Registros telefônicos

Inquérito contra Protógenes Queiroz sobe para o STF

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31 de março de 2011, 12h24

O Supremo Tribunal Federal é quem vai decidir se a famosa Operação Satiagraha, comandada por Protógenes Queiroz, foi arquitetada e dirigida pela iniciativa privada. Nesta segunda-feira (28/3), o juiz da 3ª Vara Federal Criminal de São Paulo, Toru Yamamoto, declinou de sua competência e enviou o caso à Suprema Corte, já que o então delegado tomou posse como deputado federal pelo PCdoB e tem agora foro privilegiado.

Estava nas mãos do juiz federal o inquérito que investiga os telefonemas trocados, antes da operação que investigou Daniel Dantas sair do papel, entre Protógenes e empresários inimigos do banqueiro. Com a quebra do sigilo telefônico do então delegado Protógenes Queiroz descobriu-se que ele trocou pelo menos 93 telefonemas com o empresário Luís Roberto Demarco entre julho de 2007 e abril de 2008.

No inquérito policial, que tramita em segredo de Justiça, consta ainda ligações feitas entre o delegado, o então diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Paulo Lacerda, e o diretor de contra-inteligência da Abin, Paulo Maurício Fortunato. Este último ficou conhecido por supostamente ter grampeado o ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes e o senador Demóstenes Torres. Eles estão afastados de suas funções até a conclusão do inquérito.

A quebra do sigilo telefônico foi autorizada pelo juiz federal Ali Mazloum a pedido do delegado Amaro Vieira Ferreira, da Corregedoria da Polícia Federal. Ao perceber que por trás do idealismo de Protógenes havia personagens com interesse comercial e econômico na operação, Mazloum desdobrou o processo. O empresário Luís Roberto Demarco foi ao Tribunal Regional Federal pedir o trancamento do inquérito. O Tribunal não concedeu, mas repassou o caso para a 3ª Vara Federal Criminal.

Na decisão desta segunda-feira (28/3), o juiz se declarou incompetente para processar e julgar o delegado afastado da Polícia Federal, já que foi eleito deputado federal e agora possui foro privilegiado e deve ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal. Os documentos do inquérito serão colocados em envelopes duplos. No envelope de dentro, o juiz mandou escrever “SIGILO”, o nome do destinatário que irá receber o conteúdo do setor de distribuição do STF e lacrá-lo. O envelope de fora ficará em branco.

Briga de gigantes
O objetivo da investigação é esclarecer se houve ilícitos, na defesa de interesses privados, durante a operação comandada pelo delegado. Enquanto o inquérito esteve na 3ª Vara Federal Criminal, o Ministério Público Federal pediu a nulidade das provas. Já a defesa do banqueiro Daniel Dantas, do engenheiro Dório Ferman, ex-presidente do Banco Opportunity, e de Humberto Braz, ex-presidente da Brasil Telecom, reclamavam o compartilhamento dos dados e pediam que o juiz se abstivesse de inutilizar qualquer prova do inquérito policial.

O juiz Toru Yamamoto negou os pedidos com a justificativa de que não poderia atendê-los porque o caso está pendente de apreciação do requerimento do MPF. Outro fundamento usado pelo juiz foi o de que a investigação está protegida pelo segredo de Justiça. Somente é permitido o acesso das partes envolvidas.

No entanto, duas liminares — uma em Habeas Corpus e outra em um Mandado de Segurança — decidiram que o juiz da 3ª Vara Criminal Federal não poderia tirar, extrair e inutilizar provas do inquérito policial. A primeira foi dada pelo desembargador André Nekatschalow, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. A outra pelo também desembargador federal José Lunardelli. O mérito das liminares não chegou a ser analisado.

O pedido de compartilhamento das informações do inquérito policial foi atendido, no final de 2010, pelo desembargador Nery Júnior, então no exercício da Corregedoria do TRF-3. No entanto, o juiz Yamamoto não sentiu que houve esclarecimento na decisão administrativa da Corregedoria.

"Oficie-se ao Corregedor Regional da 3ª Região em Substituição Regimental, Nery Júnior, solicitando respeitosamente orientação sobre o cumprimento da decisão proferida nesta data nos autos do Expediente Administrativo 2009.01.0500 de modo a não acarretar o descumprimento quanto às decisões proferidas nos autos do Habeas Corpus 0030540-60.2010.4.03.0000/SP e do Mandado de Segurança 0034737-58.2010.4.03.0000/SP, pela quais foram concedidas liminares, determinando que este Juízo se abstivesse de desentranhar e inutilizar provas produzidas no presente inquérito policial até o julgamento das impetrações", anotou o juiz federal da 3ª Vara Criminal Federal.

Logo em seguida, no ofício encaminhado ao desembargador Nery Júnior, o juiz Toru Yamamoto questionou a ordem dada pelo corregedor. "Ademais, salvo melhor entendimento, entende este Juízo que deferir ou não compartilhamento de provas é matéria jurisdicional e não pode ser objeto de decisão administrativa, ainda que emanada da E. Corregedoria Regional", acrescentou o juiz federal.

O banqueiro Daniel Dantas foi condenado a 10 anos de detenção por corrupção ativa. A pena foi transformada em prestação de serviços à comunidade. O delegado afastado Protógenes Queiroz foi condenado pelo juiz federal da 7ª Vara Federal Criminal de São Paulo a 3 anos e 11 meses de prisão, por violação de sigilo funcional e fraude processual (vazar informações e forjar provas) enquanto chefiava a operação Satiagraha. Este processo também subiu para o Supremo após a posse de Protógenes. Das sentenças ainda cabem recursos.

Leia a decisão do juiz:
Trata-se de inquérito policial instaurado para "apurar os fatos relacionados com telefonemas entre PROTÓGENES PINHEIRO DE QUEIROZ e as empresas P.H.A. COMUNICAÇÃO E SERVIÇOS SS LTDA. E NEXXY CAPITAL BRASIL LTDA., esta pertencente a LUIZ ROBERTO DEMARCO ALMEIDA, bem como com integrantes da diretoria da Abin, PAULO FERNANDO DA COSTA LACERCA e PAULO MAURÍCIO FORTUNATO PINTO, tendo em vista as diversas ligações telefônicas entre ele", fatos esses que, conforme a portaria inaugural deste feito, foram capitulados nos artigos 325 do Código Penal e 10 da Lei nº 9.296/1996.

O Ministério Público Federal entendeu que os fatos investigados subsumem-se nos artigos 317, parágrafos 1º e 2º, 319 e 333, todos do Código Penal, conforme manifestação de fls. 69/95. Manifestou-se também o D. Órgão Ministerial pela remessa dos autos ao E. Supremo Tribunal Federal em face da diplomação e posse do investigado Protógenes Pinheiro de Queiroz no cargo de Deputado Federal (fls. 387).

DECIDO
Verifico que, como assinalado pelo D. Procurador da República, o investigado Protógenes Pinheiro de Queiroz foi eleito Deputado Federal nas eleições de 2010, já tendo sido devidamente diplomado e empossado, conforme cópia de página do sítio da Câmara dos Deputados cuja juntada determino aos autos.Dispõe o artigo 53, parágrafo 1º, da Constituição da República, que, desde a diplomação, os Deputados Federais serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal.

Desse modo, DECLINO DA COMPETÊNCIA em relação a este feito e determino a sua remessa ao C. Supremo Tribunal Federal. Ciência ao Ministério Público Federal. Oficie-se à Primeira Seção e à Quinta Turma do E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, encaminhando cópias da presente decisão, para instrução do Mandado de Segurança nº 0034737-58.2010.4.03.0000/SP e do Habeas Corpus nº 0030540-60.2040.4.03.0000/SP, respectivamente. Dê-se baixa na distribuição.

A remessa dos autos deverá observar as seguintes determinações, tendo em vista o caráter sigiloso dos documentos neles constantes:- os autos serão acondicionados em envelopes duplos;- no envelope externo não constará nenhuma indicação do caráter sigiloso do feito; – no envelope interno serão apostos o nome do destinatário, a saber, Setor de Distribuição do Supremo Tribunal Federal, e a indicação de SIGILO, de modo a serem identificados logo que removido o envelope externo; – o envelope interno será lacrado.

São Paulo, 28 de março de 2011

TORU YAMAMOTO
JUIZ FEDERAL

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