vocação autoritária

Executivo não poderia ignorar proposta do Judiciário

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3 de setembro de 2011, 12h46

Do mesmo modo como critiquei a suposta conivência do presidente do Supremo Tribunal Federal com a exclusão dos recursos para reajuste dos servidores e magistrados, devo elogiar a reação do titular daquele Poder exigindo o pronto restabelecimento dos valores suprimidos pelo Poder Executivo de sua proposta orçamentária para 2012.

Não se poderia imaginar que, após haver recebido quatro ministros de Estados para explicar a necessidade de contenção do gasto público, o presidente do Supremo Tribunal Federal não tivesse sido informado pelas autoridades do Poder Executivo de que haveria a supressão das rubricas e das verbas destinadas ao reajuste de pessoal.

O mínimo que se poderia esperar numa hipótese dessas – pressionado ou não por seus pares – seria a pronta reação do titular do Poder que teve sua competência e autonomia afrontada, como ocorreu com o presidente do Supremo. O Poder Executivo, mesmo discordando, jamais poderia ignorar o direito e a garantia constitucional de outro poder ou órgão, com autonomia administrativa e financeira, de fazer sua proposta orçamentária, ainda mais se esta estivesse, como a do Judiciário estava, dentro dos limites Constitucionais, da Lei de Responsabilidade Fiscal e em plena consonância com a Lei de Diretrizes Orçamentárias.

O juízo de valor sobre se seriam ou não destinados recursos, e em que montante, para o reajuste de pessoal do Judiciário é do Poder Legislativo, a quem compete aprovar as leis do país, inclusive as de natureza orçamentária. Ao Poder Executivo, na hipótese de discordar, restaria a possibilidade de veto, que a Constituição lhe assegura, porém jamais poderia impedir o uso de uma prerrogativa constitucional de outro poder.

Portanto, a reação do presidente do Supremo, atribuindo a exclusão a um “pequeno equívoco” que deveria ser prontamente corrigido, foi a forma de denunciar a intromissão do Poder Executivo em assunto de iniciativa privativa do Judiciário, e, conseqüentemente, provocar a correção do “equívoco” mediante envio de Mensagem da Presidente da República ao Congresso restabelecendo os valores suprimidos.

O Poder Executivo, entretanto, não corrigiu de bom grado. Na mensagem 355, de 2 de setembro de 2011, após alegar que havia excluído os recursos em função do quadro de incerteza econômica mundial , diz que enviava a proposta orçamentária integral do Judiciário e do Ministério Público “em respeito ao princípio republicano da separação dos poderes e cumprindo dever constitucional”.

A vocação autoritária de setores do Governo, expressa na mensagem 355, é assustadora. Está explicito lá que a tentativa de afronta à autonomia orçamentária do Judiciário e ao princípio da separação dos poderes se deveu ao julgamento da equipe econômica de que “há possibilidade de agravamento na situação econômica internacional em 2012”.

Ora, imaginar que o Judiciário, cuja missão principal é a de guardião da Constituição, iria transigir com a quebra de um princípio constitucional em função do juízo de valor da equipe econômica sobre incertezas na economia internacional, seria muita ingenuidade. O presidente e os demais integrantes da Corte e do próprio Poder Judiciário até poderiam ser sensíveis a argumentos para retardar ou reduzir determinadas despesas, mas aceitar a supressão sem consulta, seria uma afronta.

É verdade que o estilo da atual presidente do STF, de excessiva preservação da liturgia do cargo, e o modo como exerce a presidência, com formalismo exacerbado e até ultrapassado, fazendo tudo por escrito e limitando seu contato com integrantes de outros poderes a audiências ou solenidades formais, também não ajuda na construção de diálogos. Isto pode levar a situações de conflitos que poderiam ser evitados com um simples telefonema ao chefes de poderes ou mesmo aos ministros responsáveis  pela interlocução com o Poder Judiciário, entre os quais o  AGU, o da Justiça, a do Planejamento, o da Fazenda ou a da Casa Civil.

Página virada, como disse o presidente do Supremo. Superado esse lamentável episódio, agora é promover o diálogo para que se chegue a melhor solução possível para a implementação dos planos de cargos e salários dos servidores do Judiciário e do Ministério Público, assim como em relação à atualização do teto remuneratório da União.

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