Dinamismo trabalhista

Mudança jurisprudencial do TST deixa dúvida

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18 de junho de 2011, 10h11

O contrato de trabalho conta com duas obrigações principais, não obstante a existência de obrigações acessórias. Uma primeira obrigação principal, que tem como devedor o empregado e credor o empregador, corresponde à prestação de serviços (obrigação de fazer), ao passo que outra espécie da referida modalidade de obrigações, a qual tem como devedor o empregador e credor o empregado, corresponde ao pagamento da contraprestação pelo serviço prestado (obrigação de dar), se relacionando ao conceito de remuneração.

Porém, na realidade, remuneração consiste em gênero que abrange várias espécies. Remuneração trata-se de toda e qualquer vantagem de conteúdo econômico recebida pelo empregado em função do contrato de trabalho. Já o salário, espécie do gênero remuneração, consiste na retribuição pactuada em função do serviço prestado, de modo que uma das principais características do salário corresponde à sua contraprestatividade.

Por outro lado, as vantagens remuneratórias podem ser classificadas em contraprestativas, compensatórias ou gratuitas. As contraprestativas contam com natureza salarial, ao passo que as compensatórias contam com natureza indenizatória e as gratuitas com natureza de liberalidade.

Não obstante a irredutibilidade do salário, prevista no artigo 7º, inciso VI da Constituição Federal, o fato é que dentre as vantagens salariais, excluído deste universo o salário contratualmente estabelecido, há como regra uma relação de causa e efeito. Ou seja, geralmente as vantagens salariais sujeitam-se a uma lógica de causalidade, de modo que cessada a causa, cessa a obrigação de pagamento.

Alguns exemplos de vantagens salariais sujeitas a esta lógica causal: adicional noturno (Súmula 265); adicional de insalubridade (Súmula 248); diárias que assumem natureza salarial (Súmula 101).

Porém, apesar da referida regra, existem duas modalidades de exceções, uma de caráter mais puro e outra de caráter mais híbrido.

A exceção pura ocorre no caso da percepção da gratificação de gerência por mais de 10 anos, sem que o empregado tenha dado causa à perda da função. Apesar da legitimidade da supressão da função, nos termos do artigo 468, parágrafo único da CLT, diante da mencionada circunstância, conforme a tese da Súmula 372 do Tribunal Superior do Trabalho, incorpora-se a gratificação ao patrimônio jurídico-contratual do empregado.

Já a exceção atípica ou híbrida envolve a realização de horas extras por mais de um ano, objeto da tese da Súmula 291 do TST, alterada recentemente. No caso, firmou-se o entendimento de que, se o empregado recebe horas extras por mais de um ano, a supressão garante o direito à indenização.

Repare que é bem verdade que há alguma influencia da lógica causal, no sentido da perda do direito ante a cessação da causa. Porém, há uma compensação em favor do empregado.

Ou seja, definitivamente, não há direito à incorporação de horas extras. Porém, a supressão de horas extras garante alguma compensação.

É preciso que se entenda que o fundamento da referida tese, que rejeita a lógica da preservação da estabilidade econômica na forma contemplada na Súmula 372 do TST, foi no sentido de evitar a consolidação da extrapolação de jornada. Isto é, o ordenamento jurídico vê nas horas extras uma exceção aceitável, mas indesejável. Incorporar horas extras significaria dar um recado ao empregador, no sentido de que há uma nova jornada, acima da prevista constitucionalmente.

Cabe ainda esclarecer que a indenização para ser calculada conta com os seguintes parâmetros e operações: (1) havendo mais de um ano de recebimento de horas extras, apura-se o quantitativo de anos, sendo que se considera como um ano a fração igual ou superior a seis meses; (2) calcula-se a média mensal de horas extras realizadas no último ano; (3) para cada ano ou fração de ano apurados de horas extras realizadas, considera-se uma média do último ano, devendo ser realizada a soma das referidas médias; (4) multiplica-se o resultado desta operação (que revela um quantitativo de horas extras) pelo salário-hora do momento da supressão.

Apesar deste panorama, recentemente a Súmula 291 foi alterada em perspectiva ampliativa em favor do empregado. Tal alteração adotou o entendimento de que, mesmo no caso de supressão parcial, aplica-se a mencionada lógica de direito à indenização. Ou seja, se o empregador suprime parte das horas extras, respeitadas as condições temporais da redação anterior da Súmula 291, garante-se a indenização.

Desta forma, torna-se indiferente se a supressão é total ou parcial, de modo que sempre o empregado terá direito a ser indenizado.

Esta mudança revela o dinamismo do Direito do Trabalho e da jurisprudência. A dúvida fica quanto à aplicação da tese no tempo, vez que mudança jurisprudencial não se confunde com alteração legislativa, o que pode levar inclusive a um estado de insegurança jurídica. Daí porque é fundamental a veiculação da mudança ao universo mais amplo possível de profissionais do direito, de modo a garantir a devida orientação jurídica aos empregadores, inclusive para evitar possíveis litígios judiciais

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