A caminho da maturidade

Arbitragem no Brasil ainda enfrenta obstáculos

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11 de junho de 2011, 9h36

Há pouco mais de 15 anos regulada em lei, a arbitragem no Brasil mostra sinais da adolescência. Por um lado, grandes avanços como a conquista da credibilidade na Justiça, que via de regra não interfere mais no mérito das questões, mostram maturidade. Por outro, polêmicas em torno do que pode ou não ser submetido a câmaras arbitrais revelam que o modelo ainda precisa de desenvolvimento. A avaliação é de um dos maiores especialistas brasileiros na área, o professor Arnoldo Wald, membro da Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional, e vice-presidente do Comitê Brasileiro no órgão.

Exemplos não faltam. A execução, pelo Judiciário, de medidas cautelares determinadas em decisões arbitrais continua sendo um problema devido à morosidade da Justiça. Regulamentos de tribunais arbitrais também têm passado por constantes atualizações, como o que está em estudo pela Câmara Arbitral da BM&FBovespa, de modo a tornar as regras menos burocráticas. O tempo de duração das arbitragens, se embora comparado com o dos processos judiciais seja ínfimo, já começa a virar motivo de discussão para sua redução.

Em evento organizado pelo Instituto Nacional da Recuperação Empresarial em São Paulo, que começou na quarta-feira (8/6), o professor da Universidade de Paris e da Universidade Estadual do Rio de Janeiro palestrou sobre as questões em que a arbitragem brasileira ainda esbarra. “Uma arbitragem pode dissolver uma sociedade?”, exemplificou.

Segundo ele, embora o Brasil já tenha avançado para a nomeação multidisciplinar de árbitros, com a formação de comissões não só de juristas, mas também de engenheiros e economistas, a fase ainda é de sedimentação. “Em um julgamento, ouvi um árbitro engenheiro dizer que poderia fazer a perícia do contrato em questão, o que dispensaria o perito. Ora, isso não é função do árbitro”, comentou.

Questão que tem dividido especialistas no assunto, não há restrições para o uso do procedimento por sociedades de capital aberto, na opinião de Wald. “Toda questão societária pode ser submetida a arbitragem”, afirma. Há porém quem defenda que a Lei de Arbitragem, a Lei 9.307/1996, exige que a cláusula arbitral nos contratos precisa ser aceita expressamente por todas as partes envolvidas. O entendimento tornaria nulas as possibilidades de arbitragem em companhias listadas em bolsa, já que os compradores de ações teriam de formalizar a aceitação a cada aquisição. “O estatuto é a ‘Constituição’ da companhia. Quem adquire ação adere às suas regras”, contrapõe.

De acordo com o raciocínio, mesmo que uma empresa altere seu estatuto para incluir a obrigatoriedade de resolução de conflitos por arbitragem, os acionistas minoritários não ganham o direito de sair da sociedade e ser ressarcidos pelo fato de não terem concordado com a mudança. “Eles entraram para o bem e para o mal, e estão sujeitos ao futuro da companhia. Ninguém tirou seus direitos”, explica. “A aceitação deve ser expressa, mas pela sociedade, por maioria.”

Discussões de direito societário nas arbitragens têm crescido. Números da CCI apresentados pelo palestrante mostram que o tipo responde por entre 30% e 40% dos casos, e crescem 20% ao ano. Com a maior complexidade dos contratos, hoje envolvendo até mesmo empresas concorrentes em consórcios, sociedades de propósito específico e parcerias público-privadas, a arbitragem é o único meio de atender às demandas em tempo razoável. “O Judiciário dá solução em dez anos, um juiz não pode se debruçar por dois meses sobre um caso complexo, mesmo havendo câmaras especializadas”, compara.

Em casos mais felizes, segundo o professor, os envolvidos chegam ao consenso antes mesmo de a arbitragem começar. “Vi vários acordos serem fechados na véspera da assinatura do termo arbitral, porque as partes já vislumbravam em que direção o julgamento iria”, conta.

Ele também elogiou a crescente participação brasileira nas arbitragens internacionais. Segundo números da CCI, o Brasil é o 4º país em número de casos. O número não inclui os procedimentos instaurados pela Câmara da CCI no Brasil. Decisão recente do Superior Tribunal de Justiça considerou que, mesmo seguindo regras do exterior, as arbitragens feitas pela CCI em território nacional não podem ser consideradas estrangeiras, o que evita que o processo de homologação tenha de ser feito apenas pelo STJ.

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