Registros telefônicos

Justiça apura relações privadas da Satiagraha

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22 de fevereiro de 2011, 18h51

Está nas mãos do juiz federal Toru Yamamoto o epílogo da mais emocionante novela política da história do Brasil. Cabe a ele dizer se Daniel Dantas corrompeu o Legislativo, o Judiciário, o Executivo e a imprensa do país ou se foram os concorrentes do banqueiro Dantas que usaram seu carisma para colocar a Polícia Federal, a Abin, o Ministério Público, alguns juízes e a mais poderosa emissora de TV do país a seu serviço para destroçar o adversário.

O que a 3ª Vara Criminal Federal de São Paulo examina é se a famosa Operação Satiagraha foi arquitetada e dirigida pela iniciativa privada. Os elementos já colhidos são explosivos. Com a quebra do sigilo telefônico do então delegado Protógenes Queiroz descobriu-se que ele trocou pelo menos 93 telefonemas com o empresário Luís Roberto Demarco entre julho de 2007 e abril de 2008 — ou seja: o maior inimigo de Dantas participou, de fato, da operação.

A quebra do sigilo telefônico foi autorizada pelo juiz federal Ali Mazloum a pedido do delegado Amaro Vieira Ferreira, da Corregedoria da Polícia Federal. Ao perceber que por trás do idealismo de Protógenes havia personagens com interesse comercial e econômico na operação, Mazloum desdobrou o processo. O empresário Luís Roberto Demarco foi ao Tribunal Regional Federal pedir o trancamento do inquérito. O Tribunal não concedeu, mas repassou o caso para a 3ª Vara Criminal, onde o caso não teve andamento novo até agora.

Outro lote de ligações sugere que a famosa cena do suposto suborno dos policiais foi montada. Protógenes sempre sustentou que o misterioso Hugo Chicaroni seria o preposto de Dantas encarregado de comprar o inquérito — a essa altura pilotado pelo juiz De Sanctis e pelo procurador De Grandis. A quebra do sigilo mostra que Chicaroni, na verdade, é velho conhecido do ex-delegado. Entre fevereiro de 2007 e julho de 2008, os dois trocaram pelo menos 185 ligações. O famoso encontro na churrascaria El Tranvia, gravado pela TV Globo, só aconteceu em agosto de 2008.

O juiz federal Fausto de Sanctis, nos doze meses anteriores à deflagração ruidosa da operação despachou diretamente com o delegado pelo menos 88 vezes. Mas a interlocução prioritária do então delegado era mesmo com a TV Globo, com mais de quinhentos telefonemas. Mais que o dobro das comunicações com o Ministério Público Federal.

Para o advogado Carlo Frederico Müller que, com o colega Renato de Moraes, representa outro alvo da Satiagraha, o ex-presidente da Brasil Telecom, Humberto Braz, a intensa comunicação do então delegado com personagens estranhas à estrutura pública mostra mais que apenas vazamento de informações sigilosas. "Fica claro que a operação foi comandada de fora para dentro", diz Müller, que vê no cruzamento dos registros telefônicos a confirmação do que o jornalista Raimundo Pereira publicou no livro O Escândalo Daniel Dantas.

A defesa de Daniel Dantas, que nesse processo atua na acusação, enfrenta o Ministério Público Federal — que neste caso atua no sentido de trancar a investigação. Caso o juiz federal Toru Yamamoto toque o processo em frente, os acusadores de Protógenes pretendem cruzar as datas dos telefonemas e seus interlocutores com as datas em que Protógenes Queiroz declarou ter ganhado, em doação, em 2006, os imóveis que ele declarou à Justiça Eleitoral no ano passado.

Inquérito no Rio de Janeiro
A Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática (DRCI), no Rio de Janeiro, quer ter acesso às informações do processo que resultou na condenação do ex-delegado Protogenes Queiroz, por vazamento de informações na Operação Satiagraha. O processo correu na 7ª Vara Federal Criminal de São Paulo e foi remetida ao Supremo Tribunal Federal, já que o deputado tem foro por prerrogativa de função.

Em ofício à Justiça Federal em São Paulo, a delegada Helen Sardenberg afirma que "tendo em vista no âmbito do Inquérito Policial 2009.61.81.008866-0 investiga-se vazamento de informações sigilosas na Operação Satiagraha e da existência de telefonemas entre a empresa comercial Nexxy Capital Brasil Ltda, pertencente a Luiz Roberto Demarco Almeida, e autoridades incumbidas da investigação na referida operação e responsáveis pelas interceptações telefônicas e telemáticas, solicito, respeitosamente, a V. Exa. que nos forneça informações e tudo o mais que possa auxiliar na elucidação do Inquérito Policial 218-00231/2008”.

Ainda segundo o ofício, o inquérito foi instaurado em 20 de junho de 2008, na Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática, para apuração de suposto crime previsto no artigo 10º, da Lei 9.296/96. De acordo com o dispositivo, “constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei".

O inquérito citado pela Delegacia foi instaurado antes mesmo de a operação Satiagraha ser deflagrada, o que aconteceu no dia 8 de julho do mesmo ano.

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