Casas de luxo

TJ-SP proíbe construção na região do Ibirapuera

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7 de julho de 2011, 12h36

A regra da maior restrição urbanística é de amplo conhecimento do mercado imobiliário. Em São Paulo, essa regra foi reiteradamente prestigiada em inúmeros precedentes da Corregedoria-Geral de Justiça, em processos administrativos relativos a Cartórios de Imóveis, além de julgados proferidos na jurisdição contenciosa.

Com esse fundamento, o Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a proibição da Mafra Construtora e Incorporadora erguer um condomínio de 12 casas de luxo no Jardim Luzitânia, na zona sul da capital paulista. A empresa é acusada de desrespeito às normas de tombamento da região do Parque do Ibirapuera, uma das mais caras da cidade de São Paulo.

A decisão, por votação unânime, foi tomada pela Câmara Reservada de Meio Ambiente que negou recurso à construtora contra sentença da 9ª Vara da Fazenda Pública da capital. A sentença condenou a Prefeitura de São Paulo e a Mafra Construtora e Incorporadora de demolir um casarão e erguer novas casas e ainda a reparar danos urbanísticos e ambientais. No caso de descumprimento, a incorporadora estará sujeita a multa diária no valor de R$ 10 mil.

O relator do recurso, desembargador Torres de Carvalho, da Câmara Reservada de Meio Ambiente, lembrou que negar legitimidade a restrições urbanísticas mais rígidas seria como recusar o cumprimento da Lei de Lehmann (Otto Cyrillo Lehmann – 1914-2010). A norma do então senador paulista regulamenta o loteamento do solo.

O desembargador destacou, ainda, que fechar os olhos para a legislação elaborada em 1979 pelo então senador paulista foi que abriu a especulação imobiliária de ilhas verdes solitárias de São Paulo como o Jardim Europa, o Jardim América, o Pacaembu, o Alto de Pinheiros e, no caso dos autos, o Alto da Lapa e a Bela Aliança (City Lapa).

Com base no voto do ministro Hermann Benjamin, relator do recurso, o desembargador Torres de Carvalho, afirmou que a ordem jurídica estará condenada à desmoralização e ao descrédito se legitimar o rompimento odioso e desarrazoado do princípio da isonomia, ao admitir que restrições urbanísticas e ambientais sejam permitidas a uns poucos privilegiados ou mais espertos. Segundo o relator, o descompasso entre o comportamento de milhares de pessoas cumpridoras de seus deveres e responsabilidades sociais e a astúcia especulativa de alguns basta para afastar qualquer pretensão de boa-fé objetiva ou de ação inocente.

Ainda de acordo com a citação do relator, o Judiciário não desenha, constrói ou administra cidades, o que não quer dizer que nada possa fazer em seu favor. Mas, nenhum juiz, por maior que seja seu interesse, conhecimento ou habilidade nas artes do planejamento urbano, da arquitetura e do paisagismo, reservará para si algo além do que o simples papel de engenheiro do discurso jurídico. “E, sabemos, cidades não se erguem, nem evoluem, à custa de palavras. Mas palavras ditas por juízes podem, sim, estimular a destruição ou legitimar a conservação, referendar a especulação ou garantir a qualidade urbanístico-ambiental, consolidar erros do passado, repeti-los no presente, ou viabilizar um futuro sustentável”, completou o relator, que citou o ministro do STJ.

Plano de construção
O projeto aprovado previa a demolição de um casarão antigo e a construção de 12 casas de 600 metros quadrados cada uma. O alvará foi expedido pela Secretaria Municipal de Habitação em 2005, aprovando a construção de conjunto residencial em um terreno de 4,4 mil metros quadrados, na esquina da Avenida IV Centenário com a rua Moçambique, próximo ao Parque Ibirapuera.

A ação foi proposta pelo Ministério Público, sob a alegação de que o alvará teria sido expedido irregularmente. Isso porque um dos requisitos para sua emissão é a aprovação do projeto pelo Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo), uma vez que a área onde o imóvel está situado é tombada por Resolução. O órgão havia negado o projeto por três vezes.

No entanto, a Secretaria de Governo Municipal encaminhou um ofício aos secretários da Habitação e Desenvolvimento Urbano, do Planejamento Urbano, da Cultura e dos Negócios Jurídicos. No documento, pediu que os representantes das Secretarias no Conpresp fossem orientados a se manifestar na próxima reunião do Conselho a favor do reexame dos projetos na Avenida IV Centenário. Após a reunião, o colegiado deliberou favoravelmente ao pedido de demolição do casarão que lá existia e a construção dos novos imóveis.

A Construtora Mafra argumentou ao tribunal que agiu com lisura e boa fé, que conseguiu a aprovação necessária, cumpriu a lei e agora estava surpresa com o embargo da obra. Pediu que mesmo mantida a anulação da licença que a ordem de demolição não seja total.

A licença para a construção foi protocolada em 2001 na prefeitura de São Paulo pela Northwestern Enterprise Ltda. A empresa depois foi substituída pela Mafra. Uma resolução do Conpresp proíbe a construção de condomínios fechados e até mesmo vilas na região do entorno do Parque do Ibirapuera. Ou seja, a área sofre restrições para construções com o objetivo de preservação do valor histórico, cultural ambiental e urbanístico da região.

O Jardim Luzitánia foi criado e registrado em 1942. Entre as restrições estão a construção de áreas comerciais, com exceção para os lotes com frente para rua Pedro de Toledo, e habitações coletivas ou prédios.

De acordo com o relator da ação, desembargador Torres de Carvalho, a Resolução nº 6/97 do Conpresp não permite a construção de vilas residenciais na região, que fogem ao valor histórico, cultural, ambiental e urbanístico que se pretende preservar. “O projeto se desenvolve sobre um único lote, na conformação dada ao terreno na década de 1950; enquanto não for desmembrado, há um lote único que comporta uma única habitação uni-familiar”, afirma Torres de Carvalho.

O desembargador ressaltou que houve interferência indevida nos trabalhos do Conpresp, uma vez que o chefe de gabinete da prefeitura solicitou que os secretários municipais instruíssem seus representantes no Conselho para se manifestarem a favor do reexame do projeto.

“Sabe-se que tais solicitações são vistas como ordens por quem as recebe. Não por outra razão o Conselho alterou o entendimento duas vezes externado e aprovou o projeto. É um ato administrativo falho, pois editado sob pressão e sem a independência que deve marcar a atuação dos conselheiros”, completou.

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