Violação de súmula

Município que armazena petróleo receberá royalties

Autor

4 de janeiro de 2011, 10h45

Ato normativo do Poder Público só pode ser declarado inconstitucional pela maioria absoluta do tribunal ou de seu órgão especial. A ministra do Supremo Tribunal Federal Ellen Gracie aplicou esta tese ao conceder liminar para suspender acórdão da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que extinguiu o repasse mensal de royalties derivados do armazenamento e distribuição de petróleo para o município de Osório (RS). Segundo a ministra, a decisão fere a Súmula Vinculante 10, sobre a cláusula de reserva de plenário.

O município gaúcho, representado pelo advogado Rodrigo Bornholdt, do escritório Bornholdt Advogados, alegou, por meio de Reclamação no STF, que a interpretação da turma do STJ, com base em critério estabelecido na Constituição, representou declaração parcial de inconstitucionalidade de dispositivo da Lei 9.478/97, que dispõe sobre a política energética nacional. Segundo a defesa, a interpretação introduziu restrição para a liberação dos royalties até então inexistente, relativa à necessidade da ligação direta e primária das instalações de embarque e desembarque de petróleo a seus campos de produção.

Dessa forma, a Prefeitura de Osório alegou violação à Súmula Vinculante 10, pois a decisão do colegiado do STJ não se sujeitou à cláusula de reserva de plenário, previsto no artigo 97 da Constituição. Segundo o dispositivo constitucional, somente pelo voto da maioria absoluta de seus integrantes os tribunais podem declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.

Inconstitucionalidade velada
Em sua decisão, a ministra Ellen Gracie entendeu que a 2ª Turma do STJ não respeitou o princípio de reserva de plenário ao afastar a incidência do artigo 48 da Lei 9.478/97, mesmo não declarando expressamente a inconstitucionalidade da legislação.

A ministra citou que o acórdão do STJ, de relatoria da ministra Eliana Calmon, afirma que os municípios que abrigarem equipamentos voltados direta e primariamente às atividades de refino e distribuição de petróleo não terão direito aos royalties. Essa interpretação, segundo o acórdão, se baseia no artigo 20, parágrafo 1º, da Constituição, que determina o "pagamento de royalties aos entre federados em cujo território sejam promovidas atividades relacionadas à exploração de petróleo".

"O acórdão impugnado na presente Reclamação, na dificuldade que teve de encontrar, na lei, definição categórica do que deva ser entendido como ‘instalações terrestres de embarque e desembarque de óleo bruto ou de gás natural’ ou como ‘estações terrestres coletoras de campos produtores e de transferência de óleo bruto ou gás natural’, parece, a princípio, ter lançado mão de critério inovador, de matriz constitucional, que importou, no mínimo, na parcial declaração de inconstitucionalidade, sem redução de texto, de um sentido mais literal e extensivo da norma legal, adotado pela própria administração pública por pelo menos uma década."

O caso
O município de Osório abriga um terminal de tanques de armazenamento que recebe petróleo e derivados do litoral de Tramandaí e remete o conteúdo à refinaria de Canoas. Em 1990, a Prefeitura de Osório passou a receber os valores referentes aos royalties de petróleo, até o limite de 5% de produção, conforme os artigos 1º da Lei 7.990/89, 19 do Decreto 1/91 e 48 da Lei 9.478/97.

Porém, em dezembro de 2001, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) cortou o envio, baseada em uma nova interpretação da Lei 9.478/97, feita por meio da Portaria 29/01 e da Nota Técnica SPG/ANP 1. As normas administrativas não alteraram a legislação, mas passaram a exigir que a instalação terrestre de embarque e desembarque de petróleo estivesse diretamente ligada a um campo produtor.

A ANP alegou que a legislação contempla, para efeito de recebimento de royalties, apenas o píer de atracação, e não o parque de armazenamento, que não recebe petróleo diretamente de um campo produtor. Dessa forma, segundo a agência, Osório não se enquadra na previsão legal para recebimento dos royalties, pois não possui instalação de embarque e desembarque de petróleo.

Em 2003, o município conseguiu, judicialmente, voltar a receber o benefício. O Tribunal Federal da 4ª Região considerou que a portaria e a nota técnica da ANP apenas alterou os critérios de distribuição dos royalties previstos na Lei 7.790/89, sem alterar a lei em si. Dessa forma, como a lei menciona expressamente instalações de embarque e desembarque de petróleo, não poderia a ANP, mediante atos administrativos, alterar a interpretação anterior. Com a decisão, a agência recorreu ao STJ e conseguiu acórdão favorável neste ano.

Agora, com a liminar concedida pela ministra Ellen Gracie, o repasse dos royaties fica assegurado ao município até que se decida o mérito da questão constitucional. "A decisão do STJ, que entende serem os royalties devidos exclusivamente àqueles que têm vinculação com a produção, resta suspensa, deixando de ser um parâmetro para as discussões sobre o tema", afirmou o advogado Rodrigo Bornholdt.

Quanto à questão da distribuição dos royalties em geral, inclusive do pré-sal, Bornholdt entende ser necessário que os maiores beneficiados sejam estados e municípios sujeitos a algum tipo de risco ambiental em razão da exploração do petróleo. "Os demais podem até receber uma parte, mas jamais de modo idêntico àqueles que sofrem os efeitos das atividades envolvendo o manejo do petróleo."

Clique aqui para ler a decisão da ministra Ellen Gracie.

Rcl 10.958

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!