Limites do CNJ

"Posição da AMB é um problema de corporativismo"

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8 de outubro de 2011, 13h35

O deputado federal que apresentou ao Congresso Nacional a Proposta de Emenda Constitucional, ainda em 1992, Hélio Bicudo acredita que a fiscalização do Poder Judiciário está "entranhada" na sociedade brasileira. Por isso, a ação da Associação dos Magistrados Brasileiros que questiona os poderes do Conselho Nacional de Justiça não ameaça o órgão.”Ele hoje está cumprindo as suas atribuições, de fiscalizar o Poder Judiciário e de punir os juízes que não atuam de acordo com os princípios da boa justiça”, diz.

Em entrevista ao jornalista Bruno Góes, publicada nesta sexta-feira (7/10) pelo jornal O Globo, Bicudo disse que “a posição da AMB é um problema de corporativismo de classe. E o conselho existe exatamente para impedir esse corporativismo. O conselho, inclusive, se faz sentir quando você cria um órgão que vai fiscalizar o Poder Judiciário e encontra os membros deste poder lutando contra essa atuação”.

Leia abaixo a íntegra da entrevista:

Qual foi a ideia de origem do CNJ?
A ideia do CNJ era exatamente submeter o Poder Judiciário à crítica da população. Essa era a ideia: aproximar o Poder Judiciário do povo. Porém, o CNJ, se você olhar a composição, é um órgão do Poder Judiciário com nove pessoas do próprio Judiciário. É um órgão que não se prestaria ao papel que lhe foi atribuído na sua instituição. Mas eu acho que, dependendo das pessoas que o compõe… ele hoje está cumprindo as suas atribuições, de fiscalizar o Poder Judiciário e de punir os juízes que não atuam de acordo com os princípios da boa justiça.

Como o senhor vê a ação proposta pela Associação dos Magistrados Brasileiros, que considera inconstitucional a resolução 135 do conselho e alega que ele não pode virar um tribunal?
Ele não é um tribunal. Eu acho que ele é uma entidade muito mais da sociedade civil do que da própria magistratura, embora esteja no capítulo (da Constituição Federal) do Poder Judiciário. Ele está cumprindo o seu papel dentro dos princípios que devem nortear o papel da magistratura e dentro de um sistema democrático. A posição da AMB é um problema de corporativismo de classe. E o conselho existe exatamente para impedir esse corporativismo. O conselho, inclusive, se faz sentir quando você cria um órgão que vai fiscalizar o Poder Judiciário e encontra os membros deste poder lutando contra essa atuação. Mesmo que essa questão esteja na mesa do STF, a fiscalização do Poder Judiciário está entranhada na sociedade brasileira. É muito difícil você mudar a atuação do CNJ através de uma decisão do Supremo Tribunal Federal.

O senhor presenciou muitos embates à época da criação do conselho?
Não houve muita discussão. Acho até que se procurou favorecer muito o Poder Judiciário na constituição do CNJ. Você veja: de 15, são nove os integrantes do Poder Judiciário. São poucos membros da sociedade civil. Na verdade, é um órgão instituído dentro do Poder Judiciário e com a maioria dos membros do Poder Judiciário. Mas se o órgão atua da maneira como ele está atuando, buscando punir os juízes que não atuam de acordo com os princípios da Justiça, acho que é muito difícil você hoje querer cortar o poder do Conselho Nacional de Justiça, no sentido de favorecer o corporativismo dos magistrados.

O senhor acha que o conselho deveria ser de outra forma?
A constituição do conselho é o que me preocupa, porque se os membros do Conselho Nacional de Justiça, que são quase todos magistrados, tomarem posições contrárias àquela que agora o CNJ está adotando… então seria um desastre. Neste momento, ele está adotando essa posição por causa atuação da sociedade civil.

Como o senhor avalia o argumento que alguns magistrados usam, de que haveria interferência entre os poderes, para poder refutar as competências do CNJ?
Essa questão de independência entre os poderes é muito relativa, porque você não pode permitir que um poder seja colocado acima dos interesses da sociedade. Nesse caso, por exemplo, do CNJ, se um juiz ou um tribunal está atuando em desacordo com as suas finalidades, é preciso que exista um órgão capaz de impedir que essa atuação se faça.

E o argumento sobre o desvirtuamento das corregedorias dos tribunais?
As corregedorias são órgãos dos tribunais, de juízo dos tribunais. Então, o corporativismo que impera na Justiça, principalmente em segunda instância, impede que essas corregedorias realmente funcionem. Veja, por exemplo, o que elas fizeram até hoje: adotaram punições levíssimas. Muitas vezes, aconselham aposentadoria precoce … esse tipo de coisa que não leva a nenhuma punição. O juiz – como qualquer cidadão – que infringe a lei deve ser punido.

O que o senhor achou das declarações da corregedora Eliana Calmon?
No momento, o CNJ está cumprindo o papel que todos nós esperamos dele, que é o de corrigir os excessos da justiça. Aprovo integralmente a sua fala.

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