Justiça à portuguesa

Toffoli aprova controle prévio de constitucionalidade

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17 de janeiro de 2011, 19h22

O controle prévio de constitucionalidade, adotado em Portugal, poderia ser uma boa solução para problemas enfrentados pelos brasileiros. A opinião é do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, que comentou a entrevista do presidente do Tribunal Constitucional de Portugal, Rui Manuel Gens de Moura Ramos, publicada pela ConJur neste domingo (16/1).

Toffoli chamou atenção para a parte da entrevista em que Moura Ramos diz que o presidente de Portugal, antes de sancionar uma lei aprovada pelo Parlamento, pode questioná-la na Corte Constitucional. O controle de leis antes da sanção presidencial, o chamado controle prévio, é defendido pelo ministro brasileiro em dois casos: normas tributárias e leis sobre remuneração de servidor — neste caso porque faz com que muitos aposentados ou funcionários de outras carreiras peçam equiparação.

"Estas duas espécies de leis, editadas em todos os entes da federação (União, estados, Distrito Federal e municípios), são as mais questionadas quanto à constitucionalidade. Evitaríamos inúmeras ações se o STF já pudesse definir sua validade", declarou Dias Toffoli.

O ponto da entrevista, contudo, que mais causou polêmica foi a afirmação de Moura Ramos de que sociedade deve ficar do lado de fora do tribunal enquanto os julgadores formam o seu entendimento. "A sociedade não compreenderia que o juiz se afastasse do seu papel de aplicador da lei para se basear na opinião dela", disse o presidente da corte portuguesa, que ainda expressou a singularidade da experiência brasileira de transmitir pela telvisão as sessões do Supremo: "A TV Justiça é uma experiência do Brasil que não critico, mas julgo que no universo europeu estamos longe disso ainda".

No Brasil, é difícil encontrar quem compartilhe a opinião de Moura Ramos. Aqui, acredita-se que a abertura dos julgamentos é uma forma de o Judiciário prestar contas com a sociedade e de se tornar mais próximo do cidadão. A publicidade dos julgamentos no país é uma conquista da democracia, dizem operadores do Direito.

"A sociedade cobra mais que transparência. Ela quer das instituições também a responsabilidade de suas decisões políticas e jurídicas", afirma o juiz Bruno Terra, presidente da Associação dos Magistrados Mineiros. Segundo ele, os julgamentos só podem acontecer de duas formas: ou com as portas dos tribunais abertas ou em segredo de Justiça, quando o assunto envolve segurança do Estado, por exemplo. A experiência brasileira optou por torná-los todos públicos, à exceção de alguns casos. E encontrou em canais de comunicação como a TV Justiça uma grande aliada. Para Terra, características do Brasil levaram à escolha. "O Brasil é um país de extensão continental, com uma população enorme. Talvez, se os julgamentos não fossem públicos, as pessoas nem ficariam sabendo o que os tribunais decidiram", explica.

O ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, diz que é preciso respeitar as diferentes realidades. "Elas ditam a natureza das nossas instituições", explica e acrescenta: "a publicidade no Brasil é importante porque viabiliza que os trabalhos do Supremo sejam conhecidos pelo cidadão. Assim, nós conseguimos conquistar nosso objetivo, que é a eficiência".

Marco Aurélio comentou o trecho da entrevista em que o português Moura Ramos diz que as decisões da corte que preside não são tomadas com tanta paixão, já que não analisa casos concretos, apenas se a lei afronta a Constituição do país. O ministro brasileiro não acredita que o Supremo atue com paixão. "O STF não é engajado em nenhuma política governamental. Os processos lá analisados não possuem capa. Possuem apenas conteúdo", afirma.

O ministro do Supremo diz ser contra qualquer forma de uniformização de modelos de Judiciário. Como ele lembra, o modelo brasileiro sofreu uma considerável influência da Constituição dos Estados Unidos. Uma dessas heranças foi a instituição de cargos vitalícios para os ministros. "É uma vitaliciedade relativa", explica Marco Aurélio de Mello, "já que os ministros se aposentam aos 70 anos. As cadeiras vitalícias existem pra preservar a independência".

Na entrevista, Moura Ramos destacou as diferenças na forma de indicação dos ministros da Corte Constitucional em Portugal. Dos 13 membros da corte, 10 são escolhidos pelo Parlamento e os outros três pelos próprios integrantes do tribunal. Além disso, os juizes têm mandato de nove anos.

O presidente da seccional gaúcha da Ordem dos Advogados, Cláudio Lamachia lembra que a influência política se manifesta desde a indicação de ministros para o Supremo Tribunal Federal pelo presidente da República. Para ele, outras formas de indicação deveriam ser usadas, como a formação de listas do quinto constitucional. Apesar da influência, acredita que quanto mais transparência, melhor.

Nelson Calandra, presidente da Associação dos Magistrados do Brasil, diz que "a publicidade dos julgamentos é importante para as decisões importantes". Para o desembargador, a atuação do Supremo no Brasil a portas abertas é justificável quando lembramos que o país viveu um longo período sem democracia plena. "A realidade de Portugal é adequada para o país, enquanto a nossa foi pensada para um país democrático e republicano."

Para o presidente da AMB, "o STF sintetiza características de Corte Constitucional com Suprema Corte de Justiça". Por isso, o perfil funciona e é "adequado para enfrentar os problemas do país".

Na entrevista à ConJur, o presidente da Corte Constitucional de Portugal Moura Ramos disse que é contra a criação da Defensoria Pública no país, à semelhança da que existe no Brasil. "O Estado português já tem muitas instituições e, neste momento, não tem estrutura para a criação de um novo órgão. Aqui já existe uma assistência judiciária para quem não pode pagar advogado, que é gerida pela Ordem dos Advogados", disse.

Calandra é defensor do órgão. "A Defensoria é uma ferramenta democrática que funciona em nosso sistema republicano", opina. O ministro Marco Aurélio de Mello entende ser a instituição primordial para a realidade brasileira. "Essa assistência está prevista para aqueles que não têm como pagar nem o próprio sustento. Apesar de estruturada há pouco tempo, a Defensoria vem conseguindo dar conta de suas atribuições", finaliza.

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