanto, o governo anunciou que quer acabar com a prática para tentar combater a cultura de litigância no país.

Há sete anos, foi legalizado o que é chamado em inglês de referral fee. Funciona assim: uma pessoa é atropelada ou sofre um acidente qualquer. Assiste na televisão um comercial dizendo que tem direitos de pedir compensação pelo acidente que sofreu ou, em alguns casos, é até mesmo contatada diretamente por caçadores de clientes que foram informados, de alguma forma, do acidente. O acidentado se convence de que pode ganhar uma indenização e procura a empresa anunciante. Esta, então, o indica para um advogado, que paga uma taxa para a empresa para poder ganhar para si o cliente.

Mesmo antes de ser aprovada, a prática já acontecia na Inglaterra. Quando virou lei, as discussões em cima dela aumentaram. A própria Law Society of England and Wales, a OAB inglesa, já se dividiu sobre o ganho da política de referral fee para os advogados e para os consumidores. O argumento de um lado é o de que permitir que terceiros façam publicidade torna a Justiça mais acessível e o cidadão, mais consciente dos seus direitos. De outro, aponta-se o excesso de ações que elevam, indiretamente, o custo de vida no país.

Em tempos de crise econômica, o governo considerou que o aumento do custo de vida justifica acabar com a referral fee, depois de ter feito uma consulta pública sobre o assunto no ano passado. É que, de acordo com o Ministério da Justiça, as companhias de seguro estão cobrando valores cada vez mais altos para enfrentar a cultura de litigância no país.

A proposta apresentada pelo Ministério da Justiça esta semana é acabar com a possibilidade de venda de clientes, reduzir o número de ações, ajudar as seguradoras a economizar e repassar essa economia em preços mais baixos para os clientes. Os planos do governo foram aplaudidos tanto pela Law Society inglesa como pela Associação de Seguradoras Inglesas (ABI, na sigla em inglês). Deve, em breve, chegar ao Parlamento.

Não ganha, não paga
Dentro da proposta de reduzir o número de ações no país, um dos pontos que já foi apresentado pelo governo e está sendo discutido no Legislativo britânico é o sistema no win, no fee. Como o próprio nome indica, se o cliente não ganha, não paga nada para o seu advogado. Ou seja, ele pode recorrer à Justiça sem medo porque, se perder, não paga nada. Soma-se a isso o estímulo da publicidade para que cada um peça indenização por qualquer dano e o resultado é uma chuva de ações judiciais.

Dentro do sistema no win, no fee, para que os advogados não saíam perdendo, existe a chamada taxa de sucesso, paga pela parte acusada sempre que ela perde. O objetivo dessa taxa é compensar o profissional pelos outros casos em que ele atuou, mas, como não obteve sucesso, não ganhou nada. Na prática, por exemplo, alguém é atropelado e quer processar o motorista. Na Justiça, ganha indenização por danos morais. O motorista, então, ou a sua seguradora precisa pagar a indenização, os honorários e a tal taxa de sucesso para o advogado da parte vencedora. Já se o atropelado perde, não ganha e nem gasta nada.

A proposta do governo é fazer com que a pessoa que ajuíza a ação seja obrigada a pagar a taxa de sucesso para o seu advogado, e não a outra parte que está sendo processada. A mudança seria uma maneira de fazer com que cada um pensasse duas vezes antes de recorrer à Justiça por pedidos que, muitas vezes, não fazem sentido.

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