Jogo eleitoral

Mandato é do partido, mas só depois de 2012

Autor

  • Rodrigo Pires Ferreira Lago

    é advogado conselheiro federal suplente e ex-presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB/MA. Diretor-geral da Escola Superior de Advocacia do Maranhão OAB/MA. Membro do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) fundador e articulista do site Os Constitucionalistas (www.osconstitucionalistas.com.br).

4 de março de 2011, 14h42

Após a proclamação do resultado das Eleições 2010, mas antes do fim dos mandatos estaduais e federais conquistados em 2006, o Supremo Tribunal Federal foi provocado a resolver relevante questão constitucional nunca antes argüida, mesmo perante a Justiça Eleitoral. Tratava-se do mandado de segurança impetrado pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro – PMDB, o MS 29.988.

Após a renúncia do deputado federal Natan Donadon (PMDB/RO) em novembro de 2010, para tentar escapar do julgamento de uma ação penal, o PMDB requereu perante a Mesa Diretora da Câmara dos Deputados fosse convocado a assumir o mandato o primeiro suplente daquela legenda, apesar de não ter sido o suplente mais votado da coligação pela qual o titular fora eleito. O pedido foi negado, tendo sido convocado a assumir o mandato o primeiro suplente da coligação, que disputara a eleição por outro partido, e que no momento da convocação já nem mais pertencia aos quadros deste partido, sendo filiado a partido que sequer integrava a coligação pela qual havia conquistado a suplência.

A discussão jurídica de fundo era sobre a quem pertencia o mandato eletivo quando conquistado em regime de coligação. Pela sistemática até então adotada, o mandato sempre foi considerado da coligação, chamando-se para assumi-lo em caso de vacância os suplentes segundo a lista das coligações, independente do partido ao qual pertencia.

Apesar da Lei 12.016/09 outorgar poderes ao relator para decidir monocraticamente a medida liminar, o ministro Gilmar Mendes optou por levar o caso a Plenário. E o Tribunal concedeu a liminar no MS 29.988, por decisão plenária, firmando nova interpretação constitucional, segundo a qual o mandato pertence ao partido, ainda que este tenha disputado as eleições em regime de coligação.

O escore foi de cinco votos pela concessão da medida liminar, e três contrários, não tendo participado da assentada os ministros Celso de Mello e Ellen Gracie, ausentes, e o ministro Luiz Fux, que à época nem havia sido indicado para compor o Supremo Tribunal Federal. A nova sistemática não chegou a se tornar fato consumado provavelmente porque o ministro Ricardo Lewandowski, que é também presidente do TSE, não aderiu à tese, tendo ficado vencido. Fosse o contrário, provavelmente teria indicado a edição de resolução pelo TSE para orientar a diplomação dos suplentes eleitos em 2010 já em observância à nova interpretação constitucional. O não acolhimento dessa tese pela Justiça Eleitoral, que continuou a diplomar os suplentes segundo listagens feitas por coligação, acabará forçando o breve reencontro do tema pelo Supremo Tribunal Federal.

Em texto publicado antes do início do ano judiciário de 2011, no blog Os Constitucionalistas (leia aqui), afirmei ser provável a confirmação da nova interpretação constitucional sobre o tema, com a possível adesão de pelo menos um dos ministros que não tomaram assento naquele julgamento. A convicção se mantém, mas o conflito criado entre os Poderes, com a resistência da Câmara dos Deputados e de quase todas as assembléias legislativas, fará o Tribunal melhor refletir sobre o caso.

II – INSTABILIDADE E INSEGURANÇA JURÍDICA

Em audiência na Presidência do Supremo Tribunal Federal, o deputado Marco Maia, presidente da Câmara dos Deputados, deixou claro que aquela Casa criará obstáculos à execução de liminares enquanto não houver uma posição definitiva sobre o tema da titularidade dos mandatos. A própria comunicação social do STF divulgou a audiência e uma de suas finalidades:

Com relação à controvérsia entre atos da Câmara dos Deputados e decisão do STF sobre posse de suplentes naquela Casa Legislativa, o deputado Marco Maia afirmou que aguarda decisão definitiva do Plenário do STF sobre se a vaga cabe ao partido ao qual o candidato é filiado ou à coligação da qual o partido dele integra.

(matéria publicada no site do STF, em 08/02/2011 sob o título III Pacto Republicano é tema de encontro entre os presidentes do STF, da Câmara e do Senado, disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=171374&caixaBusca=N>. Acesso em: 28/02/2011)

E de fato a Câmara dos Deputados, por sua Mesa Diretora, tem criado sérios obstáculos à execução destas liminares. A própria medida liminar concedida no MS 29.988 tardou a ser cumprida, o que só ocorreu após reiterados ofícios da Presidência do Supremo Tribunal Federal. Ainda assim, a Câmara dos Deputados só o fez depois de instaurar o procedimento de perda de mandato previsto no Estatuto Parlamentar, positivado no artigo 55 da Constituição da República.

A demonstrar a instabilidade jurídica e política, chegou-se ao absurdo da Câmara dos Deputados não ter cumprido tempestivamente uma liminar concedida pela Presidência do STF durante o período de recesso do início do ano, nos autos do MS 30.249. O impetrante daquele mandado de segurança chegou a propor ação de reclamação constitucional (RCL 11.226) para garantir a autoridade da decisão. Mas não obteve provimento jurisdicional tempestivo, e o mandato eletivo que buscar exercer findou-se em 31 de janeiro de 2011. A medida liminar concedida pelo Supremo Tribunal Federal, portanto, simplesmente não foi obedecida, e restou inócua.

É certo que a tese afirmada no MS 29.988 representa inegável coerência hermenêutica com os julgamentos do MS 26.602, do MS 26.603, do MS 26.604 e MS 27.938, sendo provável a sua confirmação em novo julgamento. Mas se mostra necessário observar o princípio da segurança jurídica em eventual reencontro do STF com o tema, evitando a aplicação desta nova interpretação para a Legislatura 2011/2015.

Aliás, essa circunstância já começa a ser evidenciada quando se constata que, iniciado o ano judiciário de 2011, novos mandados de segurança foram impetrados e aqueles distribuídos aos ministros Ellen Gracie e Celso de Mello não tiveram suas liminares apreciadas. Postergou-se o exame da medida liminar requestada para momento posterior ao recebimento das informações. Foi isso o que ocorreu no MS 30.368 e no MS 30.375 distribuídos à ministra Ellen Gracie, e no MS 30.321 distribuído ao ministro Celso de Mello.

A instabilidade jurídica e política é tamanha que, sem prever a alteração da regra sobre a ordem de suplência, há partidos que, estando coligados com outros partidos em 2010, disputaram as eleições sem sequer registrarem outros candidatos para a eventualidade de elegerem o candidato registrado dentre os nomes titulares na coligação. Essa peculiar circunstância poderá deixar vaga a cadeira no curso do mandato, sem que haja substituto eleito.

Matéria publicada no Estadão, que especula sobre possível mudança de posição do Supremo Tribunal Federal sobre o tema de fundo, dá conta do fato de nada menos que 29 dos 513 deputados federais eleitos em 2010 não terem um suplente sequer:

Reportagem do Estado publicada ontem mostrou que 14 estados ficariam sub-representados no Congresso se fosse aplicada a regra, ainda provisória, estabelecida pelo Supremo. Isso ocorreria porque 29 deputados eleitos no ano passado não contam com suplentes de seus partidos. Caso saiam para exercer cargo em secretarias estaduais, municipais ou ministérios, não terão substitutos da mesma legenda.


(matéria publicada no site do Estadão, em 26/02/2011 sob o título Supremo já admite rever regra pró-suplentes de partido, disponível em: <http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20110226/not_imp684850,0.php>. Acesso em: 28/02/2011)

Em razão disto, se um destes vinte e nove deputados renunciarem ao mandato, sofrerem qualquer impedimento, ou mesmo pedirem licença, as suas cadeiras ficarão vagas. Com isso, novas eleições teriam que ser convocadas, por aplicação de expresso texto do artigo 113 do Código Eleitoral:

 

Código Eleitoral

Art. 113. Na ocorrência de vaga, não havendo suplente para preenchê-la, far-se-á eleição, salvo se faltarem menos de nove meses para findar o período de mandato.

Estes fatos, por si, já demonstram que, além da insegurança jurídica que a todos apanhou de surpresa – fundamento que será melhor entrentado adiante -, causará grave instabilidade política e jurídica, repercutindo na ordem pública e jurídica. Basta imaginar que, ocorrendo vacância em um destes 29 cargos, a Justiça Eleitoral terá que convocar eleições nestes estados. E se por ventura o entendimento sufragado na medida liminar do MS 29.988 não for ratificado pelo Plenário quando do julgamento de mérito dos novos mandados de segurança, ter-se-á como inúteis estas eleições, representando um enorme e desnecessário gasto pela Justiça Eleitoral.

Pior ocorrerá, caso venha a ser confirmada a nova interpretação constitucional. É que a excepcionalíssima situação de não haver suplentes para preencher uma vaga aberta no parlamento será uma hipótese a ser considerada, e em várias unidades da Federação. E neste caso, não custa advertir, as cadeiras que deveriam ser preenchidas pelo sistema proporcional acabarão sendo conquistadas por uma eleição majoritária. É que, havendo somente uma cadeira em disputa, não há como garantir, mesmo em tese, a distribuição desta proporcionalmente às ideologias do eleitorado convocado às urnas, mitigando o princípio constitucional do valor do voto igual para todos, estampado às expressas pelo artigo 14 da Constituição.

 

III – A SEGURANÇA JURÍDICA vs. A EVOLUÇÃO DA INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL

Antes de se invocar o princípio da segurança jurídica, é necessário verificar qual era o tratamento jurídico dado à questão da ordem de suplência para fins de renúncia e licença pelos titulares eleitos no sistema proporcional. É inegável, isso ninguém discute, que a ordem de suplência sempre prevalecente nas eleições proporcionais foi a que segue a lista formada por cada uma das coligações e partidos que disputaram isoladamente. Assim, seria irrelevante para fins de convocação para a posse de suplente em cadeira vaga a qual o partido pertencia, sendo o bastante que a vaga integrasse uma das conquistadas pela coligação pela qual disputara as eleições. Tanto é assim que a Justiça Eleitoral, desde sempre, e inclusive em 2010, expediu diplomas para suplentes considerando a lista de votação por coligações, e não por cada um dos partidos integrantes da coligação.

Foi afirmado no voto do ministro Gilmar Mendes no MS n° 29988 (íntegra disponível em: <http://www.osconstitucionalistas.com.br/wp-content/uploads/2011/02/MS299881.pdf>) que a questão constitucional deveria ser resolvida em coerência com o que já decidido nos MS 26.602, do MS 26.603, do MS 26.604 e MS 27.938, especialmente considerado o conteúdo da Resolução TSE 22.580, de 30 de agosto de 2007. De fato, como já consignado, os fundamentos da decisão proferida no MS 29.988 representam inegável coerência hermenêutica com os três mandados de segurança que ratificaram a tese sustentada pelo egrégio TSE quanto às conseqüências de perda do cargo por infidelidade partidária. E são ainda mais coerentes os fundamentos deste voto com o conteúdo da decisão proferida no MS 27.938, que resolveu o imbróglio acerca da vaga deixada após o falecimento do deputado Clodovil Hernandez, que carregara consigo o mandato após deixar, por justa causa, segundo a Justiça Eleitoral, o partido pelo qual se elegera.

Todavia, a questão é apenas de coerência hermenêutica, ou mais propriamente, de tomar por empréstimo os mesmos fundamentos. Não se tratou, portanto, de pura reafirmação da jurisprudência. E é possível constatar isso por duas circunstâncias distintas: 1) primeiro porque todos os casos precedentes versavam sobre infidelidade partidária; e 2) mesmo após os julgamentos pelo STF dos três mandados de segurança versando sobre infidelidade partidária, a Justiça Eleitoral (nas Eleições 2008) e os parlamentos no curso dos mandatos (seja referentes às Eleições 2006, seja referentes às Eleições 2008) continuaram a obedecer a ordem de suplentes segundo as listas das coligações, independente do suplente convocado a assumir ser ou não correligionário do titular licenciado, ou do antigo titular.

Percebe-se, inclusive, que a própria Justiça Eleitoral continuou entendendo desta forma, mesmo após a tão citada Resolução TSE 22.580, de 30 de agosto de 2007. Ora, fosse o contrário, os diplomas expedidos aos suplentes de vereador eleitos em 2008 já observariam a ordem de suplência por cada partido isoladamente, desconsiderando eventuais coligações. Mas não foi assim.

E todas as convocações para posse de vereadores, deputados estaduais e deputados federais desde sempre, e neste caso ao menos até o dia 9/12/2010, data do julgamento plenário da medida liminar no MS 29.988, observaram esta lista de suplência formada pela Justiça Eleitoral, a considerar os suplentes por coligações, e não separadamente por cada um dos partidos integrantes da coligação.

E tanto houve efetivamente alteração na interpretação deste ponto específico, quanto à ordem de suplência para fins de preenchimento de vagas nos parlamentos decorrentes de renúncia expressa, morte ou licença, que ao receber conclusos os autos do MS 29.988, o ministro Gilmar Mendes apresentou o processo em Mesa para julgamento plenário. Fosse uma questão já resolvida e pacífica, desafiaria decisão monocrática de concessão liminar, como expressamente previsto na Lei 12.016/09. Leia-se, a propósito, a justificativa do eminente ministro Gilmar Mendes para decidir o caso em Plenário:

(…) Em razão da proximidade do fim da atual legislatura (próximo dia 31.01.2011) e da importância da questão constitucional suscitada, submeto ao Plenário do Tribunal a apreciação do pedido de medida liminar. (…)

(STF – MS 29988, Trecho do voto do Relator, Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 09-12-2008, acórdão ainda pendente de redação. Disponível em: <http://www.osconstitucionalistas.com.br/wp-content/uploads/2011/02/MS299881.pdf>. Acesso em: 28/02/2011)

Ora, não há dúvidas que, por mais importante fosse a questão constitucional, se já estivesse resolvida por este egrégio STF, seria o caso de conceder ou denegar a liminar monocraticamente. O só fato de se ter levado o caso ao Plenário demonstra que se tratava de uma evolução da interpretação constitucional.


É dever do Supremo Tribunal Federal, enquanto precípuo guardião da Constituição da República, e também de qualquer outro órgão do Poder Judiciário, preservar a segurança jurídica, deixando os jurisdicionados salvos de mudanças de interpretação sobre o conteúdo das normas que regeram determinado fato jurídico. E este, o fato jurídico, é a realização da convenção dos partidos que resolveram formar uma coligação para a disputa das Eleições 2008 e para as Eleições 2010. Tem-se, portanto, que a segurança jurídica exige a prevalência das regras anteriores, desde a proclamação do resultado das eleições, até o último dia do quadriênio dos mandatos.

Já não se trata aqui das Eleições 2006, da qual se originou a vaga disputada no MS 29.988, exatamente porque os mandatos ali obtidos se extinguiram no tempo, precisamente no dia 31/01/2011. E é exatamente por isto que a decisão liminar concedida no MS 29.988 teve o caráter irreversível mencionado pelo ministro Gilmar Mendes. O mérito daquela ação mandamental jamais deverá ser julgado, por absoluta falta de objeto em litígio, ou mais propriamente, por falta superveniente de interesse jurídico dos atores processuais.

O que se sugere neste texto é a aplicação da técnica americana do prospective overruling. Nada mais significa que, quando houver alteração nas regras pela evolução jurisprudencial, no caso brasileiro por nova interpretação das leis ou mesmo da Constituição, é dever respeitar o quanto possível os precedentes para os fatos ocorridos anteriormente. Mas o respeito à força dos precedentes não impedirá a evolução da interpretação constitucional, porquanto mesmo sendo negado pedido, o Tribunal sinalizará ao jurisdicionado que nos casos futuros o tratamento da matéria será diverso. Vê-se que isso decorre do postulado supraconstitucional da segurança jurídica, o mesmo que serve de alicerce à proteção à confiança.

Essa técnica de decisão já é aplicada amplamente no direito brasileiro, no âmbito dos processos objetivos de controle de constitucionalidade. O próprio Supremo Tribunal Federal, há algum tempo, abandonou a aplicação impositiva da teoria da nulidade das normas inconstitucionais, admitindo a aplicação de efeitos ex nunc às decisões de declaração de inconstitucionalidade, quando forçados por circunstâncias de segurança jurídica. Posteriormente, a Lei 9.868/99 positivou este entendimento em seu artigo 27, indo até mais além, para permitir que o Tribunal fixe o momento da eficácia da decisão para data futura:

Lei n° 9.868/99

Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.

Em que pese a impugnação objetiva da constitucionalidade deste dispositivo, por ação ainda não apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, é certo que dele já se utilizou para a fixação de data futura para a eficácia da decisão proferida no controle concentrado. Foi o caso da declaração de inconstitucionalidade da Lei Estadual 7.619/00 do estado da Bahia que criou o município de Luis Eduardo Magalhães, que apesar de reconhecidamente inconstitucional, permaneceria em pleno vigor e eficácia por mais vinte e quatro meses. Assim restou consignado o acórdão:

Ação direta julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade, mas não pronunciar a nulidade pelo prazo de 24 meses, da Lei n. 7.619, de 30 de março de 2000, do Estado da Bahia.

(ADI 2240, Relator: Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 09/05/2007, DJe-072 03-08-2007)

Inegavelmente, os casos versados nos mandados de segurança tratam de processos subjetivos, donde nem se discute eventual declaração de inconstitucionalidade de norma alguma, mas tão só da correta aplicação de postulados constitucionais. Mas, curiosamente, este mesmo princípio serviu a nortear esta o Supremo Tribunal Federal quando da concessão dos mandados de segurança que ratificaram a tese do TSE de perda dos cargos eletivos por infidelidade partidária, exatamente os processos donde foram extraídos os fundamentos a garantir a coerência hermenêutica afirmada no MS 29.988.

É o que se passa a demonstrar.

A ministra Cármen Lúcia fez consignar expressamente no v. acórdão do MS 26.604 que a evolução jurisprudencial deveria respeitar a segurança jurídica, como se lê da ementa:

Razões de segurança jurídica, e que se impõem também na evolução jurisprudencial, determinam seja o cuidado novo sobre tema antigo pela jurisdição concebido como forma de certeza e não causa de sobressaltos para os cidadãos. Não tendo havido mudanças na legislação sobre o tema, tem-se reconhecido o direito de o Impetrante titularizar os mandatos por ele obtidos nas eleições de 2006, mas com modulação dos efeitos dessa decisão para que se produzam eles a partir da data da resposta do Tribunal Superior Eleitoral à Consulta n. 1.398/2007. (STF – MS 26604, Relatora Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, DJe-187 03-10-2008)

O alicerce deste trecho da ementa fica expresso na seguinte passagem do voto da ministra Cármen Lúcia:

74. O controle de constitucionalidade para a legitimação eficaz, mesmo aquele exercido que no caso concreto, supõe mudanças eventualmente processadas na jurisprudência para o atingimento dos fins de se garantir a efetividade constitucional que se respeite a sociedade em termos do que outro princípio constitucional – o da segurança jurídica – seja devidamente respeitado e, assim, seja respeitado o cidadão e as instituições que ele forma para atingir os seus objetivos.

(…)

Tal como se dá quando alterações levadas a efeito pela legislação sobre uma matéria podem trazer insegurança jurídica, no caso em espécie, mudanças jurisprudenciais também podem acarretar incerteza que não deixa em situação de conforto jurídico os cidadãos, nem os seus representantes.

(STF – MS 26604, Trecho do voto da Relatora, Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, DJe-187 03-10-2008)

Neste julgamento, nada mais fez a ministra Cármen Lúcia que aplicar na prática o entendimento expressado na sua própria doutrina, quando já sustentava antes mesmo de ser nomeada ministra do Supremo Tribunal Federal:

 

Não apenas a elaboração da lei, mas para a sua aplicação e incidência de todos os provimentos estatais há que se considerar, como é óbvio, e na esteira daquele mandamento expressamente voltado para a atividade judicante, os fins sociais que atendam ao bem público. Seria incoerente que o jurisdicionado ficasse sujeito ao desfazimento automático de efeitos produzidos anos antes e que lhe tenha sido patrocinado ou determinado pelo Estado em razão do advento de outro provimento, este declaratório de inconstitucionalidade, contrário ao primeiro. (ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. O princípio da coisa julgada e o vício de inconstitucionalidade. In: ROCHA, Cármen Lúcia Antunes (org.). Constituição e segurança jurídica: direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada. Estudos em homenagem a José Paulo Sepúlveda Pertence. 2. ed. rev. e ampl. Belo Horizonte: Forum, 2005, p. 185)

No caso versado naquele mandado de segurança, que tratava não do preenchimento de vagas pelos suplentes, mas da perda do mandato ou renúncia tácita quando verificado um ato de infidelidade partidária, o STF, em homenagem ao caro princípio da segurança jurídica, houve por modular os efeitos daquela decisão para a partir da data em que respondida a Consulta 1.398 pelo TSE. É que a partir desta data, em que se tornou público o novo entendimento sobre a questão da infidelidade partidária, todos poderiam conhecer a atual interpretação constitucional – ainda que feita pelo TSE, e não pelo Supremo Tribunal Federal. E tendo conhecimento da nova interpretação constitucional, poderiam evitar a prática dos atos que, a partir de então, poderiam modificar o seu status, repercutindo em sua esfera de patrimônio jurídico.


Este posicionamento da ministra Cármen Lúcia, a preservar a segurança jurídica, foi acompanhado quase à unanimidade de membros do Tribunal, vencido o ministro Marco Aurélio. O ponto central de divergência foi quanto à fixação da data a partir da qual o ato de infidelidade teria como conseqüência a perda do mandato: se da data da resposta pelo TSE à Consulta 1.398; ou se a partir do mencionado julgamento pelo STF, meses mais tarde. Prevaleceu a primeira hipótese, considerado o fato de que na resposta àquela consulta já ficou expressa a conseqüência, tendo o deputado trânsfuga assumido o risco do entendimento ser ratificado pelo egrégio STF.

Leia-se, a propósito, importante passagem do voto do ministro Gilmar Mendes, após aprofundado estudo em Direito Comparado sobre a incidência princípio da segurança jurídica contra a retroatividade de alterações jurisprudenciais:

Com essas considerações, diante da mudança que se opera, neste momento, em antiga jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, e com base em razões de segurança jurídica, entendo que os efeitos desta decisão devam ser modulados no tempo. Creio que o marco temporal desde o qual tais efeitos possam ser efetivamente produzidos deve coincidir com a decisão do Tribunal Superior Eleitoral na Consulta n° 1.398/2007, Rel. Min. César Asfor Rocha, que ocorreu na Sessão do dia 27 de março de 2007.

(STF – MS 26604, Trecho do voto do Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, DJe-187 03-10-2008)

Como se vê, exatamente quanto a mandatos eletivos proporcionais, o Supremo Tribunal Federal preservou a segurança jurídica contra a evolução jurisprudencial. E foi justamente por isto que os parlamentares infiéis, mas cujos atos de infidelidade ocorreram antes da data fixada naqueles julgamentos, não sofreram qualquer conseqüência jurídica da evolução da jurisprudência, senão o fato de que não seriam mais tolerados novos atos de infidelidade partidária.

Também o ministro Cezar Peluso observou a necessidade, naquele julgamento, de se modular os efeitos da nova interpretação constitucional:

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO – Se Vossa Excelência me permite, quero até confortar o eminente Ministro e dar uma certa tranqüilidade a essas preocupações de Sua Excelência, dizendo que jamais passou pela cabeça de nenhum Ministro deste Suprema Corte que, após decidir, numa votação recente, a mudança de jurisprudência pacífica a respeito da prisão civil dos fiduciantes na alienação fiduciária, ser ilegítima e ilícita, tomar isso como fonte de ação de indenização contra as fiduciárias e contra o Estado por todas as prisões decretadas sob o império da legislação anterior.

(STF – MS 26604, Trecho de debates, manifestação oral do Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, DJe-187 03-10-2008)

O ministro Joaquim Barbosa, apesar de ter votado pela denegação da segurança nos casos de infidelidade partidária, assentou que, acaso concedidas as seguranças no MS 26.602, MS 26.603 e MS 26.604, dever-se-ia respeitar a segurança jurídica, prospectando os efeitos da decisão:

Caso se venha a atingir a maioria pela concessão da segurança, acolho na integralidade, por maiores que sejam as dificuldades que ela engendra, a proposta do Procurador-Geral da República no sentido de que a decisão só procuza efeitos ex-nunc. O que me comanda a fazê-lo é, sobretudo, o princípio da segurança jurídica, uma vez que em pelo menos três precedentes, um deles já com a presença de boa parte da atual composição, esta Corte decidiu que a Constituição Federal não autoriza a perda de mandato do eleito que pratica infidelidade partidária ou se desfilia do partido pelo qual foi eleito.

(STF – MS 26604, Trecho do voto do Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, DJe-187 03-10-2008)

O ministro Celso de Mello foi categórico na redação da ementa do MS 26.603, julgado em conjunto com o MS 26.602 e MS 26.604:

REVISÃO JURISPRUDENCIAL E SEGURANÇA JURÍDICA: A INDICAÇÃO DE MARCO TEMPORAL DEFINIDOR DO MOMENTO INICIAL DE EFICÁCIA DA NOVA ORIENTAÇÃO PRETORIANA. – (…) Os postulados da segurança jurídica e da proteção da confiança, enquanto expressões do Estado Democrático de Direito, mostram-se impregnados de elevado conteúdo ético, social e jurídico, projetando-se sobre as relações jurídicas, inclusive as de direito público, sempre que se registre alteração substancial de diretrizes hermenêuticas, impondo-se à observância de qualquer dos Poderes do Estado e, desse modo, permitindo preservar situações já consolidadas no passado e anteriores aos marcos temporais definidos pelo próprio Tribunal. Doutrina. Precedentes. (…)
(STF – MS 26603, Relator:  Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 04/10/2007, DJe-241 19-12-2008)

Ao decidir monocraticamente uma ação cautelar, o ministro Gilmar Mendes asseverou a necessidade especial de observância da segurança jurídica em matéria eleitoral:

O quadro fático apresentado nestes autos está a revelar uma séria questão constitucional que envolve um princípio muito caro no Estado de Direito que é a segurança jurídica. Parece extremamente plausível considerar, tal como fez o autor, que mudanças jurisprudenciais ocorridas uma vez encerrado o pleito eleitoral não devam retroagir para atingir aqueles que dele participaram de forma regular (conforme a interpretação jurisprudencial das normas eleitorais vigentes à época do registro de sua candidatura) e nele se sagraram vitoriosos.

(STF – AC 2788-MC, Relator:  Min. GILMAR MENDES, decisão monocrática, ainda pendente de publicação em 03/03/2011)

Em outro julgamento, também em processo de natureza subjetiva, mas não em matéria eleitoral, o Tribunal acolheu o voto do ministro Ayres Britto para conceder efeitos prospectivos à alteração da jurisprudência em matéria de conflito de competência, de forma a preservar os atos praticados por autoridade que se passou a entender incompetente:

 

O Supremo Tribunal Federal, guardião-mor da Constituição Republicana, pode e deve, em prol da segurança jurídica, atribuir eficácia prospectiva às suas decisões, com a delimitação precisa dos respectivos efeitos, toda vez que proceder a revisões de jurisprudência definidora de competência ex ratione materiae. O escopo é preservar os jurisdicionados de alterações jurisprudenciais que ocorram sem mudança formal do Magno Texto. (STF – CC 7204, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 29/06/2005, DJ 09-12-2005)

Note-se bem que o ministro Ayres Britto assevera que o Tribunal não apenas pode, mas deve respeitar a força dos precedentes contra a evolução jurisprudencial, como aplicação do princípio da segurança jurídica.

Ao se afirmar, genericamente, a necessidade de respeito à segurança jurídica, sequer é imprescindível o enfrentamento de controverso tema sobre a incidência do artigo 16 da Constituição da República contra a evolução jurisprudencial, e não apenas contra lei formal. Bastaria a aplicação em abstrato do princípio da segurança jurídica, positivado na Constituição por artigo 5° XXXVI, e reinante sobre todo o ordenamento jurídico, para concluir ser necessário a aplicação prospectiva da nova interpretação constitucional, de forma a não repercutir nos mandatos conquistados em eleições ocorridas em data anterior à decisão.

Mas, enfrentando a questão do artigo 16 da Constituição, deve-se primeiro compreender a leitura feita pelo Supremo Tribunal Federal do texto constitucional, a compreendê-lo não em seu literalidade, mas em sua essência. Tanto é assim que no julgamento da ADI 3.685 (Rel. Min. Ellen Gracie, julgado em 22/03/2006, DJ 18-08-2006), este eg. Tribunal assentou que o termo “lei” constante do texto da Constituição não deveria ser considerado de forma stricto sensu, mas de forma mais ampla, a apanhar inclusive o Poder Reforma, que naquele caso promulgou a EC 52/06.

Ainda antes de enfrentar o tema, vale citar Carlos Cóssio, para quem “As mudanças de interpretação assemelham-se à substituição das leis” (COSSIO, Carlos apud COELHO, Inocêncio Mártires. Da hermenêutica filosófica à hermenêutica jurídica: fragmentos. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 157).


Ora, se de fato a evolução da jurisprudência, ainda mesmo sem alteração do texto legal ou constitucional, como ocorreu no caso do MS 29.988, se assemelha à lei, seria o caso de se invocar o disposto no artigo 16 da Constituição. Como afirmado, o tema é controvertido, mas conta com manifestações de eminentes ministros de hoje e de sempre deste egrégio Supremo Tribunal Federal, inclusive da sua atual composição.

No julgamento da ADI 2.626, o Supremo Tribunal Federal não conheceu da ação porque a norma impugnada era meramente regulamentar, não se tratando de ato normativo primário. Buscava-se a declaração de inconstitucionalidade da Resolução TSE 20.993/02, que implantou pela primeira vez a denominada verticalização para a formação das coligações. Pois bem, apesar de ao final não se ter conhecido da ação, alguns dos ministros expressaram voto sobre o mérito da questão, inclusive quanto a alegada incidência do artigo 16 da Constituição sobre a evolução jurisprudencial. Foi o caso do ministro Sepúlveda Pertence, hoje aposentado:

(…) por força do art. 16 da Constituição, inovação salutar inspirada na preocupação da qualificada estabilidade e lealdade do devido processo eleitoral: nele a preocupação é especialmente de evitar que se mudem as regras do jogo que já começou, como era freqüente, com os sucessivos ‘casuísmos’, no regime autoritário.

A norma constitucional – malgrado dirigida ao legislador – contém princípio que deve levar a Justiça Eleitoral a moderar eventuais impulsos de viradas jurisprudenciais súbitas, no ano eleitoral, acerca de regras legais de densas implicações na estratégia para o pleito das forças partidárias. (STF – ADI 2626, Trecho do voto do Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, DJ 05-03-2004)

Ainda sobre a incidência do artigo 16 da Constituição contra a evolução na interpretação feita por Tribunal foi contundente a manifestação do ministro Marco Aurélio:

Ora, se a Carta da República, mediante o preceito do artigo 16, impõe, quanto à lei em sentido formal e material, a anterioridade de um ano, o que dirá relativamente a algo que tenha força de lei […] quanto a um ato do próprio Tribunal Superior Eleitoral. (STF – ADI 2626, Trecho do voto do Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, DJ 05-03-2004)

No campo acadêmico, em sua doutrina, o ministro Gilmar Mendes também assevera que o artigo 16 da Constituição deva incidir inclusive contra órgãos do Poder Judiciário, e não apenas contra o Poder Legislativo ou o Poder de Reforma:

Assim, afigura-se imperativo que o processo eleitoral seja posto a salvo de alterações por parte do legislador ou mesmo da Justiça Eleitoral, devendo qualquer alteração, para afetar eleições vindouras, ser introduzida em período anterior a um ano do prélio eleitoral. (MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 2010, 5ª ed, pp. 926-927)

A jurisprudência não pode permanecer estanque. E é assim porque a lei não tem vida própria senão pelas mãos e arte do intérprete. Mas é dever o respeito aos fatos ocorridos sob a égide de entendimento anterior, não se podendo alterar as regras após já iniciado o processo eleitoral, máxime após findo este. Mas foi exatamente o que ocorreu no caso do MS 29.988 que, julgado apenas em 09/12/2010, se referia ao preenchimento de vaga conquistada nas Eleições 2006. E também não pode prevalecer esta novel interpretação para os mandatos obtidos nas Eleições 2010, porque já havidas as convenções partidárias e, especialmente, as próprias eleições.

No caso do MS 29.988, seria a hipótese de se indeferir a medida liminar, e se fosse julgado o mérito, denegar a segurança. Todavia, a segurança seria denegada exatamente por razões de segurança jurídica, porquanto de logo se assentaria, ainda que em obiter dictum, a nova interpretação constitucional. Com isso, todos teriam conhecimento da evolução interpretativa. E já para as próximas eleições, no caso as Eleições 2012, seriam formadas as coligações tendo presentes as suas conseqüências e riscos. E dentre estes riscos, previamente conhecidos pelos partidos, estaria o das vagas conquistadas pela coligação serem monopolizadas por um único partido, ficando os demais partidos coligados, ou alguns deles, excluídos de qualquer lista de suplência. Mas isso só seria legítimo se fosse a nova interpretação constitucional previamente conhecida pelos partidos.

Ora, quando a mudança na interpretação da lei ocorrer a menos de um ano para as eleições, deve-se evitar o fator surpresa, recomendando-se técnica semelhante ao prospective overruling, do sistema judicial estadunidense do Common Law. Registra-se a nova leitura da norma, mas se aplica àquele processo eleitoral a força dos precedentes e dos costumes. No nosso Direito, isso decorre do princípio da proteção à confiança, de origem no direito alemão (Vertrauensschutz), ou mais propriamente da própria segurança jurídica.

Por certo, não se pode levar ao extremo a aplicação dos princípios da segurança jurídica e da proteção à confiança, devendo-se sempre observar a boa-fé. Leia-se a propósito do tema a doutrina de Di Pietro:

Na realidade, o princípio da proteção à confiança leva em conta a boa-fé do cidadão, que acredita e espera que os atos praticados pelo Poder Público sejam lícitos e, nessa qualidade, serão mantidos e respeitados pela própria Administração e por terceiros. (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 86)

No caso em discussão, porém, todos os partidos e candidatos que disputaram as Eleições 2010 tinham convicção de que as listas de suplência das eleições proporcionais seriam feitas a partir das coligações, e não considerados separadamente os partidos coligados. Assim, confiaram na Administração Pública, na interpretação constitucional e legal até então presente, quando resolveram formar as suas coligações e indicar os candidatos dentro dos limites permitidos para cada coligação. Àquela oportunidade, antes do julgamento do MS 29.988, acreditavam que as regras do jogo seriam mantidas as mesmas que orientaram as Eleições 2006, e especialmente as Eleições 2008, que já ocorreu após a evolução jurisprudencial sobre a fidelidade partidária. É dever proteger a confiança. É dever garantir a proteção à confiança, como resultado da segurança jurídica.

A própria Justiça Eleitoral, bem percebendo a necessidade de garantir a segurança jurídica, já registra em seus precedentes a aplicação de técnica semelhante ao prospective overruling:

RECURSO ESPECIAL. PLACA COM DIMENSÃO SUPERIOR A 4M². COMITÊ DO CANDIDATO. JURISPRUDÊNCIA FIRMADA APENAS PARA O PLEITO DE 2006. – O posicionamento que prevaleceu neste Tribunal nas eleições de 2006 autoriza a fixação de placa com dimensão superior a quatro metros quadrados em comitê de candidato. – Recomenda-se não haver alteração do posicionamento jurisprudencial em relação à mesma eleição. Entendimento, contudo, que se revê, para aplicação futura, de modo a que não seja admitida a fixação, em comitê de candidato, de placa com dimensão superior a quatro metros quadrados. – Recurso especial provido. (TSE – REspe 27696/SP – Rel. Min. Marcelo Ribeiro – DJ 01.02.2008, p. 36)

 

IV – CONCLUSÃO

No caso da discussão sobre a ordem de suplência, a se observar a segurança jurídica, o Supremo Tribunal Federal deveria ratificar a posição de mérito adotada no MS 29.988 em obter dictum, mas negar o direito àqueles eleitos em 2010. Ao assim decidir, o Tribunal apenas sinalizará a evolução da interpretação constitucional, sem aplicá-la para fatos pretéritos. Ou seja, o novo entendimento não valerá para a posse de suplentes da presente Legislatura, cuja as eleições já haviam ocorrido ao tempo do julgamento paradigma da evolução jurisprudencial. Dever-se-á preservar os resultados das eleições que tenham ocorrido antes de 09/12/2010, como no caso da atual Legislatura. Mas o Tribunal assentará aos partidos e pretensos candidatos às próximas eleições, as Eleições 2012, que haverá substancial mudança nas regras do sistema proporcional, em que se formarão listas de suplentes por partido, ainda para aqueles partidos que tenham disputado as eleições em regime de coligação.

É que todas as regras do jogo eleitoral são observadas ao tempo das convenções, com a escolha dos candidatos, e formação das coligações. Na verdade, é recomendável que a evolução jurisprudencial que diga respeito ao regime de coligações, e as suas conseqüências jurídicas, só produza efeitos para as eleições cujas convenções partidárias eleitorais ainda não tenham ocorrido.

As circunstâncias de segurança jurídica devem ser sopesadas nestes casos. Tudo recomenda que o Supremo Tribunal Federal reafirme a tese segundo a qual os mandatos pertencem aos partidos políticos, e não às coligações partidárias, mas proceda a uma modulação dos efeitos dessa nova interpretação constitucional, quer pela aplicação do princípio da segurança jurídica em geral, quer pela aplicação do artigo 16 da Constituição da República, específico para as matérias eleitorais.

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