Crise institucional

Omissão na escolha da direção da AGU viola a CF

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24 de janeiro de 2011, 5h39

“Tudo isso deve ficar bem escondido, ficar bem no esqueleto, nunca aparente” (Francis Ponge)

É inadiável o imperativo institucional de republicanização da AGU, isto é, o implemento de auto-regulamentação e de práticas que assegurem uma gestão participativa dos membros das carreiras jurídicas na direção, controle e perspectivas da Instituição. Nesse rumo, permanece gritantemente arcaico e personalista o processo de escolha/nomeação dos dirigentes da AGU/PGF, sem o enfrentamento de questões, quais as da alternância, periodicidade e a estipulação de critérios objetivos e impessoais para credenciamento aos respectivos cargos e funções.

Essa clamorosa omissão constitui-se em velado atentado aos princípios constitucionais e republicanos, da Impessoalidade e da Moralidade; afinal, o uso recorrente do poder discricionário, de nomeação livre, dentro de uma Instituição altamente especializada, desconsidera a experiência, alija o mérito auferível e empana a capacitação profissional. A livre escolha, sem criterização normatizada, resulta em agraciamento aleatório, em vez de credenciamento objetivo, burlando-se a evolução profissional, aferível passo a passo, como acontece em outras instâncias modelares, quais, o Ministério Público e o Poder Judiciário.

Nessa trilha, há indagações dilacerantes: Qual o lugar, o papel e a utilidade da “experiência” e da “capacitação profissional” nas carreiras da AGU-PGF? De que maneira, sob a égide dos princípios constitucionais republicanos, poder-se-ia conter a formação de disfarçadas confrarias diretivas nas unidades da AGU-PGF? É um festival de duvidosa legitimidade (embora legal) a recorrente discricionaridade na composição das famosas “equipes”, dos eventuais dirigentes centrais e periféricos, havendo até os que se rotulam, arrogantemente, de “chefes”, quando o que há é hierarquia de atribuições, de competências legais, de poder-dever, sob o comedimento da Legalidade e da Ponderação, sujeitas à imputabilidade administrativa, civil e criminal. A rotulação de “chefes” só contribui para desqualificar a advocacia pública, sob mando – o que não corresponde ao papel, independente e republicano, de velar pela Constitucionalidade e Legalidade na instrução e na defesa dos interesses judiciais e extrajudiciais da União, sem descurar do interesse público, do contribuinte, do povo, em cujo nome todo poder se exerce.

Quanto à capacitação profissional interna, outro tema desafiador, a Escola da AGU deveria adotar a inovação curricular – de matérias específicas, sob enfoques próprios à atuação institucional, e cursos afins -, no estímulo, patrocínio e execução de pesquisas, assim direcionadas. É papel irrecusável da Escola da AGU a formação de intérpretes fecundos e doutrinadores criativos que desenvolvam teses-matrizes, instrumentais à lisura da atuação do Poder Executivo a que assessora e à eficiente defesa judicial e extrajudicial dos interesses da União – matéria inesgotável e ainda por ser amplamente discutida.

O ministro Luís Inácio Adams pode conduzir u ma tarefa marcante e consagradora: a de empenhar-se pela institucionalização, detalhada e republicana, da AGU, cuja imagem – e auto-imagem – ainda é tosca, acanhada, dependente do perfil e do prestígio do seu dirigente máximo. Essa face pálida reflete o velado clima de indiferença, divisão e até de soberba, entre as carreiras jurídicas, apartadas umas das outras, na base do “cada um por si”. Não é difícil entender a quem interessa uma AGU estilhaçada em sua identidade, complexada em sua auto-imagem, entontecida no carrossel infrene das demandas judiciais urgentes, sem tempo e sem fôlego para reciclar-se, retraçar o seu perfil e revigorar-se para as demandas de uma sociedade em transformações permanentes.

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