A natureza e a quantidade da droga apreendida não podem ser empregadas como justificativa para negar ou restringir a aplicação de penas alternativas ao tráfico. E ainda: a parte que procurar os serviços de um defensor público deve assinar a inicial da ação penal junto com ele. As determinações integram dois dos 16 enunciados criminais aprovados pela Defensoria Pública Geral do Rio de Janeiro, em fevereiro deste ano.
“Os enunciados de caráter institucional têm o intuito de criar paradigmas de atuação dos defensores públicos do Rio”, explica o defensor Alexandre Romo. Assim, ao contrário das súmulas dos tribunais superiores, eles não possuem poder vinculante. Segundo o defensor, eles “não têm caráter compulsório em razão da autonomia funcional de cada membro”.
Os enunciados foram aprovados durante a 1ª Reunião de Trabalho do Centro de Estudos Jurídicos e da Assessoria Criminal do órgão. Eles trazem orientações como “recomenda-se que o Defensor Público explore todos os argumentos jurídicos possíveis para infirmar a prova produzida na fase pré-processual, sobretudo a confissão do acusado em sede policial” e “tendo em vista que a medida de segurança constitui sanção penal, é imperiosa a garantia dos direitos fundamentais ao contraditório e à ampla previamente à decisão judicial que decretar a conversão da medida de tratamento ambulatorial em internação”
Leia abaixo os enunciados em matéria criminal:
Enunciado nº 01: Sem prejuízo da argüição da atipicidade, e tendo em vista as reiteradas decisões no sentido de reconhecimento da desproporcionalidade da pena prevista para receptação qualificada, amoldando à do tipo simples, (vg. HC 90235/SP – STJ) deverá o Defensor Público desde a Resposta Preliminar, formular subsidiariamente o pedido de manifestação do MP acerca da suspensão condicional do processo, nos termos do art. 89 da Lei nº. 9.099/95.
Justificativa: Diante do entendimento jurisprudencial firmado pela 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça no sentido da aplicação do preceito secundário da receptação simples (art. 180, caput, Código Penal) aos réus condenados pela prática de receptação qualificada (art. 180, §1º, Código Penal), com esteio no princípio da proporcionalidade, orienta-se o Defensor Público a argüir, subsidiariamente, em Resposta Preliminar (art. 396, Código de Processo Penal), a incidência do art. 89 da Lei nº. 9.099/95, devendo ser requerida a concessão de vista dos autos ao órgão do Ministério Público para que se manifeste acerca da possibilidade de suspensão condicional do processo. Contudo, em caráter principal, incumbe apontar a atipicidade da conduta com fundamento no princípio da reserva legal. Ausente, no caso concreto, o elemento subjetivo dolo eventual previsto no §1º do art. 180 – locução “deve saber” -, o fato não se amoldará à norma penal. Ressalte-se que se trata de atipicidade absoluta, pois inviável, do mesmo modo, o enquadramento da conduta no caput do art. 180, por se tratar de delito próprio – praticado por comerciante ou industrial.
Enunciado nº. 02: Tendo em vista o direito constitucional ao silêncio, deverá o Defensor Público verificar a eventual ilicitude da confissão informal, prestada pelo réu no momento da prisão, conforme abordado no HC 80949/RJ do STF.
Justificativa: Recomenda-se que o Defensor Público explore todos os argumentos jurídicos possíveis para infirmar a prova produzida na fase pré-processual, sobretudo a confissão do acusado em sede policial. Com fulcro no direito constitucional ao silêncio, art. 5º, inciso LXIII, CRFB/88, bem como no correlato privilégio contra auto-incriminação (nemo tenetur se detegere) deve-se averiguar se a confissão foi cercada de todas as garantias processuais previstas no ordenamento jurídico (art. 6º, inciso V, Código de Processo Penal), dentre as quais a cientificação expressa do réu acerca de seu direito constitucional de permanecer calado. Caso tenham sido inobservados os requisitos legais, a prova há de ser impugnada como ilícita (art. 5º, inciso LVI, CRFB/88), a exemplo do entendimento adotado pela Primeira Turma do STF no HC 80949/RJ.
Enunciado nº. 03: A natureza e quantidade de droga apreendida não são fundamentos idôneos para negar ou restringir a aplicação do art. 33, §4º, da Lei nº. 11.343/06, conforme decidido no HC 104423/AL – STF.
Justificativa: De acordo com o voto vencedor prolatado pelo ilustre Min. Gilmar Mendes no HC 104423/AL, a quantidade de droga apreendida é circunstância a ser apreciada na primeira fase de aplicação da pena, conforme preceitua o art. 42 da Lei nº. 11.343/06, em decisão judicial exaustivamente fundamentada (art. 93, IX, CRFB/88). Em razão disso, cumpre à defesa pugnar pela integral aplicação da causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, ainda que seja significativa a quantidade de droga apreendida. Deve-se ressaltar que os requisitos estabelecidos pelo legislador ordinário para incidência da diminuição são apenas três: i) primariedade, ii) bons antecedentes e iii) não dedicação a atividades criminosas, não cabendo ao magistrado a criação de outra exigência. Ademais, a consideração da vultuosa quantidade de entorpecente apreendida tanto na primeira fase de aplicação da pena, quanto na terceira etapa da individualização, acarretaria dupla valoração, o que é vedado pelo ordenamento jurídico (princípio do non bis in idem). Ver também HC 101317/MS – STF.
Enunciado nº. 04: Estando o réu preso e tendo sido aplicada a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, resultando daí pena igual ou inferior a quatro anos, deverá o Defensor Público, sem prejuízo do recurso de apelação, impetrar habeas corpus para garantir o direito de apelar em liberdade se este não houver sido contemplado na sentença condenatória.
Justificativa: Fixada a pena do condenado pelo art. 33, § 4º, Lei nº. 11.343/06, em patamar inferior a quatro anos, incide plenamente o art. 44 do Código Penal, devendo o magistrado avaliar a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos. Tal entendimento apóia-se na declaração de inconstitucionalidade incidental da expressão “vedada a conversão em penas restritivas de direitos”, constante do § 4º, art. 33, Lei nº. 11.343/06, pelo Plenário do STF (HC 97256/RS). Nesse sentido, em tais casos, é inadmissível que o réu permaneça preso durante o trâmite recursal, pois a custódia preventiva consistirá em verdadeira pena antecipada, eis que dissociada da finalidade cautelar (ofensa ao art. 5º, inciso LVII, CRFB/88). Portanto, cabe ao Defensor Público impetrar ordem de habeas corpus, com fundamento no requisito da homogeneidade das medidas cautelares, a fim de garantir o direito do acusado de apelar em liberdade.
Enunciado nº. 05: É cabível liberdade provisória ao acusado de tráfico de drogas, considerando o princípio da homogeneidade das prisões cautelares e tendo em conta a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, conforme entendimento do STF no HC/97256 – RS.
Justificativa: Pelas mesmas razões adotadas no Enunciado nº. 04, compete ao Defensor Público tomar as medidas processuais cabíveis para assegurar a liberdade provisória do acusado pelo delito de tráfico de drogas, eis que, com base no princípio da homogeneidade das medidas cautelares, não se admite permaneça o réu preso em razão de processo penal que poderá resultar, ao final, em pena não privativa de liberdade.
Enunciado nº. 06: A figura do tráfico privilegiado comporta a fixação do regime aberto para o cumprimento de pena, considerando que não ostenta natureza de crime equiparado a hediondo.
Justificativa: Cabe ao Defensor Público pleitear a fixação do regime aberto de cumprimento de pena para os réus condenados pelo delito previsto no art. 33, § 4º, Lei nº. 11.343/06. É possível argumentar no sentido do afastamento da hediondez do crime, em razão do reduzida gravidade da conduta, incompatível com a severíssima disciplina penal estabelecida na Lei nº. 8.072/90. Outrossim, é válido apontar os diversos precedentes da 6ª Turma do STJ que admitem a fixação de regime prisional aberto ou semi-aberto nesses casos, pois o cumprimento de pena privativa de liberdade de curta duração nas condições do regime fechado é prejudicial à recuperação do condenado e contraria os fins da pena criminal (vide HC 130113/SC; HC 154570/RS; HC128889/DF).
Enunciado nº. 07: É inviável o afastamento do § 4º do art. 33 da Lei nº. 11.343/06, sob o argumento de participar o agente de organização criminosa, por falta de definição legal de tal expressão.
Justificativa: Sugere-se que o Defensor Público questione a aplicabilidade do requisito de não participação em organização criminosa, exigido pelo art. 33, § 4º, Lei nº 11.343/06, por violação ao princípio da reserva legal. Há de ser apontada a ausência previsão legal do delito de organização criminosa no ordenamento jurídico brasileiro. Assim, ante a indefinição do que seja “organização criminosa”, esta cláusula aberta não se compatibiliza com o princípio da estrita legalidade, que impera em matéria penal. Logo, a aplicação da causa de diminuição não pode ser obstada pelo argumento de que o acusado é participante de organização criminosa.
Enunciado DPGE/RJ nº. 08: Tendo em vista que o único recurso excepcional cabível das decisões das Turmas Recursais é o Recurso Extraordinário (art. 102, inciso I, da CRFB/88), deverá o Defensor Público, caso seja a hipótese, apontar com clareza a norma constitucional violada, requerendo que o colegiado se manifeste expressamente acerca da matéria, a fim de preencher o requisito do prequestionamento.
Justificativa: É sedimentado nos tribunais brasileiros o entendimento no sentido de que a redação do art. 105, inciso III, da CRFB/88, não permite a interposição de Recurso Especial em face de acórdãos prolatados por Turma Recursal (vide Enunciado nº. 203 da súmula de jurisprudência dominante do STJ). Assim, restando apenas a irresignação pela via do Recurso Extraordinário dirigido ao STF (vide Enunciado nº. 640 da súmula de jurisprudência dominante do STF), incumbe ao Defensor Público velar pelo prequestionamento da matéria, sob pena de inadmissão da pretensão recursal. Para satisfazer a exigência, deve-se requerer a expressa manifestação da Turma Recursal sobre a questão constitucional no próprio recurso de apelação. É desejável, inclusive, que a defesa se utilize do recurso de Embargos de Declaração em face da sentença de primeira instância para facilitar ao máximo o debate explícito da matéria.
Enunciado DPGE/RJ nº. 09: A norma prevista no art. 44, inciso I, do Código Material Penal (que exige não ter sido o delito praticado com violência ou grave ameaça contra pessoa) não tem aplicação nos delitos de menor potencial ofensivo.
Justificativa: Como regra, não é viável a pretensão à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos nos delitos cometidos com grave ameaça ou violência contra a pessoa, em razão da vedação presente no art. 44, inciso I, do Código Penal. No entanto, a doutrina e jurisprudência são pacíficas em admitir a substituição, ainda que presente a violência ou grave ameaça, quando se tratar de delito de menor potencial ofensivo. Aduz-se que a proibição genérica cria uma incongruência no sistema jurídico e contraria ainda as modernas teorias de justificação da pena, pois permite punição menos severa de delitos de médio potencial ofensivo, a exemplo do furto e do estelionato, ao passo que sanciona com maior rigor crimes de menor potencial ofensivo, como a lesão corporal leve e a ameaça. Desse modo, é aconselhável que o Defensor Público, com base ainda no princípio da proporcionalidade (art. 5º, inciso LIV, CRFB/88), aponte a necessidade de se interpretar a norma à luz da Lei Maior, com o escopo de adequar a pena à gravidade do delito praticado (v. Apelação Criminal nº 2009.050.02405, Rel. Des. Geraldo Prado, Quinta Câmara Criminal, TJRJ, acórdão prolatado em 17/05/2010).
Enunciado DPGE/RJ nº. 10: As propostas de transação penal e de suspensão condicional do processo constituem condições especiais de procedibilidade das ações que apuram delitos de menor potencial ofensivo (art. 395, inciso III, do Código de Processo Penal). Em razão disso, deverá o Defensor Público, ao apresentar queixa-crime na hipótese, fazer constar da inicial acusatória tais propostas, condicionando expressamente sua eficácia à juntada aos autos da Folha de Antecedentes Criminais, para análise dos requisitos legais.
Justificativa: Nos casos em que o Defensor Público prestar assistência jurídica ao querelante na ação penal privada, é necessário atentar para as imposições contidas nos arts. 76 e 89 da Lei nº. 9.099/95, pois a omissão em formular proposta de transação penal ou suspensão condicional do processo na queixa-crime poderá acarretar nulidade e prejudicar irremediavelmente o direito do assistido. Diante da posição consolidada dos tribunais brasileiros sobre o tema (veja-se, por exemplo, os seguintes precedentes do STJ: REsp 1079596/SP, HC 99964/MT, REsp 783203/AL, HC 40510/RS), desde que tais medidas sejam cabíveis no caso concreto, é obrigatória sua observância. A omissão injustificada da parte autora da ação penal privada acarretará nulidade, atraindo a aplicação da interpretação firmada pelo Pretório Excelso no Enunciado nº. 696 de sua súmula de jurisprudência dominante. Em razão da impossibilidade de oferecimento da proposta de ofício pelo magistrado, tendo em vista a estrutura acusatória do processo penal brasileiro, a correção do defeito processual exige que o querelante (verdadeiro dominus litis) seja intimado para manifestar-se sobre a transação penal ou suspensão condicional do processo. Com isso, ter-se-á um prolongamento desnecessário do trâmite processual que pode redundar até mesmo na decadência do direito de queixa, frustrando-se o direito do assistido em virtude de falha técnica plenamente evitável.
Enunciado DPGE/RJ nº. 11: Quando da propositura de ação penal privada pelo Defensor Público, caso não sejam cabíveis as propostas de transação penal e suspensão condicional do processo, a recusa em oferecê-las deverá ser fundamentada, em respeito ao exposto no enunciado nº. 10.
Justificativa: No mesmo sentido do disposto no Enunciado DPGE/RJ nº. 10, a recusa em oferecer as propostas de transação penal e suspensão condicional do processo há de ser justificada pelo não preenchimento dos requisitos exigidos pelos arts. 76 e 89 da Lei nº. 9.099/95. Conforme tem decidido reiteradamente o STJ (a exemplo dos seguintes precedentes: HC 26200/RJ, REsp 1079596/SP, HC 99964/MT, REsp 783203/AL, HC 40510/RS), não há qualquer margem de discrionariedade para o autor da ação penal na avaliação do cabimento de tais medidas. Uma vez presentes as condições legais, é inafastável a incidência dos citados dispositivos. Dessa forma, em caso de recusa em formular as propostas é imperiosa a fundamentação estrita com base na lei. Trata-se de um poder-dever do dominus litis, cujo cumprimento rigoroso é imperativo do próprio interesse do querelante, evitando-se a criação de obstáculos processuais que o impeçam de obter a satisfação da pretensão punitiva.
Enunciado DPGE/RJ nº. 12: A inicial de queixa crime deverá ser instruída de lastro probatório mínimo, devendo o Defensor Público, caso se mostre necessário, tomar depoimento formal das testemunhas que corroborem o alegado, salvo se já constar do termo circunstanciado.
Justificativa: A propositura de ação penal depende da existência de justa causa para a deflagração do aparato punitivo estatal, conforme dispõe o art. 395, inciso III, do Código de Processo Penal. Esta norma, ao impor a instrução da exordial acusatória de lastro probatório mínimo, sob pena de sua rejeição, destina-se à proteção do indivíduo presumidamente inocente (art. 5º, inciso LVII, CRFB/88) contra a carga estigmatizante inerente ao processo penal. Logo, faz-se necessário que o Defensor Público diligencie no sentido de produzir provas mínimas para fundamentar a pretensão deduzida na queixa-crime. Do contrário, restará prejudicado o direito da parte com a extinção do processo sem julgamento do mérito, pela ausência de justa causa para a ação penal. Cabe destacar que a instauração do processo-crime prescinde de inquérito policial, desde que embasada em outra espécie de prova (art. 12 do Código de Processo Penal), como o termo de depoimento prestado perante o Defensor – agente estatal cujos atos gozam de fé-pública (art. 364, Código de Processo Civil) – que poderá ser renovado em juízo, sob o crivo do contraditório (art. 5º, inciso LV, CRFB/88).
Enunciado DPGE/RJ nº. 13: Em observância ao que preceitua o art. 44 do Código de Processo Penal, deve a parte assinar a inicial da ação penal privada junto do Defensor Público.
Justificativa: Dispõem os arts. 44 do Código de Processo Penal e 128, inciso XI, da Lei Complementar nº. 80/1994 que o oferecimento de queixa-crime depende da outorga de poderes especiais pela parte. Portanto, é imprescindível que o Querelante subscreva, ao lado do Defensor Público, a inicial da ação penal privada. Tal providência é o bastante para evitar a inépcia da queixa e se coaduna perfeitamente com a natureza público-estatutária da relação jurídica existente entre Defensor e assistido, a qual afasta a possibilidade da parte conferir mandato ao agente público equivalente àquele utilizado no patrocínio privado.
Enunciado DPGE/RJ nº. 14: Sugere-se ao Defensor Público argüir a derrogação dos dispositivos do Código Penal que se mostrem incompatíveis com a Lei nº. 10.216/2001 (Reforma Psiquiátrica), que é posterior e específica em relação ao Código. Recomenda-se ainda sejam formulados quesitos específicos quando da instauração do incidente de insanidade mental ou dependência química, questionando-se ao perito qual seria o tratamento indicado e qual seria o prazo apropriado para a reavaliação do paciente.
Justificativa: A Lei da Reforma Psiquiátrica é Lei Ordinária, dispondo de status normativo equivalente ao do Código Penal. Por conseguinte, incumbe ao Defensor Público argüir a derrogação de todos os dispositivos da Lei Material Penal que se mostrarem incompatíveis com as normas veiculadas na superveniente Lei nº. 10.216/2001. É oportuno observar que o objetivo maior da Reforma Psiquiátrica foi o de assegurar que assistência à saúde mental em geral (inclusive no cumprimento de medida de segurança) seja compatível com os imperativos da dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III, da CRFB/88), valor fundante do ordenamento jurídico brasileiro. Nesse sentido, é essencial que a defesa, no exercício de seu mister, busque constantemente medidas que propiciem a gradativa reinserção do paciente em seu meio social (art. 4º, §1º, da Lei nº. 10.216/2001), único fundamento constitucionalmente legítimo para a imposição de sanção penal ao inimputável. Quanto ao incidente de insanidade mental ou dependência toxicológica, sugere-se que o Defensor Público formule quesitos específicos quanto ao tratamento indicado, bem como quanto ao prazo apropriado para reavaliação, de modo que a delimitação da “periculosidade” como pressuposto de imposição da medida curativa não fique sujeita ao arbítrio do magistrado, mas sim lastreada em critérios científicos e objetivos.
Enunciado DPGE/RJ nº. 15: Em caso de conversão de medida de segurança de tratamento ambulatorial em internação (art. 184 da Lei nº. 7.210/1984), o Defensor Público deve verificar se foi garantido o direito de defesa do paciente. Se o contraditório não tiver sido observado previamente à conversão, cumpre apontar a nulidade via habeas corpus.
Justificativa: Tendo em vista que a medida de segurança constitui sanção penal, é imperiosa a garantia dos direitos fundamentais ao contraditório e à ampla defesa (art. 5º, inciso LV, CRFB/88) previamente à decisão judicial que decretar a conversão da medida de tratamento ambulatorial em internação. Em face da lacunosa disciplina estabelecida pela Lei nº. 7.210/84 sobre o tema, tratado unicamente no art. 184, deve-se sustentar a plena incidência das normas que regulam a regressão de regime prisional, sobretudo do art. 118, §2º, da Lei de Execução Penal, pois não há fundamento para distinção entre o apenado imputável e o inimputável no que se refere às garantias processuais. O direito de liberdade de qualquer indivíduo dispõe da mesma proteção constitucional, razão pela qual, os inimputáveis submetidos à medida segurança gozam, na mesma extensão, da prerrogativa contestar amplamente a decisão judicial de conversão, apresentando todas as justificativas fáticas e jurídicas pertinentes (art. 5º, inciso LIV, CRFB/88). Cabe ao Defensor Público velar pelo devido processo legal no procedimento de conversão, valendo-se das medidas processuais necessárias.
Enunciado DPGE/RJ nº. 16: O Defensor Público deve pleitear a requisição judicial do acusado preso para entrevistá-lo antes da apresentação da resposta de que trata o art. 396-A do Código de Processo Penal.
Justificativa: Com o advento da Lei nº. 11.719/2008, que trouxe substanciais transformações nos procedimentos previstos no Código de Processo Penal, surgiu nova oportunidade de apresentação de defesa escrita antes mesmo da fase instrutória. Trata-se da resposta à acusação, prevista no art. 396-A daquele estatuto processual, na qual poderão ser aduzidas desde preliminares até questões de mérito que interessem à defesa, além de requeridas provas e arroladas testemunhas. Nesse contexto, desponta a necessidade de contato entre a defesa técnica e o acusado em tal ocasião, de modo que este indique ao Defensor Público as alegações fáticas que entender cabíveis, bem como as testemunhas e outras formas de prova existentes no caso concreto. Dessarte, a simples entrevista pessoal na oportunidade da audiência de instrução e julgamento (art. 400 do Código de Processo Penal) mostra-se insuficiente para a realização plena do direito fundamental do réu à ampla defesa (art. 5º, inciso LV, CRFB/88). Cumpre asseverar que as vertentes desta garantia (autodefesa e defesa técnica) devem ser desempenhadas em constante interação, a fim de que o Defensor Público esteja munido das alegações fáticas mais adequadas. Para tanto, é indispensável conhecer o relato do Réu, o qual vivenciou diretamente o fato histórico investigado no processo. Nesse passo, é exigível que o magistrado oportunize, desde o início do trâmite processual, a entrevista pessoal do Acusado com o Defensor Público, sob pena de se transformar a garantia da defesa técnica num formalismo vazio e dissociado dos princípios constitucionais que informam o processo penal brasileiro e dos próprios objetivos da Defensoria Pública (art. 3º-A, inciso IV, da Lei Complementar nº. 80/1994) como instituição essencial para o acesso à justiça (art. 5º, inciso XXXV, CRFB/88). Vale apontar ainda como base normativa para o pleito os incisos VI e X do art. 128 da Lei Complementar nº. 80/1994.