Livro aberto

Os livros do advogado e professor Roberto Dias

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15 de junho de 2011, 16h09

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Caricatura Roberto Dias - coordenador de Direito da PUC-SP - Spacca

"Sempre fui atrás de autores com um diferencial estético. Uma literatura com mais intensidade, transgressora." Sem medo de se comover ou até se atordoar, o advogado, professor de Direito Constitucional, e atual coordenador do curso de Direito da PUC-SP, Roberto Baptista Dias da Silva reconhece em suas leituras uma ajuda para formar sua visão do Direito: com olhos de liberdade.

Atraído pela estética, menos tradicional possível, ele fala de José Saramago, e de um "lugar comum incomum" que o apaixonou. "Grande Sertão: Veredas foi o único livro em que chorei ao final. Faltavam 40 páginas, eu estava na Bahia e chorava não sabia se pela história ou porque ela estava acabando."

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Grande Sertão Veredas de Guimaraes Rosa - ConJurDurante um tempo, respondia que seu "Top 3" era O Evangelho Segundo Jesus Cristo, de José Saramago; Os cadernos de Dom Rigoberto, de Mario Vargas Llosa; e Grande Sertão, de Guimarães Rosa. "Hoje em dia não sei se isso continua, depois já li muita coisa diferente", e lembra da A Montanha Mágica, de Thomas Mann. Na mesma hora, ele procura o livro na estante e entre marcadores, páginas dobradas, e muitos riscos de lápis sublinhando letras, rapidamente localiza uma passagem em que o autor fala da semelhança entre tempo e espaço, normalmente inconfundíveis. 

Os diversos livros na sala e escritório do advogado são sempre revisitados. Com folhas amareladas, e pedaços de jornais marcando as páginas algumas dobradas, os mais antigos ocupam espaço junto com os novos, com marcadores fluorescentes e sem dobras, que hoje considera uma violência.

Dias não é chegado a biografias, mas gosta de contos, e cita Caio Fernando Abreu. Ele adora poesia. Nesse tipo de literatura a escolha pela transgressão e intensidade é reafirmada:  Fernando Pessoa Hilda Hilst. A estética volta no gosto por Manuel de Barros, quem ele cita: "Há histórias tão verdadeiras que parecem que foram inventadas".

Também pela estética diferente e pela intensidade da leitura, ele fala de Clarice Lispector, e lembra, animado, que Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres começa com uma vírgula.

Para sua tese de doutorado, Uma Visão Constitucional da Eutanásia, o advogado não se intimidou pela difícil definição do conceito de vida e citou o personagem Riobaldo, "o senhor já sabe, viver é etc.". Pensar a vida pela literatura é reconhecer sua imprecisão. "Navegar é preciso, viver não é preciso", escreveu Fernando Pessoa. 

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Os Cadernos de Dom Rigoberto, de Mario Vargas Llosa - ConJur

Também para o trabalho acadêmico Dias superou um "enjoo" dos escritos de Saramago, que durou aproximadamente dez anos, e leu Caim e As Intermitências da Morte. Gostou muito.

O aspecto reflexivo dos textos também o atrai, e personagens complexos como os de Dostoiévski, o interessam. Assim como as obras de Kafka, Dias só foi ler Crime e Castigo quando já integrava o mundo jurídico, mas também reconhece neles uma influência no seu "pensar menos tradicional, e em certo sentido transgressor", do Direito.

Antes de viajar, o professor procura ler autores de seu destino. Cervantes, Kafka, Calvino e Dante foram algumas das escolhas para viagens à Europa. Uma escolha marcante foi John Maxwell Coetzee antes de ir para a África do Sul e Botswana. O trabalho do autor em A vida e a morte de Michael K e O Homem Lento mexeu com Dias.

Dos latinos, Mario Vargas Llosa, com A Festa do Bode, Os Cadernos de Dom Rigoberto. A Guerra do Fim do Mundo é um dos seus favoritos. "Algo mais leve." O gosto pela estética foi agradado com O Jogo da Amarelinha do argentino Julio Cortázar "eu não li corrido, li pulando".


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Cristina Cansada de Guerra, de Jorge Amado - ConJur
Primeiros
Dias começou a tomar gosto pela literatura com Jorge Amado em livros como Capitães de Areia e Mar Morto. "Ele me deu gosto para começar a procurar coisas sozinho, sem que alguém me dissesse ‘leia isso ou aquilo’". A leitura fácil, fluida, com enredo atraente é um possível motivo, diz. Sua avó o proibiu de ler Tereza Batista Cansada de Guerra, de Amado, e o presenteou com O retrato de Dorian Gray. "Li os dois.", lembra. O romance do escritor baiano conta a história de uma jovem obrigada a se prostituir.

Nascido em Três Lagoas (MS), ele é mesmo paulista. Veio para São Paulo com seis meses de idade. Ver o pai lendo constantemente o influenciou a começar. Com a morte paterna, herdou uma coleção de Marcel Proust e de Machado de Assis.


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Jorge Reis Novais, Direitos FundamentaisTrunfos Contra a Maioria - ConJurJurídicos
Das obras jurídicas, Dias lembra de Penas Perdidas, do abolicionista holandês Louk Hulsman. Dos mais recentes, cita a obra do português Jorge Reis Novais, Direitos Fundamentais: Trunfos Contra a Maioria. "São livros que dizem respeito à liberdade, resistência, contrários a esse viés autoritário, opressor, de imposição da maioria."


Recomendo
Os Cadernos de Dom Rigoberto, de Mario Vargas Llosa, e no Direito, O Domínio da Vida, de Ronald Dworkin são as indicações do professor. O motivo é simples e fundamental: "Os dois têm a ver com liberdade."

O Domínio da Vida, de Ronald Dworkin


Outras artes
Incentivado pelos pais, o advogado tocou flauta transversal durante toda a adolescência. O gosto pela música clássica o fez duvidar ao escolher o vestibular de Direito, e hoje admite que infelizmente a prática ficou um pouco de lado. Telemann e Beethoven são os clássicos preferidos, e o saxofonista John Coltrane, a cantora Shirley Horn e o pianista Keith Jarrett na música em geral.

O gosto pela dança moderna que já cultivava na adolescência foi reforçado pelo casamento. Sua mulher também gosta e por um bom tempo praticou dança moderna. Pina Bausch, Deborah Colker, Pilobolus e Alvin Ailey são as indicações de Dias.

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