Os livros do advogado e professor Jacintho Câmara
30 de junho de 2011, 12h19
"Sem preconceitos. O que gosto leio, o que não gosto não leio." O advogado Jacintho Arruda Câmara, professor de Direito Administrativo da PUC-SP e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Direito Público, valoriza mesmo é um bom texto que conte uma boa história de jeito original. Não tem problemas em dizer que já leu best-seller para os quais muitos leitores jurídicos fazem cara feia, e conta que hoje em dia é atraído por personagens com vida interior rica, algo que o aborrecia quando jovem, e queria "algo mais pra fora do que pra dentro".
Dentre todos os estilos que leu e lê, Câmara gosta de biografias jornalísticas. Cita Minha Razão de Viver, de Samuel Wainer, Cobras Criadas, de Luiz Macklouf Carvalho, e Irmãos Karamabloch, de Arnaldo Bloch. A preferida é O Anjo Pornográfico, de Ruy Castro, sobre Nelson Rodrigues. "Todo biógrafo tem que mentir um pouco", reconhece. Segundo ele, o fato de o pai ser jornalista só influenciou por dar acesso a essas obras.
Jornalismo à parte, quem o fez "ter gosto" pela literatura foi Graciliano Ramos. De toda obra do alagoano, que o advogado leu quase por completo, a que mais o toca é Angústia. "Apesar do texto ser pesado, e tratar de sentimentos densos, o livro me pegou pela forma, que acho sensacional, especialmente pelos períodos curtíssimos. Eu já estava com certa ambição de começar a escrever e pensei que se pudesse escolher um jeito de fazê-lo seria esse", contou.
Dos romances, o advogado lembra do húngaro Sándor Márai, "um grande romancista, daqueles autores que gostam de pesquisar a alma humana". As Brasas é o seu preferido. O livro conta a história de um triângulo amoroso entre dois grandes amigos e a mulher de um deles, na época da recessão em Budapeste.
De Márai o professor também já leu Divórcio em Buda e Veredicto em Canudos. O primeiro é a história de um juiz húngaro que se separa da mulher, e o segundo foi inspirado em Os Sertões, de Euclides da Cunha.
Câmara também cita o português Gonçalo Tavares, de quem leu Jerusalém. O advogado se espantou pela pouca idade do autor (41 anos) e achou interessante uma entrevista em que o autor disse ter passado dos 20 aos 30 anos escrevendo por prever que quando publicasse sua obra teria que divulgá-la e por isso seria impedido de escrever mais.
Dos livros históricos o advogado recomenda Império à Deriva, do australiano Patrick Wilcken. O livro foi fonte de 1808, de Laurentino Gomes, e também conta a vinda da família real portuguesa ao Brasil. O advogado leu os dois, mas prefere o livro de Wilcken por ter buscado as "fontes primárias".
De sua terra natal, o potiguar lembra de Câmara Cascudo. Civilização e Cultura o surpreendeu ao encontrar no folclorista "um rigor científico preciso, com conceitos semióticos e epistemológicos muito sofisticados, que normalmente não são apresentados".
Do Rio Grande do Norte, outro escritor que o marcou, agora no campo jurídico, foi Seabra Fagundes. Câmara conta que leu O Controle dos Atos Administrativos pelo Poder Judiciário no último ano da faculdade, e ficou impressionado e influenciado para seguir a área do Direito Público. Só no mestrado se deparou com o tamanho do jurista.
Atualmente, o professor está lendo três obras: 2.666, do chileno Roberto Bolaño, Os Irmãos Karamabloch, de Arnaldo Bloch, e O primeiro ano — como se faz um advogado, de Scott Turow. Este último livro conta as angústias de um estudante de Harvard, e os métodos de ensino.
Quanto aos best-sellers, o advogado não destaca nenhum por hoje não saber mais diferenciá-los. "São muito bem escritos, mas também muito parecidos. Qualquer um da prateleira é agradável, é como ler uma revista, se tiver um por mês dá pra ler", diz.
Formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, o advogado se mudou para São Paulo para cursar o mestrado na PUC-SP em 1995, e dois anos depois já começou a dar aulas na instituição. É autor de Obrigações do Estado Derivadas de Contratos Inválidos e Tarifas nas Concessões, respectivamente dissertação de mestrado e tese de doutorado.
Primeiros anos
Recomendo
Jurídico
Na área jurídica, a dica é Elementos de Direito Administrativo, de Celso Antonio Bandeira de Melo. Ele conta que leu a obra por acaso, quando ainda estava na faculdade, no Rio Grande do Norte, e ainda não tinha a menor ideia de quem seu futuro orientador era. "Achei muito diferente do que havia lido. Foi o embrião do atual Curso de Direito Administrativo. Prefiro porque é mais enxuto e elaborado", explica.
O professor conta que gostaria de ter lido no primeiro ano de faculdade Os Grandes Sistemas de Direito Contemporâneo, de René David. Segundo ele, a obra explica de maneira muito geral como funciona o Direito no sistema europeu e no anglo-saxão. "Dá para ler como se fosse um romance. É uma leitura que ajuda a compreender o Direito. O papel de uma sentença, de uma lei. Encontrar literatura jurídica para quem ingressa na faculdade é um problema. Os livros de introdução são sofisticadíssimos, herméticos, difíceis de ler. Bons para quem começa uma pós-graduação", explica.
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