Nomeação e posse

Para Defensoria, vínculo com a OAB é desnecessário

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20 de maio de 2011, 12h30

Tema ácido, a recente decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo reconhecendo a possibilidade de um defensor público exercer sua atividade mesmo desligado da Ordem dos Advogados do Brasil dividiu opiniões quanto a seus efeitos a partir de agora. Para a Associação Paulista dos Defensores Públicos (Apadep), é um precedente. Para a seccional paulista da OAB, o entendimento foi incidental em ação que tratava de outro assunto, e a Justiça estadual não tinha competência para julgar a alegação.

Na ação, um advogado de Araçatuba (SP) pedia ao tribunal que declarasse nula a atuação do defensor, pelo fato de ele estar desvinculado da OAB. Os desembargadores da 5ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP fizeram justamente o contrário. Amparando-se na Lei Complementar 132, de 2009, que modificou a Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública, concordaram, seguindo voto do relator Fabio Tabosa, que “a capacidade postulatória do defensor público decorre exclusivamente de sua nomeação e posse em cargo público”.

Em nota, a Defensoria Pública de São Paulo reforça o argumento usado pelo desembargador: "A decisão é um precedente importante, pois reconhece o respaldo legal decorrente da Lei Complementar 132 de 2009 que, ao alterar a Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública (Lei Complementar 80 de 1994), prevê que a capacidade postulatória do defensor público decorre exclusivamente de sua nomeação e posse no cargo público". A nota é assinada por Davi Depiné, 1º subdefensor público-geral do estado. 

A decisão unânime foi comemorada por Rafael Vernaschi, presidente da Apadep. “O entendimento vai ao encontro da autonomia administrativa da Defensoria Pública prevista pela Constituição Federal”, diz. Desde a promulgação da lei, cerca de 80 dos 500 defensores já se desligaram da OAB-SP. Eles alegam, dentro outros argumentos, que a vinculação não é essencial para o exercício da carreira. Já para a Ordem, a inscrição é requisito para tomar posse no cargo, e a baixa pode ensejar exercício ilegal da profissão.

Segundo Vernaschi, a própria Constituição Federal faz a diferenciação entre o advogado particular e o defensor público. Ele conta que os os artigos 133 e 134 prevêem, em paralelo, a Advocacia e a Defensoria Pública como instituições essenciais à Justiça, não atrelando o exercício da segunda à habilitação para o exercício da primeira.

Mesmo assim, a OAB fiscaliza o trabalho dos profissionais da Advocacia-Geral da União, das procuradorias-gerais dos estados e dos municípios e da Defensoria Pública — todos considerados advogados de fato. “Nosso descredenciamento”, explica, “não tem relação com a anuidade paga à Ordem”. Cada associado paga cerca de R$ 800 por ano, o que rende R$ 400 milhões anuais à entidade.

Em março deste ano, o presidente da OAB-SP, Luiz Flávio Borges D’Urso, encaminhou denúncia ao Ministério Público pedindo exoneração do grupo e declarou a intenção de entrar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a Lei Complementar. Com a decisão do TJ-SP, segundo o vice-presidente da seccional, Marcos da Costa, a ADI será analisada pelo Conselho Federal da Ordem. Para ele, a questão deveria ter sido julgada pela Justiça Federal, e não pela Justiça estadual.

“O argumento dos defensores desligados não faz sentido, porque para tomar posse, o profissional precisa do registro na OAB”, diz. Ele também afasta as alegações de que a OAB estaria empenhada na causa em decorrência de questões financeiras. “Nós temos 300 mil advogados no país”, responde.

A questão já foi tratada pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, com sede em São Paulo. Na ocasião, o órgão negou liminar em que a Associação dos Defensores Públicos de Mato Grosso do Sul pedia que seus associados fossem dispensados da inscrição. A decisão da desembargadora Alda Basto tomou como base o Estatuto da Advocacia e da OAB.

A Lei Complementar estabelece que “exercem atividade de advocacia, sujeitando-se ao regime desta lei, além do regime próprio a que se subordinem, os integrantes da Advocacia-Geral da União, da Procuradoria da Fazenda Nacional, da Defensoria Pública e das Procuradorias e Consultorias Jurídicas dos Estados, do Distrito Federal, dos municípios e das respectivas entidades de administração indireta e fundacional”.

A decisão da Justiça estadual sobre o assunto aborda o mesmo estatuto. O acórdão reconhece que, após a LC 132, ficaram superadas as previsões do parágrafo 1º do artigo 3º, e do artigo 4º do Estatuto da Advocacia — a Lei Federal 8.906/1994 —, segundo os quais os defensores públicos exercem atividade de advocacia e, por isso, se sujeitam ao regime da norma. “São nulos os atos privativos de advogado praticados por pessoa não inscrita na OAB, sem prejuízo das sanções civis, penais e administrativas”, diz o texto legal.

Segundo o juiz Ricardo Nascimento, vice-presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), a decisão do TJ-SP se deu de forma incidental, e a última palavra sobre o desligamento ou não dos defensores compete à Justiça Federal. “Desconheço essa decisão e estranho, porque o TRF-3 decidiu o contrário. O que eu sei é que é pressuposto que todo defensor público seja inscrito na ordem”, explica.

Na decisão do TJ-SP, o desembargador Fábio Tabosa entendeu que a investidura do defensor pressupõe a qualificação de bacharel em Direito e a verificação da aptidão pessoal em concurso público específico, o que é o suficiente para qualificá-lo.

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