Psiquê adoentada

Filhos não receberão seguro do pai que se suicidou

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27 de julho de 2011, 10h31

Casos de suicídio geram polêmica no âmbito jurídico, sobretudo desde 2002, com as modificações no Código Civil e a inserção do artigo 798, o qual estipula que o beneficiário do seguro de vida não tem direito ao capital estipulado quando o segurado se suicida nos primeiros dois anos de vigência do contrato. Numa gangorra de decisões judiciais, ora é dada razão ao suicida, ora à seguradora. No caso dos irmãos C, o juiz João Omar Maçura, 24ª Vara Cível de São Paulo, entendeu que os filhos do morto não teriam direito ao dinheiro da apólice e deveriam arcar com os custos do processo, determinados em R$ 500. Cabe recurso.

Os autores entraram com ação exigindo o dinheiro da apólice de seguro de seu pai. Invocaram a legislação consumerista, a jurisprudência dos Tribunais Superiores e pediram a condenação da ré ao pagamento da indenização securitária no valor de R$ 350 mil mais os ônus da sucumbência. Alegaram que o suicídio não foi premeditado, e que o pai sofria de doenças psiquícas. O suicídio aconteceu 16 meses depois de assinada a apólice, isto é, oito meses antes de completar dois anos.

A empresa, representada pelo escritório Arruda Alvim e Thereza Alvim Advocacia, alegou que o segurado omitiu informações sobre seu estado de saúde quando da contratação do seguro, o que lhe retira o direito à cobertura, nos termos dos artigos 765 e 766 do Código Civil (que obriga o segurado a comunicar ao segurador, logo que saiba, todo incidente suscetível de agravar  consideravelmente o risco coberto, sob pena de perder o direito à garantia, se provar que silenciou de má-fé), e afirmou ainda que o suicídio ocorreu a menos de dois anos da contratação do seguro. Por fim, disse que houve premeditação no suicídio.

O que pesou na decisão do juiz foi que "quando da contratação, o segurado omitiu dados importantes sobre seu estado de saúde, não relatando seus distúrbios psíquicos, dos quais sofria desde o início da idade adulta, conforme afirmado na inicial". O juiz sustentou em sentença que, se seguradora exigir de todos os clientes obrigatoriedade em exames prévios, os preços dos seguros seriam inviáveis aos clientes. Por fim, ainda afirmou que "não bastasse isso, tem-se que o seguro foi contratado em 18.10.2006 e o óbito ocorreu em 19.02.2008, de forma a incidir, no caso, a norma do artigo 798 do Código Civil".

Em outro caso, noticiado pela ConJur no mês de maio, a decisão da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, foi a favor da família do suicida, que seguiu entendimento da 2ª Seção, em julgamento em abril, onde ficou definido que a seguradora seria isenta do pagamento apenas se comprovasse que o suicídio cometido nos dois primeiros anos do contrato foi premeditado. Para a ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, "a seguradora em momento algum faz prova ou sequer alega que o suicídio foi premeditado e limita-se a afirmar que a premeditação deveria ser presumida".

Ainda segundo a relatora, ao se tratar de regras contratuais relativas aos seguros, estas devem ser interpretadas sempre com base nos princípios da boa-fé e da lealdade. "Assim, ausente prova da premeditação, não há motivo para exclusão da cobertura oferecida pela seguradora, que deverá indenizar integralmente a família do segurado pelo valor contratado." A ministra foi na contramão da decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que utilizou-se do dispositivo 798 do Código Civil, que prevê prazo de dois anos para que a morte do segurado gera indenização aos benefíciários.

Segundo Andrighi, mesmo com o novo dispositivo legal, continua aplicável a Súmula 61 do STJ (elaborada ainda sob o antigo Código Civil), a qual estabelece que "o seguro de vida cobre o suicídio não premeditado". Ela observou que, até a reforma do Código Civil, havia uma posição praticamente unânime da jurisprudência, no sentido de que a seguradora somente se eximiria do pagamento do seguro se comprovasse a premeditação do suicida — como ficou expresso na Súmula 61.

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