Reforço na atuação

MP-SP deve usar dados para pensar estratégias

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13 de maio de 2011, 20h53

Em artigo publicado nessa quinta-feira na ConJur, o professor Luis Flávio Gomes criticou a atuação do Ministério de São Paulo depois de considerar dados do relatório divulgado pelo órgão, com a atuação entre 2004 a 2009. A divulgação é inédita e, segundo LFG, mostra que “a grande criminalidade não faz parte das preocupações dos MPs estaduais, que, servos do inquérito policial, não conseguem superar a seletividade da Polícia Civil e Militar contra os crimes dos miseráveis”.

No relatório consta que, no âmbito criminal, o MP-SP ofereceu 1.047.525 denúncias e arquivou 1.169.940 inquéritos policiais no período. “O número exagerado de arquivamentos mostra a baixa qualidade informativa e investigativa da Polícia, cuja crise se agrava a cada dia (por falta de estrutura, baixos salários, corrupção etc.)”, diz LFG.

No documento é informado que o delito mais denunciado foi o furto (177.454), seguido por roubo (113.413), tráfico de entorpecentes (95.932), arma (57.417), estelionato (43.996), uso de entorpecentes (38.636), homicídios dolosos (26.309), estupro (19.214) e outros (12.645).

Renato Campos Pinto de Vitto, defensor público que atua no 1º Tribunal do Júri de São Paulo e é coordenador da comissão de Justiça e Segurança do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), concorda com LFG. "Os números não são motivos de orgulho ao MP-SP enquanto órgão acusatório.”

Apesar de reconhecer o valor da divulgação do relatório, na medida em que concretiza a transparência e publicidade das instituições públicas, ele acredita que os dados mostram que há um foco na apuração dos delitos como roubo e furto “em detrimento de um trabalho mais abrangente de apuração de crimes contra a ordem econômica". Estes tipos de crime, diz, não envolvem "o usuário do banco dos réus, que tem sido o pobre”.

Ele considera que o fato do percentual de inquéritos arquivados quase alcançar o de denúncias “indica claramente a pouca valia da investigação feita pela Polícia”. Para ele, isso significa que o MP-SP deveria dar ênfase em sua atuação constitucional de controle externo daquele órgão. “Essa atribuição não é levada como prioridade da atuação, e tem efeito preventivo mais do que repressivo”.

Apesar de admitir não ter dados estatísticos, o defensor arriscou que 70 a 80% das denúncias oferecidas se originam de autos de prisão em flagrante, nos quais a ocorrência cai no "colo" da Polícia. "Não há propriamente trabalho de inteligência e investigação.”

O defensor observa que mesmo os números relativos à atuação do órgão quanto aos crimes de roubo e furto são muito aquém da incidência penal. Segundo ele, em 2009 houve 529 mil ocorrências de furto e 257 mil de roubo, e o MP-SP denunciou, respectivamente, 28 e 21 mil casos.

Para ele, os dados reforçam a ideia de que a intervenção do MP na violência é simbólica. “A atuação não traz resposta ao fenômeno da criminalidade nem muda a segurança pública”, acredita.

Culpa
O promotor de Justiça em Minas Gerais, Andre Luis Melo, chama atenção para a “iniciativa louvável” do órgão de mostrar dados. “É uma revolução e permite pensar estratégias”, considera. Quanto às soluções para a realidade apresentada, ele chama a atenção para o fato de que, no sistema brasileiro, ainda prevalece, embora não na letra da lei, o mito da "obrigatoriedade da ação penal".

“Se a sociedade procura a Polícia e registra boletins sobre o furto, o Ministério Público e os policiais irão, obrigatoriamente, atuar mais em furtos, os quais são mais simples de provar e geralmente cometidos por pessoas com menos estudo”, constata.

Além de discutir a “obrigatoriedade da ação penal”, o promotor sugere que pequenos furtos passem a ser julgados em ação penal pública concidionada. Contudo, reconhece que a ideia tende a não ser bem aceita. “Para a sociedade, o patrimônio é mais sagrado que a integridade corporal, tanto que lesão corporal leve e estupro são ação penais condicionadas e não gera espanto social. Já falar em ação penal pública condicionada para pequenos furtos é considerado um absurdo.”

O promotor também deixa claro que, se há culpa pelo que o relatório aponta, ela não deve ser creditada apenas ao MP. “O próprio Judiciário dificulta o combate aos crimes mais complexos, pois exige uma prova prévia para se justificar uma ação penal, por exemplo, em crime financeiro e eventual quebra de sigilo ou escuta”, diz.

Atuação diversificada
O procurador-geral de Justiça do MP-SP, Fernando Grella Vieira, afirma que o órgão não está preocupado apenas em punir autores de furtos e roubos. Tanto que,  para aumentar a efetividade no combate aos chamados crimes de colarinho branco, o MP-SP criou, em 2008, o Grupo Especial de Combate aos Delitos Econômicos (Gedec).

“Além disso, nos últimos anos, reformou o Grupo de Atuação de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), instalou o Laboratório de Lavagem de Dinheiro e o Laboratório de Combate a Cartéis, mediante convênio com o Ministério da Justiça, e neste semestre, pôs em operação o Sistema de Investigação de Movimentações Bancárias (SIMBA), que facilita e agiliza a obtenção e análise dos dados oriundos da quebra do sigilo bancário de suspeitos de envolvimento em crimes”, explicou.

Ele também apresentou dados: “entre 1992 e 2009, a Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e social ajuizou 764 ações de improbidade administrativa, nas quais questiona a recuperação de mais de R$ 34 bilhões. Os promotores que atuam nessa área já obtiveram o bloqueio judicial de quase R$ 6 bilhões para o ressarcimento dos cofres públicos lesados”.

Nesse sentido, lembra, com base no Relatório do Cadastro Nacional de Condenações Cíveis por Ato de Improbidade Administrativa do Conselho Nacional de Justiça, que o MP-SP é a instituição com maior número de condenações obtidas em ações por improbidade administrativa no Brasil na medida em que já obteve 1.301 condenações, ou seja, 42,3% das 3.075 condenações já transitadas em julgado no país.

O procurador informou que com a implantação do módulo criminal do sistema informatizado integrado (SIS MP Integrado), no futuro, o órgão “terá dados consolidados com o detalhamento do combate a todos os tipos de crime, o que certamente contribuirá para mudar a percepção equivocada do colunista”.

Esforço contínuo
Foi adiado para o dia 31 de maio o prazo para os membros do Ministério Público responderem aos questionários do II Diagnóstico do órgão. O estudo, feito pela Secretaria de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça, Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) e  outras entidades representativas do MP, vai colher informações sobre a estrutura organizacional, orçamentária, financeira, material e de recursos humanos e sobre o perfil dos membros.

Além de mostrar a realidade nacional do órgão, o levantamento reunirá informações que serão essenciais para a construção de novas alternativas de atuação e fortalecimento do órgão. Os promotores e procuradores que quiserem participar do diagnóstico devem acessar o site https://www.inbrape.com.br/diagnosticomp/Inicial.aspx.  

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