Segunda Leitura

As novidades nas eleições à presidência dos tribunais

Autor

  • Vladimir Passos de Freitas

    é professor de Direito no PPGD (mestrado/doutorado) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná pós-doutor pela FSP/USP mestre e doutor em Direito pela UFPR desembargador federal aposentado ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Foi secretário Nacional de Justiça promotor de Justiça em SP e PR e presidente da International Association for Courts Administration (Iaca) da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibrajus).

11 de dezembro de 2011, 7h45

Spacca
A Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman) dispõe no seu artigo 102 que “Os tribunais, pela maioria dos seus membros efetivos, por votação secreta, elegerão dentre seus juízes mais antigos, em número correspondente ao dos cargos de direção, os titulares destes, com mandato por dois anos, proibida a reeleição”.

A Constituição Federal de 1988, no seu artigo 99, deu autonomia administrativa aos tribunais e disto concluíram alguns que o artigo 102 da Loman estava revogado. A dúvida seria solucionada no novo Estatuto da Magistratura, mas o Supremo Tribunal Federal, a quem cabe a iniciativa de apresentar o projeto (CF, art. 93), ainda não o enviou ao Congresso.

Tal fato nunca preocupou os tribunais com poucos desembargadores. Salvo raras exceções, neles vem sendo seguida a antiguidade nos cargos de direção. E um a um todos, ou quase todos, chegam à presidência, vice-presidência ou corregedoria.

A situação é diferente nos tribunais maiores. E por uma razão muito simples. Quem entra em um tribunal com 30 ou mais juízes, provavelmente jamais chegará aos cargos de direção. Mesmo que 15 de seus colegas já tenham presidido a Corte, morram ou se aposentem, os 15 remanescentes significarão 30 anos de espera. Isto desagrada os mais novos, muitos com enorme vontade de fazer acontecer.

Vez por outra o assunto chega à esfera judicial. O Superior Tribunal de Justiça, decidindo eleição ocorrida no TRF da 4ª Região, concluiu ser possível a eleição entre os dois mais antigos, rechaçando o critério da antiguidade (6ª Turma, RMS 4.689-3/RS, Rel. Ministro Pedro Acioli, j. em 21.02.95). O STF, em uma disputa oriunda do TRF da 3ª Região, negou provimento a um recurso de agravo, entendendo não ter a Corte “…competência para conhecer, originariamente, de mandado de segurança impetrado contra eleição para cargos de direção de outro tribunal, na qual não há interesse direto nem indireto da magistratura” (A.O. 1160, Ag.R/SP, Rel. Ministro Cezar Peluso, j. 17.08.2005).

Persistiu, sempre, um clima de indefinição a respeito do assunto. Aos 19 de novembro de 2010, no TJ-PR, que tem 120 desembargadores, o desembargador Miguel Kfouri Neto, 54º na lista de antiguidade, venceu a eleição para presidente disputada com o desembargador Sérgio Arenhart, que se achava na 12º classificação. Houve representação de terceira pessoa ao CNJ, que foi julgada improcedente (PCA 0000095-74.2011.2.00.0000, conselheiro Jeferson Kravchychyn, j. 15.2.2011).

Pouco mais de 1 ano depois, aos 7 de dezembro passado, o desembargador Ivan Ricardo Garisio Sartori, que se achava na 137ª posição na lista de antiguidade elegeu-seo novo presidente do TJ-SP, que conta com 354 desembargadores, vencendo o atualpresidente desembargador José Roberto Bedran, por 164 a 147 votos.

Estes dois resultados sinalizam que os tribunais de porte médio (20 a 49 desembargadores) e os de grande porte (50 ou mais desembargadores, TJ-SC, PR, MG, RJ, RS e SP) não aceitam a antiguidade como critério único de escolha. É dizer, seja esta ou aquela interpretação, sempre surgirão candidaturas entre pessoas mais novas na carreira.

O anseio de presidir um tribunal é uma aspiração legítima e nada tem de errado. Pelo contrário, é ótimo que quem assuma tão difícil posição esteja preparado e disposto, física e psicologicamente, a dedicar 2 anos de sua existência à causa pública.

Em minha opinião, a presidência de um TJ, TRF ou TRT é onde se pode fazer mais pela efetividade da Justiça. O presidente é quem dá a política da gestão judiciária no estado ou na região, pode incentivar os juízes e servidores, instala Varas, realiza concursos, conduz a construção de Fóruns, implementa o processo eletrônico, estimula a conciliação e tantas outras importantíssimas medidas.

Na realidade, nenhum presidente de Tribunal Superior ou de Conselho de Justiça, por mais importante que seja — e o é realmente — tem tão explícito poder. Na verdade, estes outros importantes partícipes da administração podem traçar políticas públicas, baixar atos administrativos, orientar e cobrar. Mas não estão ali no dia a dia, a dirigir estes complexos órgãos da administração judiciária.

Se a presidência de um Tribunal de Apelação é assim tão importante, nada mais normal que muitos a ambicionem. No entanto, esta disputa não deve tornar-se excessivamente politizada, porque isto seria nocivo à magistratura. Há o risco de criarem-se grupos, ódios eternos e isto, todos sabem, prejudica a administração judiciária e, por vezes, interfere até nos julgamentos.

Por tal motivo, não tem cabimento a pretensão de que todos os juízes votem para presidente, tal qual se faz para Procurador-Geral da Justiça. Isto resultaria em campanhas pelo interior, promessas de favores, proteção ou perseguição de núcleos judiciários conforme a votação apurada, animosidade entre facções em disputa e outras tantas mazelas comuns à condição humana.

No extremo oposto, querer que o mais antigo seja o presidente, sob o argumento de que isto acabaria com as disputas internas, é uma ilusão. O ungido pode não ter a menor vocação para administrar nem vontade de fazê-lo, assumindo apenas pelo destaque social da posição.

O meio termo situa-se em admitir a candidatura a todos os desembargadores nos Tribunais menores ou aos que ocupam o órgão especial nos Tribunais que os tem, ou seja, aqueles com mais de 25 desembargadores (CF, art.93, XI). Esta abertura, que não é excessiva, permite a candidatos mais jovens, que supostamente estão em melhores condições físicas, mais adaptados à tecnologia moderna, serem candidatos e exercerem com vontade a difícil função. Esta é a única saída conciliadora, pois abre oportunidade aos mais jovens sem retirar a possibilidade aos mais velhos.

Quanto ao risco de sequelas desta disputa, registre-se que serão sempre menores do que em uma eleição de toda a classe. E se os desembargadores souberem separar o institucional do pessoal, por certo as divergências ficarão em um plano civilizado. Se forem pessoas de menor dimensão psicológica e espiritual, talvez alimentem mesmo ódio contra os colegas até o resto de suas vidas. Paciência, é o preço a pagar.

A encerrar, cumpre apenas registrar que o vencedor de São Paulo (Sartori) tem tudo para fazer uma excelente administração, a começar pela imensa vontade de comandar a Justiça de SP. Certamente seguirá os passos de seu colega do Paraná (Kfouri), que vem impulsionando o Judiciário local.

Quanto aos vencidos nas eleições (Arenhardt no PR e Bedran em SP), serão, como sempre foram, respeitados na classe e na sociedade, por força de suas carreiras exemplares, do que dou testemunho e assino em baixo.

Mas, em tudo isto, o mais importante não são as pessoas, e sim as instituições. O que se espera é que o Poder Judiciário se fortaleça e cumpra seu papel com dignidade e eficiência. 

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!