Consultor Jurídico

Santa Catarina debate criação da Defensoria após resolução da OEA

11 de julho de 2011, 9h27

Por Rodrigo Haidar

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Há pouco mais de um mês, em assembléia geral, a Organização dos Estados Americanos (OEA) aprovou resolução que classifica o trabalho dos defensores públicos como “essencial para o fortalecimento do acesso à Justiça e para a consolidação da democracia”. A mais antiga organização transnacional do mundo, que reúne 34 países do continente americano, também recomendou aos seus Estados-membros que adotem medidas para garantir “que os defensores públicos oficiais gozem de independência e autonomia funcional”.

A discussão sobre a autonomia dos defensores caminha a passos curtos no Brasil. Na verdade, em alguns estados, o país ainda debate a criação de um sistema oficial de defesa para os cidadãos que não têm dinheiro para pagar advogados. Santa Catarina é o principal — mas não o único — mau exemplo.

Os estados de Goiás e do Paraná aprovaram recentemente leis que criam suas defensorias públicas, mas ainda não fizeram concursos para tirá-las do papel. Já Santa Catarina sequer previu em lei até hoje a criação da Defensoria Pública.

Para tentar reverter esse quadro, a Associação Nacional dos Defensores Públicos (Anadep) participará, na terça-feira (12/7), de uma audiência pública promovida pela Assembleia Legislativa catarinense sobre a criação da Defensoria Pública no estado. De acordo com o presidente da Anadep, André Castro, não será a primeira audiência pública que a associação participa no estado.

“Já foram feitas diversas audiências na capital e no interior. Há um projeto de lei de iniciativa popular para criar a Defensoria, com mais de 50 mil assinaturas, encaminhado há mais de um ano para a Assembleia Legislativa. Até agora, não há uma sinalização do governo de que isso vá andar”, afirmou ele em entrevista à revista Consultor Jurídico.

Castro critica a manutenção do sistema de atendimento aos carentes por advogados dativos. “Esse sistema deve ser subsidiário, residual. O que assombra é a adoção do modelo como o principal para o atendimento da população”, diz. O defensor afirma que o sistema de advogados dativos é “um absoluto fracasso” e atende apenas a “interesses corporativos”.

De acordo com ele, o modelo é ineficiente e oneroso para o Estado por diversos motivos. Um deles é que os processos podem se alongar mais do que se estivessem nas mãos de defensores. “Que interesse tem um defensor dativo em fazer conciliação se não é remunerado por ela? Que interesse tem em resolver logo o processo se recebe por ato?”, questiona Castro. E ataca: “A assistência jurídica deve atender ao jurisdicionado, não ao advogado”.

O presidente da Anadep ressalta que, da perspectiva legal, Santa Catarina é o único estado que ainda não tem Defensoria. Goiás e Paraná estão atrasados na implantação do órgão, mas ao menos já aprovaram leis para criá-los. “Em Goiás, o concurso para a contratação de defensores públicos foi aberto, mas suspenso pouco depois. Está em vias de ser retomado”, conta o defensor público.

Segundo os números de André Castro, há hoje no país 5.200 defensores públicos. Mas a divisão entre os estados ainda é muito assimétrica. Os estados de Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Roraima e Tocantins tem uma relação razoável entre o número de defensores e o da população. Já em estados como Minas Gerais, Bahia, Amazonas e Rio Grande do Norte essa relação é pequena.

O defensor destaca que a relação entre o número ideal de defensores e a população não leva em conta o total dos habitantes, mas apenas aqueles que podem ser o alvo da Defensoria: maiores de 10 anos de idade que ganham até três salários mínimos por mês. Ou seja, quem tem pouca condição financeira e precisa de justiça.

O número ideal, de acordo com André Castro, é de um defensor para cada 10 mil pessoas desassistidas. Mas a relação pode ser menor, desde que as defensorias públicas sejam mais bem aparelhadas nos estados. “Os defensores carecem em quase todos os estados de estrutura e de um quadro de apoio. Principalmente pessoal de apoio multidisciplinar”, conta.

Segundo o presidente da Anadep, quase 50% dos atendimentos feitos por defensores estão na área de Direito de Família. Atendimentos a crianças e adolescentes também ocupam uma fatia considerável do trabalho. Mas não há psicólogos, terapeutas ou outros profissionais habilitados a lidar com as pessoas depois do atendimento jurídico.

“Investir no aparelhamento e no quadro de apoio poderia diminuir essa relação para um defensor para 15 mil pessoas”, afirma. Outro problema é a concentração dos defensores nas capitais. “Apenas 42% das comarcas brasileiras têm assistência da Defensoria Pública, apesar de ela ter previsão constitucional. O maior número de defensores ainda se concentra nos centros urbanos. Justamente nas cidades do interior, que concentram os mais baixos índices de desenvolvimento humano e de renda, não há defensores”, conta Castro.