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Facebook deve se adequar a normas de privacidade

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24 de dezembro de 2011, 6h24

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O Facebook, maior rede social do planeta, será obrigado a se submeter a auditorias nos Estados Unidos durante os próximos 20 anos para garantia do controle de privacidade dos usuários da rede social. A determinação foi imposta pela Federal Trade Commission (FTC), agência independente do governo americana de proteção aos direitos do consumidor. Segundo dados do próprio Facebook, mais de 700 milhões de pessoas em todo o mundo tem uma página na rede.

Tudo começou quando um estudante de direito em Viena, Max Schrems, iniciou um processo contra o Facebook, criado por Mark Zuckerberg. Após muita insistência, o estudante de direito conseguiu um CD com toda a informação coletada durante os três anos em que fez parte desta rede. Quando impresso, o conteúdo do CD formava um calhamaço de 1.200 páginas.

Todo o material — histórico de chats, pedidos de amizade, posição religiosa, etc. — era classificado em 57 categorias que possibilitam facilmente a pesquisa de dados, descobrindo qualquer informação que se deseja, seja da vida pessoal, profissional, religiosa ou política. Um banco de dados completo e detalhado.

Além desse material, mesmo as mensagens, fotos e outros arquivos que ele havia deletado continuavam armazenados nos servidores do Facebook. Quando questionado sobre isto, o Facebook afirmou que apenas "removia da página" e não "deletava". Isso significa que, quando uma informação é publicada na rede, ela jamais é excluída.

Após descobrir que o Facebook possui servidores na Irlanda, entre agosto e setembro de 2011, Schrems abriu 22 queixas contra a rede social no Irish Data Protection Commissioner, um órgão de defesa país. No embalo dessas acusações, a FTC se prontificou a tomar medidas a fim de controlar a atuação da rede em relação à privacidade dos usuários, sob pena de multa de US$ 16 mil a cada infração.

Segundo Victor Haikal, especialista em Direito Digital do Patricia Peck Pinheiro Advogados, as determinações impostas pela FTC são as seguintes: ”O Facebook está proibido de mentir aos usuários". Haikal conta que a rede “não cumpriu as promessas sobre privacidade que fez aos usuários e modificou sua política de privacidade sem o consentimento dos usuários em 2009”.

Haikal também explicou que quando houver mudança na mecânica, eles serão obrigados a avisar as pessoas se podem ou não efetivar aquela modificação, desde que influencie na privacidade.

Ainda segundo as imposições da FTC, o Facebook terá 30 dias para acessar dados de um ex-usuário, após essa data os dados só poderão ser acessados mediante ordem judicial. Por fim, eles vão precisar desenvolver um programa de estudo e proteção à privacidade, aos dados pessoais dos usuários, que possa detectar vulnerabilidades no sistema e na sua própria mecânica de funcionamento.

A rede social tem 180 dias para apresentar uma certificação que existe um programa de cuidados de privacidade com os requisitos exigidos pelo FTC e para assegurar que a privacidade das informações dos consumidores está protegida.

Do lado de baixo do equador:
Já no Brasil, as normas em relação às redes sociais, ou indo ainda mais longe, em relação aos termos de privacidade na internet, ainda estão em gestação. Enquanto nos Estados Unidos, na Europa e na Argentina já existem agências reguladoras só para tratar de temas relacionados à privacidade na rede, o Brasil ainda patina em anteprojetos ou Projetos de Lei.

Segundo a especialista em Direito Digital do escritório Ópice Blum, Juliana Abrusio, “tanto os EUA, como a Europa, especialmente a Europa, tem mais amadurecimento contra invasão de privacidade. Desde cedo vem tratando a questão. Nos países membros da União Européia existem, inclusive, códigos de privacidade”.

Juliana comenta que no Brasil pode ser utilizado o artigo 15 da Constituição, que trata da privacidade, mas na opinião da especialista o estado brasileiro ainda não se debruçou como deveria sobre o tema quando o assunto é internet.

Isso não significa que um brasileiro, ou até mesmo o Ministério Público, não possa processar a rede de relacionamentos mais popular do mundo caso sinta-se lesado, como, inclusive, vem acontecendo, sobretudo em caso de ofensas anônimas, em que a rede é obrigada a informar a identidade do comentarista, caso a justiça determine.

No entanto, a especialista afirma que o Facebook só pode ser processado porque possui um escritório (espaço físico), em terras brasileiras, o que, por exemplo, não é o caso do Twitter. Isto acaba dificultando os trâmites jurídicos.

Mesmo sem ter sede no Brasil, segundo o especialista em Direito Digital, Alexandre Atheniense, o Twitter é uma exceção a regra, pois costuma ser efetivo.  “Sempre quando demandado ou recebe alguma comunicação com domínio governamental, eles aceita cumprir na medida do possível”, explica o advogado. Atheniense acrescenta que como o Google e o Facebook têm sede no país, são obrigados a obedecer as leis brasileiras e estão sujeitos ao código do consumidor.

Segundo o advogado, o processo é bem demorado para o governo brasileiro, caso  este queira tomar alguma medida contra rede social sem sede no país. Primeiro, é enviada uma carta rogatória, e posteriormente, o que leva mais tempo ainda, uma decisão judicial.

Ainda em relação à privacidade nas redes sociais, o especialista acredita que as medidas que o Facebook está adotando nos EUA serão aplicadas no mundo todo. Ainda assim, o tema é bastante controverso e relativo, pois sempre são necessárias adaptações. “Em alguns países como a Alemanha existe ainda mais rigor”, conta Atheniense.

Quando o assunto é privacidade no Brasil, ele, assim como Juliana Abrusio, destaca a fragilidade da legislação brasileira em relação ao assunto, que, em tese, só dispõe dos artigos 5 e 12 da Constituição tratando do tema. Para o advogado, estamos defasados quanto a isso, pois as leis são de 1988 e desde então muito já aconteceu. “Existem projetos de lei, mas as pessoas ficam vulneráveis quanto a controlar de forma ampla a privacidade”. Para Atheniense, é fundamental que tenhamos uma legislação que nos garanta a tutela de direitos diante das empresas que detém grande parte da cultura da internet.

Em trâmite:
As leis que regulamentam o uso da internet são regidas pela soberania de cada local. No Brasil, está em trâmite no senado o PL 84/99.  O texto está em fase final de tramitação, e tipifica 11 crimes de alta tecnologia no Código Penal brasileiro e aguarda parecer das comissões de Constituição e Justiça e Cidadania e Ciência e Tecnologia da Câmara. PSDB e aliados são a favor da aprovação do projeto, mas o governo é contra.

Também chegou à Câmara, como contraponto ao PL 84/99, o PL 2.126/2011, que cria o marco civil da internet, com direitos, deveres e responsabilidades de internautas, empresas, governo e Judiciário na web.

A principal disputa entre os dois projetos diz respeito à guarda de logs (dados de conexão) e à responsabilidade dos provedores. O PL 84 diz que os provedores devem armazenar os logs por três anos, para o caso de uma investigação policial, e cria meios de responsabilizar judicialmente os provedores por conteúdo impróprio. No marco civil, a guarda tem prazo de um ano, e os provedores só podem ser responsabilizados depois de ordem judicial exigindo a retirada de determinados conteúdos.

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