Autorização concedida

MPF-RN terá acesso às contas com recursos públicos

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10 de setembro de 2011, 8h25

A 9ª Vara Federal do Rio Grande do Norte decidiu que o Ministério Público Federal não precisa de autorização judicial para ter acesso às contas do Banco do Brasil que movimentam recursos públicos. A juíza Janine de Medeiros Souza Bezerra entendeu que a inviolabilidade constitucional dispensada às informações bancárias não se estende às contas mantidas em instituições financeiras para movimentação de recursos públicos, pois a garantia do sigilo bancário deve ser preterida pelo princípio da publicidade.

Na sua sentença, a juíza ainda argumentou que são raras as hipóteses em que se admite o sigilo da atuação administração pública, como nas hipóteses imprescindíveis à segurança do Estado e da sociedade (CF artigo 5, XXXIII, Leis 8.159/1991 e 11.111/2005 e Decreto 4.553/2002) de modo que não há como restringir a divulgação ao MPF, no exercício da sua função, de dados de contas bancárias geridas pela administração pública em que são manejados recursos de origem pública, e que pensar de modo diverso importaria indevido prejuízo à fiscalização assegurada pelo texto constitucional.

A decisão foi proferida no julgamento de Ação Civil Pública ajuizada pelo MPF para que não precise recorrer à Justiça sempre que pretender, durante ato de fiscalização e investigação, ter acesso a contas geridas pela União, estados e municípios, que movimentam recursos públicos. O órgão ministerial alegou que o banco não permitia o acesso sob a justificativa que as informações bancárias estariam protegidas pelo sigilo de que trata o artigo 1º, parágrafo 4º, da Lei Complementar 105/2011, a despeito de serem geridas por órgão público. Contra este argumento interposto pelo banco, o MP alega que a inviolabilidade como garantia de proteção possui incidência no âmbito privado, não se irradiando para a atuação do poder público.

Para o banco, o sigilo das contas bancárias deve ser respeitado e a inviolabilidade devida a informações financeiras dos seus titulares, sejam públicos ou privados, deve ser chancelada pelo Poder Judiciário, por meio de procedimento próprio.

Após a manifestação de ambas as partes, a juíza explicou que a CF no artigo 5º, inciso X, construiu como garantia individual inviolável o direito à privacidade, com o intuito de extirpar a invasiva estatal à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem dos indivíduos, assegurando indenização pelo dano moral e material decorrente da ofensa.

“Dessa maneira, a interpretação do direito à preservação da intimidade demonstra-se alargada, ampla, notando-se sua extensão aos dispositivos que se seguem no texto constitucional, sobretudo, no inciso XII, o qual prevê a inviolabilidade de dados e comunicações, incluindo as informações fiscais e financeiras”, disse a juíza. Ela ainda ressaltou que “cumpre asseverar, no entanto, que o manto de proteção que resguarda a privacidade dos indivíduos não possui caráter absoluto, podendo ser afastado em hipóteses de abuso desse direito, mediante autorização judicial tal, como se encontra disposto em Lei Complementar 105/2011”.

Após construir todo o raciocínio de que a inviolabilidade do sigilo bancário, previsto na CF e outras leis, não pode se sobrepor ao princípio da publicidade da administração pública, a juíza decidiu que o banco deveria conceder acesso às contas ao MP, estipulando multa de R$ 10 mil por dia que não cumprir a determinação.

Pressão do MP
O Ministério Público tem ajuizado ações em diversos estados para ter acesso às contas geridas pela administração pública. No entanto, nem todos os juízes têm decidido no mesmo sentido. No Espírito Santo, ao julgar Ação Civil Pública idêntica, uma juíza negou o pedido por entender que, no tocante a essa discussão, os promotores estariam revestidos de imparcialidade: “Como o MPF é parte nos referidos procedimentos e/ou processos judiciais, o mesmo não atua de forma totalmente imparcial, ou seja, não possui a necessária isenção para decidir sobre a imprescindibilidade ou não da medida que excepciona o sigilo bancário. Com efeito, somente o Poder Judiciário detém a imparcialidade exigida para decidir em que circunstâncias pode ser revelada a intimidade do indivíduo ou de pessoa jurídica (pública ou privada).”

Naquele estado o MPF requereu acesso às contas que movimentavam recursos públicos no Banco do Brasil e no Banco do Estado do Espírito Santo (Banestes).

Neste processo, a juíza entendeu que a quebra de sigilo desejada pelo MPF “não se compatibiliza com os direitos fundamentais à intimidade e à privacidade”, que são garantidos pela Constituição. Já o procurador da República Carlos Fernando Mazzoco entende ser “intolerável qualquer invocação de garantia de sigilo bancário em favor de pessoas de direito público, bem como referente a qualquer operação ativa ou passiva que envolva verbas públicas”.

Ao indeferir o pedido feito pelo MPF no estado capixaba, a juíza Maria Cláudia apoiou-se numa decisão do STF (MS 22.801-DF), relatado pelo ministro Carlos Alberto Menezes Direito (morto em 2009), que negou acesso do Tribunal de Contas da União a dados bancários sem autorização judicial, uma vez que isto não é previsto na Lei 105/2001 que regulamenta o sigilo bancário. Contra esta decisão o MPF apresentou recurso no Tribunal Regional Federal da 2ª Região.

No Maranhão, o Banco do Nordeste do Brasil (BNB), ao lado do Banco do Brasil, entrou na mira da Polícia Federal e do MPF. Por meio de representação, o Departamento de Polícia Federal pediu ao MPF do Maranhão que tomassem providências judiciais que obriguem os dois bancos a fornecerem os dados referentes a contas que movimentam recursos públicos, no interesse da fiscalização de crimes cometidos pelos gestores das verbas.

O BNB afirmou que fornece informações, dados e documentos sigilosos diretamente ao MPF e à PF apenas quando o instrumento contratual (convênio, por exemplo) apresente cláusula ou disposição autorizando expressamente tal compartilhamento. O Banco do Brasil também prevê o fornecimento direto apenas nessa hipótese, porém, em benefício somente do MPF, negando o acesso à PF.

A alegação do MPF é que há entrave de várias investigações da Polícia Federal, uma vez que 20% dos inquéritos policiais apuram a má utilização de verbas públicas. Segundo o texto da ação, para a conclusão desse tipo de investigação “é imprescindível a obtenção de dados bancários de contas públicas por onde transitou a verba advinda do Poder Público, tais como extratos, ordens bancárias, microfilmagens de cheques, etc.”. Também as investigações movidas pelo próprio MPF vêm sofrendo esse obstáculo em alguns casos.

Leia aqui a decisão da Justiça do Rio Grande do Norte.

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