Princípio constitucional

Pena para tráfico deve ser proporcional, diz juiz

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8 de fevereiro de 2011, 9h16

O Supremo Tribunal Federal decidiu que no crime de tráfico privilegiado é possível aplicar a pena restritiva de direito em vez de prisão. Isso porque nestes casos o réu é primário, tem bons antecedentes, não integra o crime organizado e não vive do tráfico. Apesar da decisão do STF ter caráter vinculante, o Superior Tribunal de Justiça tem decisão em sentido contrário. Para o juiz Cláudio do Prado Amaral, da 2ª Vara Criminal de São Carlos, essa divergência existe, é necessária e não gera insegurança jurídica. Ao contrário: melhora a Justiça criminal.

Para definir qual pena aplicar ao condenado, Amaral defende uma análise ampla do caso concreto, além da quantidade e o tipo da droga apreendida. Para ele, é preciso verificar em que contexto isso aconteceu. Os critérios desse contexto ajudam a distinguir o réu que comete o tráfico privilegiado do pequeno traficante. Para ele, o privilegiado pode ter um tratamento diferente com a substituição de pena restritiva de liberdade por de direitos.

“Uma pessoa pega com 3 gramas de maconha, mas pacífica, que trabalha, tem uma boa conduta social, é primária e bem quista é uma forte candidata a pena restritiva de direitos”, destaca. Ou seja, ela atende aos requisitos presentes no artigo 33 parágrafo 4° da Lei de Drogas (11.343/2006). Para o juiz, a pessoa que é primária, tem bons antecedentes, não integra organização criminosa, mas foi encontrada portando um quilo de crack separado em porções é um pequeno traficante.

No primeiro caso, no que configura tráfico privilegiado, o réu precisa ser primário. Porém, no segundo, o réu não precisa ser primário para ser considerado um pequeno traficante. Amaral afirma que o poder lesivo da droga encontrada somado a como ela estava acondicionada pode interferir diretamente na pena. “O tráfico tem uma estrutura organizada assim como uma empresa, com cargos e funções. Por isso, é importante o juiz compreender qual o papel daquele agente no crime para aplicar uma pena proporcional”, observa.

A Lei de Drogas equiparou o tráfico a crimes hediondos e vedou ainda a possibilidade de aplicação de penas alternativas. A rigidez tem fundamento na Constituição Federal, que já prevê que o crime é hediondo. Amaral afirma que a culpabilidade também é constitucional e precisa ser observada. “É como fixar um teto para algo infinito. As condutas sociais são infinitas e o juiz precisa poder manusear a pena de maneira mais ampla e de acordo com o caso concreto. É possível haver um pequeno traficante com uma conduta irrisória”, exemplifica.

Em setembro de 2010, o STF entendeu que a lei que proíbe os juízes de fixar penas alternativas para condenados por tráfico de drogas é inconstitucional. O artigo 44 da Lei de Drogas vedava a conversão de pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos. A maioria dos ministros entendeu que a proibição fere o princípio da individualização da pena.

O relator do processo, ministro Ayres Britto, sustentou que o legislador não pode restringir o poder de o juiz estabelecer a pena que acha mais adequada para os casos que julga. “Ninguém mais do que o juiz da causa pode saber a melhor pena para castigar e ressocializar o apenado”, afirmou. De acordo com ele, a lei não pode proibir que a Justiça procure “alternativas aos efeitos traumáticos do cárcere”.

Segundo Amaral, os efeitos práticos das decisões afetam positivamente o indivíduo, na medida em que recebem penas proporcionais. “Substituir a prisão por pena alternativa no caso de tráfico privilegiado aumenta e melhora a Justiça criminal. Mandar alguém para a prisão desnecessariamente o submete a dessocialização, o coloca em contato com crime organizado, o afasta da família, do trabalho e da educação”, reforça. “A pena proporcional ao delito é um princípio constitucional, assim como equiparação do tráfico aos crimes hediondos. Cabe ao Judiciário fazer esse controle difuso de constitucionalidade”, finaliza.

Os caminhos
Os tribunas não têm ainda um padrão nas decisões que tratam do assunto. O próprio Superior Tribunal de Justiça tem entendimentos divergentes nas Turmas criminais. A simples apreensão de uma balança de precisão não caracteriza, por si só, o crime de posse de equipamento para o preparo de entorpecentes, de acordo com a decisão da 6ª Turma. Já a 5ª Turma é mais severa. Em um caso de tráfico privilegiado, o relator, Gilson Dipp, acatou a um recurso do Ministério Público e manteve a condenação do réu.

Os tribunais estaduais possuem um entendimento mais próximo do Supremo. A 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu o direito a uma mulher condenada a um ano e dez meses de reclusão por tráfico de maconha. Para a 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, o tráfico privilegiado merece resposta penal menos gravosa. Isso porque o agente se envolveu ocasionalmente com essa espécie delitiva, não é reincidente, não ostenta maus antecedentes e não se vincula a qualquer organização criminosa.

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