Na medida do possível

Fausto De Sanctis defende discrição dos magistrados

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17 de setembro de 2011, 8h44

O juiz, acima de tudo, e na medida do possível, deve ser discreto no exercício de suas atribuições. As palavras foram ditas pelo desembargador federal Fausto De Sanctis, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, durante seminário sobre as relações entre a imprensa e o Judiciário, organizado pelo próprio tribunal, nesta sexta-feira (16/9).

De Sanctis ficou famoso por ter cuidado, quando era juiz da 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo, do processo originado da operação satiagraha, da Polícia Federal. As investigações foram feitas para apurar crimes financeiros do banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity. Os resultados da operação foram anulados pelo Superior Tribunal de Justiça, por considerar ilegal a participação de agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) na operação.

O agora desembargador federal falou sobre a discrição dos magistrados ao comentar "desvios de função" de alguns colegas. Ele criticou o fato de juízes tentarem defender interesses privados usando de seus cargos públicos, buscando apenas destaque na carreira. Citou, como exemplo, os que comentam casos concretos na imprensa. "Quando dou entrevista, falo apenas de maneira institucional, sobre a lei, ou como funciona a câmara onde atuo, genericamente. Nunca sobre o caso concreto."

De Sanctis também ganhou destaque quando instituiu que todo o dinheiro arrecadado pela 6ª Vara Criminal Federal, especializada em lavagem de dinheiro, será doado a instituições de caridade. Em determinados casos, ele comparecia às cerimônias de doação, e visitava algumas das instituições que receberam doações. No caso da Fraternidade Irmã Clara, doou R$ 2 milhões e foi à inauguração anunciar a doação, em maio do ano passado. Também determinou o leilão do carro do grupo Tânia Bulhões e dos bens do traficante colombiano Juan Carlos Abadia.

Na segunda instância, no entanto, Fausto De Sanctis não pôde mais celebrar suas próprias doações. Foi proibido pelo presidente do TRF-3, desembargador federal Roberto Haddad, de ir às cerimônias de doação e protagonizar os eventos.

Outro evento proibido foi o da posse de De Sanctis, quando ele foi promovido ao TRF-3. Ele não queria assumir o cargo no tribunal, na Avenida Paulista, em São Paulo, como os demais. Ele pediu para que a solenidade fosse realizada na Sala São Paulo, ou ao menos no Salão Nobre da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco. O pedido foi negado pela cúpula da corte federal.

Mas o desembargador não acha que isso deponha contra a defendida discrição da magistratura. "Não acho que seja uma questão de aparecer. Canso de ver ministros em inaugurações e não vejo problemas", afirmou irritado.

Tarefa difícil
Fausto De Sanctis também falou do difícil trabalho da primeira instância no "combate ao crime organizado". Segundo ele, é complicado estar "na linha de frente", tendo que lidar com diferentes interesses privados, vindos de todas as direções, e com as famigeradas denúncias anônimas.

"É muito mais fácil decidir matéria constitucional abstrata, com todo o respeito aos ilustres ministros [do Supremo], do que estar na linha de frente, em contato próximo com a realidade", argumentou.

Outro trabalho duro para os juízes, segundo De Sanctis, é saber como lidar com jornalistas. Ele aponta que a imprensa é constituída por empresas privadas, e os repórteres são pautados pelos seus interesses corporativos. Por isso, ele defende que os juízes mantenham-se sempre conscientes de que estão falando com interesses particulares — para o desembargador, o interesse privado é "egoísta, pois visa apenas o aniquilamento da concorrência", e muitas vezes, diz, o Judiciário pode ser jogado no meio dessa disputa.

Entretanto, para o jornalista Wiliam Waack, apresentador do Jornal da Globo, essa é uma "relação de causa e efeito muito simplória". Não é justo, ou correto, segundo ele, relacionar diretamente o fato de uma empresa ter fins lucrativos com seus interesses jornalísticos.

Waack, que também falou durante o evento, disse ser "visceralmente contra" a leitura linear da história, que acarreta em conclusões sempre diretas, mas precipitadas. Na opinião do jornalista, não é o interesse econômico de determinada empresa jornalística que determina a qualidade de sua produção. "O que vai dizer isso, talvez de maneira mais demorada, é a credibilidade", e não suas intenções corporativas.

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